29 Setembro 2014
"Ouço muitos que têm reservas para votar em Dilma no primeiro turno, anunciando que o farão no segundo, se o houver, conscientes do perigo de aventuras pela frente, como indiquei no princípio. Mas quero trazer alguns dados concretos", escreve Luiz Alberto Gómez de Souza, sociólogo.
Eis o artigo.
Escrevo pensando em companheiros de caminhada em movimentos sociais e pastorais, com dificuldade ou bloqueios para votar em Dilma em 5 de outubro. Marilena Chauí, num encontro de Dilma com o mundo da cultura no Rio de Janeiro em 15 de setembro, colocou muito claramente o dilema: entre a aventura e um processo em marcha. Já vivemos tempos imprevisíveis e arriscados de aventuras. Depois de um mandato de Juscelino Kubitsheck, que vemos agora como um momento importante de construção da nação, foi eleito, por um moralismo udenista estreito, um histriônico de vassoura em punho, que não resistiu mais de seis meses no poder. Antes, os ataques raivoso de Carlos Lacerda denunciavam um “mar de lama”, levando Vargas ao suicídio, onde havia basicamente tráfico de influências da guarda pessoal do presidente. Na redemocratização, um caçador de marajás foi ele mesmo caçado – ou melhor, cassado – logo adiante.
Agora temos um candidato que está, de fato, sendo plebiscitado por seu passado como governador, em terceiro lugar em seu próprio estado, Minas Gerais. E outra candidata, pregando uma “nova política”, ou lançando uma crítica irresponsável à política em geral, descobre-se na verdade com um perfil da velha política, querendo vencer a qualquer custo, depois de leiloar seu nome por várias legendas, conquistando afinal um posto de vice para, num golpe de sorte (!), à custa da morte de seu companheiro de chapa, chegar ao almejado desejo de se candidatar outra vez à presidência. Puro voluntarismo personalista. Seu programa é vago e mutante. Bastaram dois twitters de um evangélico tonitruante, o pastor Malafaia, para mudar sua posição sobre a união gay.
Sua equipe econômica, conhecidamente neoliberal, indica-lhe a autonomia do Banco Central, entregue então ao capital especulativo financeiro, eliminando a regulação macroeconômica por parte do Estado. Recebeu acenos do presidente da Fiesp e do diretor do Banco Itaú. Sua postura ecológica foi se esfumando, com acenos ao agronegócio. Quais suas diretrizes concretas de governo, além do vago enunciado de boas intenções? Qualquer uma, ao sabor de futuras alianças de alto preço, de quem se elegeria sem apoios partidários prévios. Governaria “com os melhores”, eis uma declaração acaciana que nada diz . Um socialista histórico, L. A. Moniz Bandeira, vem denunciando sua negação dos princípios do PSB que ele ajudou a criar com João Mangabeira, enxovalhando sua história, agora uma mera legenda provisória de passagem da candidata.
Do outro lado, com Dilma, há um processo que vem de três mandatos, com resultados sociais concretos, no Bolsa Família, Luz para todos, Minha Casa minha Vida, Mais Médicos na área da saúde (atendendo cinquenta milhões de cidadãos), Prouni e Pronatec em educação, Pronaf para a agricultura familiar. A recente Política Nacional de Participação Social vai legitimando os conselhos populares, que já estão existindo, criando pontes de diálogo entre sociedade e Estado. Já antes seu partido lançara o orçamento participativo, onde uma democracia participativa se articulava com a democracia representativa saída das eleições.
Aparecem, é certo, sinais de corrupção. A novidade é que eles são desocultados com liberdade pelos órgãos do próprio governo. Os historicamente mal informados querem passar a ideia de que somente agora há corrupção, o que na verdade vem de longe. A diferença é que agora os corruptos são indiciados e membros do próprio governo estão indo para a cadeia. Fala-se de mensalão petista, querendo esquecer o mensalão mineiro anterior e a privataria tucana, - denunciada com dados insofismáveis por Amaury Júnior - , que sucateou empresas estatais importantes, como a Vale do Rio Doce. Há o risco de que o processo privatista seria retomado num mandato de Marina , alcançando a Petrobrás, uma das mais exitosas empresas brasileiras a nível mundial, vítima de ataques que parecem querer abrir caminho para sua possível privatização. Marina põe de lado o grande potencial do pré-sal, em nome de uma energia eólica de longo tempo de maturação.
Caminhou-se pouco em questões da posse da terra e na política frente aos indígenas. Os problemas do meio ambiente deveriam merecer, no futuro, maior atenção. Há rumos a rever e caminhos a avançar. Nesse sentido, temos um bom exemplo: o MST é crítico implacável da política agrícola do governo da presidenta Dilma, mas João Pedro Stédile –sem deixar de lado a crítica - está entre seus apoiadores.
Há que levar a redirecionamentos? Certamente, mas a partir de parâmetros reais e não de vagas intenções. Aliás, os dois candidatos principais da oposição não conseguem opor-se às políticas sociais em curso, apenas querendo fazer reparos aqui e ali, ou propõem ampliá-las, muitas vezes irresponsavelmente. As principais mudanças de rumo num próximo governo Dilma estão na política econômica, para impedir uma volta à ortodoxia conservadora. E evitar, na política externa, um alinhamento obediente ao poder hegemônico dos Estados Unidos.
Um processo muda ou se inflexiona de dentro e não a partir de propostas vagas e gelatinosas. Porém o possível do real nem sempre coincide com o desejável das boas intenções. O tempo histórico é longo e lento e por isso há que estar atento às grandes tendências. Assim, temos um índice de desemprego baixo, a manter e aperfeiçoar (5% na PME do IBGE em agosto de 2014,o menor nesse mês em 12 anos). Tivemos uma saída do nível da pobreza de 36 milhões de brasileiros, desde o governo Lula. As desigualdades sociais ainda são grandes, mas com lentas melhoras, o que um erro nos últimos resultados do órgão oficial do IBGE, agora corrigido, não mostrava. Imaginemos se o dado equivocado do Gini indicasse, ao contrário, um índice menor; haveria forte grita denunciando manipulação de dados.
Por tudo isto dou meu apoio firme à eleição de Dilma Rousseff já no primeiro turno, ao lado de Boaventura Sousa dos Santos, Eric Nepomuceno, Leonardo Boff ou Frei Betto, que trouxeram dados significativos para sua escolha. Vários dos que apoiamos, queremos revisão de alguns rumos. Um novo mandato não é apenas a continuação do anterior. Mas isso se faz dentro de um processo, a partir dos ganhos obtidos até o momento.
Para aqueles insatisfeitos, desiludidos ou contrários, quais as propostas concretas que os candidatos de oposição apresentam, que não sejam intenções voláteis? Há aqui e ali uma má vontade que tem muito de rejeição de classe, de preconceitos ocultos ou de medos diante de um movimento popular.
Ouço muitos que têm reservas para votar em Dilma no primeiro turno, anunciando que o farão no segundo, se o houver, conscientes do perigo de aventuras pela frente, como indiquei no princípio.
Mas quero trazer alguns dados concretos. Um segundo turno poderá ser difícil, se votos substanciais de Aécio se redirecionarem para Marina. Nas últimas pesquisas, há uma igualdade técnica entre as duas candidatas nesse segundo turno, dentro de uma margem de erro. Claro, os apoios se dividirão e temos também os votos dos candidatos pequenos, que em boa parte poderiam confluir para a presidenta.
Mas atenção, não caiamos no imponderável. Lembro que as pesquisas de opinião incluem, dentro do conjunto, as porcentagens dos votos em branco ou nulos e o caso dos indiferentes naquele momento. Já na apuração, só teremos computados os votos válidos. Nesse caso, os 40% da última pesquisa para Dilma, no Vox Populi de 23 de setembro (38% no Ibope), passariam a quase 48,78%, nessa contagem definitiva. Somados a uma boa parte dos indecisos (no momento 12% no Vox Populi e 5% no Ibope) e os votos em outros candidatos menores (no momento somam 3%), nos aproximaríamos de uma maioria que poderia resolver-se já no primeiro turno.
Olhando as últimas pesquisas, Marina alcançou um teto e vem com uma curva com tendência descendente (Vox Populi: 28% em 10 de setembro e 22% em 23 do mês). Aécio patina bem abaixo. A curva de Dilma é ascendente (VoxPopuli: 36% em 10 de setembro, 40%, como indicado, dia 23). Norte e nordeste tem altas porcentagens para ela, inclusive no estado de Marina. O mesmo na Minas Gerais de Aécio. Uma leve inflexão em São Paulo ou no sul, bastaria para levar Dilma a já ganhar no primeiro turno.
E tudo depende, em parte, de que os que não pensam ainda em votar nela, ou se reservam para um incerto segundo turno, reformulem sua opção já em 5 de outubro, em nome de um processo real, longe de miragens aventureiras, com resultados imprevisíveis e arriscados.
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Aos que só querem votar em Dilma num possível segundo turno - Instituto Humanitas Unisinos - IHU