18 Março 2014
É consenso entre economistas que a manutenção do baixo nível de desemprego está relacionada ao menor número de pessoas em procura de uma ocupação. Os motivos que levaram à saída de jovens e adultos da População Economicamente Ativa (PEA) e suas possíveis consequências sobre o mercado de trabalho e a produtividade, no entanto, são tema de debate.
A reportagem é de Arícia Martins, publicada pelo jornal Valor, 17-03-2014.
Dois estudos sobre o assunto chegam a conclusões diferentes. Tanto o Itaú Unibanco quanto a MCM Consultores apontam que a queda da taxa de participação - ou seja, a relação entre a PEA e a População em Idade Ativa (PIA) - foi influenciada pela faixa etária de 18 a 24 anos. O Itaú associa esse movimento ao maior tempo dedicado pelos jovens aos estudos e à expansão do programa Fies, do governo federal. A MCM dá ênfase ao ganho de participação do grupo conhecido como "nem-nem", aqueles que nem trabalham, nem estudam.
Num terceiro estudo, o economista Igor Velecico, do Bradesco, conclui que a tese que os jovens são os principais responsáveis pelo baixo desemprego não encontra respaldo nos dados do IBGE. Ele também não concorda com a ideia de atribuir ao Fies o adiamento da entrada dos jovens na PEA.
Para os economistas Aurélio Bicalho e Luka Barbosa, do Itaú, há evidências de que a desaceleração da economia, a expansão do Fies e os ganhos de renda contribuíram para o recuo na oferta de mão de obra jovem. Segundo eles, entre 2012 e 2013, a média de jovens de 18 a 24 anos fora da força de trabalho subiu de 1,58 milhão para 1,62 milhão, alta de 47 mil. O total de inativos que estudam aumentou em 38,7 mil entre um ano e outro, ante alta de 8,7 mil no grupo dos que não estudam.
Os analistas do Itaú notam que, em 2010, a taxa de juros do Fies caiu de 9% para 2,4%, ao mesmo tempo em que os prazos de carência foram ampliados. Após as mudanças, o número de matrículas no programa - que era de 50 mil ao ano em média entre 1999 e 2009 - saltou para 76 mil em 2010, 154 mil em 2011, 377 mil em 2012 e 556 mil em 2013.
Segundo Bicalho e Barbosa, a saída dos jovens do mercado de trabalho vai exercer, no curto prazo, pressão sobre a inflação. No médio prazo, o maior nível de escolaridade tende a contribuir para que a economia tenha maiores ganhos de produtividade.
Essa análise é colocada em xeque pelo estudo da MCM. O recuo na taxa de participação dos jovens de 18 a 24 anos é considerado importante pela consultoria, mas a saída de pessoas de 25 anos, ou mais, do mercado também é destacada. A hipótese da busca por maior educação para explicar esse movimento é "bastante atraente", afirma a MCM, devido ao aumento da renda familiar e aos programas que facilitam o acesso ao ensino superior.
Para testar essa explicação, os economistas dividiram o grupo dos jovens inativos entre aqueles que estudam e os que não estudam. Embora, em termos absolutos, o primeiro grupo supere o segundo em quase todo o período analisado (desde 2006), a MCM destaca que essa diferença diminuiu desde meados de 2011.
Para a MCM, a participação decrescente dos jovens na PEA não tem potencial de gerar alterações importantes no mercado de trabalho. Em uma hipótese que assume como inverossímil, em que todos os jovens - tanto os "nem-nem" como os que estudam -entrassem na PEA, a consultoria calcula que o impacto máximo na taxa de desemprego seria de 0,4 ponto a mais no resultado de 2013 e de apenas 0,1 ponto em 2012.
O pesquisador Rodrigo Leandro de Moura, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), destaca que a taxa de desemprego dos jovens é quase o triplo da de adultos: ficou em 11% no grupo de 18 a 24 anos em janeiro, ante 3,8% na faixa de 25 a 49 anos.
"Qualquer redução da participação dos jovens na PEA afeta muito o desemprego", diz Moura, para quem esse movimento recente está mais relacionado ao aumento da educação do que à maior ociosidade. O economista observa, porém, que a qualidade do ensino -não abordada no estudo do Itaú - é igualmente importante para avaliar como o ingresso futuro de jovens mais qualificados no mercado poderá contribuir para elevar a produtividade.
Por fim, o estudo de Velecico, do Bradesco, não chega a uma conclusão sobre o que estaria levando os jovens a saírem do mercado de trabalho, mas argumenta que os dados da PEA e da População Não Economicamente Ativa (PNEA) mostram que esse não seria o principal motivo por trás do desemprego baixo.
O avanço do número de inativos entre janeiro de 2013 e janeiro de 2014, diz Velecico, foi liderado pela população mais idosa. Nessa comparação, a população não economicamente ativa de 50 anos ou mais aumentou em 824 mil, enquanto o total de inativos de 18 a 24 anos teve acréscimo de 109 mil.
A PEA, que deveria ser o espelho da PNEA, mostra comportamento divergente, diz o economista do Bradesco. Mesmo assim, diz, essa variação recente vai contra a tese de que os jovens são os principais responsáveis pelo menor crescimento da força de trabalho, já que, em 2013, esse movimento foi puxado por adultos de 25 a 49 anos.
"Além disso, se o Fies de fato está expurgando jovens do mercado de trabalho, deveria ocorrer um movimento unidirecional na PEA de jovens (caindo ao longo de 2012 e caindo em 2013), e o que se vê é uma forte alta em 2012 e uma 'devolução' quase espelhada em 2013", afirma Velecico.
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O mistério da saída dos jovens do mercado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU