13 Junho 2014
A oração é a eloquência da fé dos cristãos: se não houvesse a oração – esse dirigir-se a Deus de modo pessoal – não haveria nem mesmo a fé, que é confiança posta em Deus, adesão ao Senhor vivo. Para o cristão, é justamente a oração a ação por excelência, a práxis eficaz na história.
A reflexão é do monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado no jornal La Repubblica, 09-06-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Não sabemos se, no seu tempo, o padre jesuíta Bergoglio leu o livro do seu coirmão Jean Daniélou, L’oraison, problème politique. Era 1965, e o Vaticano II tinha desencadeado uma reflexão profunda sobre a incidência da presença cristã na história e sobre a eficácia não só do agir dos cristãos na sociedade contemporânea, mas também do seu pôr-se diante de Deus, trazendo consigo na oração os seus irmãos e as suas irmãs em humanidade.
Certamente, o evento desejado pelo Papa Francisco e vivido no dia 8 de junho nos jardins vaticanos não é o primeiro gesto que o bispo de Roma faz para afirmar que, onde uma solução não parece encontrar saídas humanas, sociais ou políticas, a oração pode inserir na história energias vitais de paz, justiça, solidariedade. Pense-se na primeira saída de Roma do Papa Francisco e no momento forte de oração e de invocação de perdão realizado em Lampedusa.
Talvez alguns possam entender mal gestos como esses, considerá-los como uma substituição da política e dos seus fracassos; outros podem se irritaram com a insistência com que os cristãos recorrem à oração sempre que uma guerra enfurece, que se cometem injustiças, que se fomentam hostilidades.
Ritos inúteis? Anestésicos para uma consciência dilacerada? Não, justamente a oração é a eloquência da fé dos cristãos: se não houvesse a oração – esse dirigir-se a Deus de modo pessoal – não haveria nem mesmo a fé, que é confiança posta em Deus, adesão ao Senhor vivo.
Para o cristão, é justamente a oração a ação por excelência, a práxis eficaz na história. Quando se vivem temporadas difíceis, situações de impasse dramático, momentos em que toda saída parece bloqueada, cada um mede acima de tudo a própria impotência, a incapacidade de entender claramente as próprias razões de um conflito...
Mas é precisamente na consciência da impotência que o cristão se dirige ao Senhor: não para invocar soluções mágicas, não para se sentir excluído do compromisso e da responsabilidade, não para ser isento da história, mas porque a sua fé no Senhor da história o leva a interceder.
Ora, "interceder" significa "dar um passo entre", mover-se entre duas realidades, inserir em uma situação negativa elementos capazes de mudá-la: significa tornar-se solidário com quem está em necessidade, obtendo de dentro a ajuda possível, significa sobretudo fazer a vontade do Senhor, que é sempre vontade de perdão, de paz, de vida plena.
Jesus disse: "Se vocês, que são maus, sabem dar coisas boas aos filhos, quanto mais o Pai do céu! Ele dará o Espírito Santo àqueles que o pedirem" (Lucas 11, 13). Eis a "coisa boa" que os cristãos pedem na oração: o Espírito Santo que age no coração e nas mentes dos homens e insere neles pensamentos e projetos de paz. Eis o que os cristãos estão certos de obter, porque Jesus prometeu...
Então, essa oração torna-se eficaz na história, uma oração capaz de recolher o grito das vítimas, os brados que invocam justiça. Essa oração se faz voz de todo o sangue inocente derramado, desde o de Abel, o justo, até o dos pobres, das vítimas de uma violência e de um conflito do qual não podem sair vencedores, mas apenas derrotados: homens e mulheres desfigurados por gerações pela brutalidade da violência do ser humano contra o seu próprio semelhante.
A oração é um componente essencial da história, porque o grito dos pobres e das vítimas que sobe a Deus pedindo justiça e paz não se perde, como disse Jesus: "Deus não faria justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele?" (Lucas 18, 7). Quem pensa que a oração é uma fuga da história, uma isenção a baixo preço, mostra que não conhece a expectativa, a esperança e vive a sucessão dos eventos como um eterno continuum em que reina o fatalismo e a leitura cínica da realidade.
Quando o sucessor de Pedro pede que a Igreja reze, ele pede que ela seja consequente mais do que nunca com a própria fé, que esteja na história com as armas que lhe são próprias, as armas salvíficas da intercessão, ele pede que ela esteja no mundo sem ser mundana, que assuma um comportamento inspirado na escuta da palavra de Deus.
E, quando o bispo de Roma ousa pedir que homens políticos de outras fés se unam a ele e aos outros cristãos para elevar orações ao único Deus e para invocar o Seu perdão, ele não dá passo diplomático, mas se coloca como um irmão ao lado deles, para ser junto com eles intercessores junto a Deus e, a partir dessa posição tão árdua, juntos oferecer aos rivais e às vítimas um sinal de esperança, de coragem e de confiança na capacidade humana de evitar o mal e escolher o bem comum.
Não sabemos que frutos trará a oração do domingo passado em Roma, não sabemos se a oliveira plantada vai crescer até dar fruto e dar luz e bálsamo para aqueles que os anseiam. Sabemos, porém, como lembrou o Papa Francisco nessa segunda-feira, que a palavra que nos faz encontrar é "irmão", que o estilo da nossa vida deve se tornar "paz", e que é a essa paz que a oração nos conduz. Sim, mesmo quando as aparências parecem afirmar o contrário, a oração – diálogo com o Deus que salva – salvará o mundo.
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A oração salva o mundo. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU