07 Junho 2014
Como Bergoglio se comportará depois das prisões de algumas semanas atrás? A Igreja sempre participou da Exposição Universal, mas hoje, com as cartas nas mãos da procuradoria italiana, o clima do Vaticano é muito pesado. Um giro de bilhões e prevaricação que poderiam manchar a imagem do papa que hoje está cada vez mais convencido da desistência da participação.
A reportagem é de Francesco Peloso, publicada no jornal Pagina 99, 04-06-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
E agora, o que o Vaticano fará? Sim, agora que as prisões e os conluios entre política e negócios ocuparam as páginas dos jornais, agora que o sistema dos contratos fraudulentos, o desvio constante e quase científico das leis com a desculpa do evento extraordinário estão nos autos judiciais, agora que a bolha Expo 2015 estourou quase como se se tratasse do remake cansado da primeira Tangentopoli, como irão se regular do outro lado do Tibre?
Talvez, mais uma vez, estava certo o Papa Francisco quando, no dia 4 de dezembro passado, acusava um súbito e misterioso mal-estar para evitar de se encontrar com a delegação da Expo, que tinha viajado ao Vaticano acompanhada pelo arcebispo de Milão, Angelo Scola.
No entanto, o evento foi importante demais também para a Igreja, de modo que, no fim, no dia 17 de janeiro, o encontro chegou a termo: Scola e a delegação da Expo tiveram audiência, nas mesmas horas em que a Santa Sé e a organização do megaevento assinavam um acordo para a participação do Vaticano com um pavilhão próprio.
De fato, nos sagrados palácios, tinha sido encontrada uma mediação entre o estilo bergogliano e a tradição que queria que a Santa Sé participasse da Exposição Universal desde os tempos de Pio IX. Custos reduzidos ao mínimo, amplo papel para a Cáritas, um pavilhão totalmente dedicado à fome no mundo e ao desperdício de alimentos.
No início, parecia que os museus vaticanos deveriam enviar algumas obras de prestígio, mas, depois, realmente não se fez nada.
Imediatamente depois do encontro com Francisco, o presidente da Expo, Giuseppe Sala, concedeu uma coletiva de imprensa no Vaticano, durante a qual, àqueles que objetavam que havia o risco de desvio de recursos e intervenções das procuradorias, como ocorrera regularmente no passado para todos os grandes eventos itálicos, ele respondeu que já tinham sido assinados protocolos de legalidade antimáfia com o ministro Cancellieri e depois especificava: "Se forem verificadas problemáticas de legalidade na sua empresa, você automaticamente sai da área de trabalhos da Expo".
Sala tem nada a ver com as investigações, e talvez por isso as suas palavras despertam ainda mais inquietação. Os valores dos investimentos são conhecidos. Em linhas gerais, trata-se disto: 1,3 bilhão de euros de dinheiro público, com uma boa contribuição do governo, 350 milhões provenientes das empresas parceiras do evento, um bilhão de investimentos estrangeiros.
Depois, os transportes, o fluxo de dinheiro que se pensava obter do turismo; uma supertorta que acabou no moedor dos subornos em uma cidade e em uma região que não só há 20 anos, mas em tempos muito recentes, viram uma concatenação de eventos relacionados com fatos pequenos e grandes de corrupção.
Nesse magma de negócios e político, o "sistema Comunhão e Libertação", através dos seus homens de referência, acabou muitas vezes nos papéis da magistratura.
Além disso, para a diocese de Milão, que é o outro grande protagonista eclesial do evento, a explosão do escândalo foi um forte golpe. A Expo também podia representar, de fato, para a Igreja um grande momento de visibilidade. Mas, no Vaticano, também viam os riscos da operação, opulência demais no evento, dinheiro demais.
Assim, o cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga, chefe do Conselho dos nove, ou seja, do grupo restrito de cardeais que assessoram o papa no governo da Igreja universal, no fim, pegou nas mãos o novelo-Expo. Coube a ele ir para Milão para apresentar o programa de uma presença da Santa Sé no evento que não fosse ostentosa e fosse projetada para o social. Maradiaga, de fato, também é o presidente da Caritas Internationalis. O papa tinha sido convidado para Milão. Tudo parecia em equilíbrio, mas agora tudo está de volta em discussão.
O secretário de Estado, Pietro Parolin, no início de maio, confirmou que a Igreja estará na Expo de Milão. Depois, pronunciou palavras de condenação da corrupção; mas parece uma linha frágil. Por outro lado, a Santa Sé assinou um protocolo de participação na Expo 2015, e romper um acordo dessa magnitude não é coisa simples. As repercussões em nível internacional seriam muito pesadas. Muitos governos poderiam, nesse ponto, dar sequência às dúvidas dessas semanas e retirar a sua presença da Expo.
O comissário vaticano para a Expo é o cardeal Gianfranco Ravasi, factotum dos eventos culturais vaticanos proveniente da diocese de Milão, que é auxiliado por dois vice-comissários: um vaticano, Mons. Pasquale Iacobone, e outro da diocese de Milão, Luciano Guazzetti, da Cáritas.
Em suma, a Santa Sé tentou remodular a sua presença em termos mais circunscritos, mas o grande evento se consuma em bilhões de euros, com antigos nomes de Tangentopoli que voltam a despontar, com a sombra que paira sobre o Comunhão e Libertação, e as prisões – no último dia 10 de maio – de Angelo Paris, diretor da Expo 2015, e de outras seis pessoas, entre políticos e empresários, como se diz nas crônicas judiciais.
Depois, causou rebuliço a gravação em que o ex-Democracia Cristã, Gianstefano Frigerio, que passou para o Forza Italia, explica que, "com o novo papa, não há proteção", enquanto o amigo "ministro das finanças, o cardeal Versaldi, certamente não protege os ciellini [membros do Comunhão e Libertação]".
O cardeal em questão é um bertoniano de origem certificada, presidente da Prefeitura dos Assuntos Econômicos da Santa Sé, órgão já suplantado pelo recém-nascido ministério das finanças vaticanas liderado pelo australiano George Pell.
Não é segredo, por outro lado, que houve contraposições entre ciellini e bertonianos na era Ratzinger. Também deve ser considerado o envolvimento direto da diocese de Milão no evento, também através da sua agência para o turismo religioso, Duomo Viaggi e Turismo, parceira da Expo 2015, que contribuirá para gerir os fluxos turísticos para a Itália e a Lombardia.
Agora, no Vaticano, se está pensando – já que nunca houve confirmação oficial – em uma desistência papal na festa milanesa, embora na Via della Conciliazione a enorme faixa "Expo 2015" está exposta em um grande edifício em reformas.
De fato, Francisco irá abordar as questões relacionadas com a crise alimentar mundial por ocasião da segunda conferência internacional sobre a fome, convocada pela FAO (Roma, 19 a 21 de novembro de 2014). A presença na conferência já foi confirmada oficialmente pelo observador permanente da Santa Sé junto à agência da ONU, Mons. Luigi Travaglini.
Em maio do ano que vem, será realizada a Expo, e é difícil que Bergoglio discurse sobre o mesmo assunto depois de tão pouco tempo. O Vaticano está à procura de uma solução.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O escândalo Expo Milão 2015 e a vergonha da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU