23 Mai 2013
A FETRAF-Sul (Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do RS) e a CUT (Central Única dos Trabalhadores) entregaram nesta quarta-feira (22) uma carta aberta ao governador Tarso Genro a respeito dos conflitos de terra envolvendo agricultores familiares e indígenas. De acordo com o documento, os direitos dos agricultores se encontram na “iminência de serem violados” diante da possível desapropriação de terras.
A informação é publicada por Sul 21, 23-05-2013.
De acordo com o documento, a FETRAF-Sul está convicta de que os trabalhadores têm o direito de continuar “sobrevivendo do trabalho em suas terras, dando prosseguimento à história, à cultura e ao modo de vida iniciado pelos seus tataravôs imigrantes”. A carta também afirma que é injusta e até “criminosa” a tentativa de desapropriar os trabalhadores das terras.
Eles pedem que as regiões de colonização histórica por agricultores familiares sejam tratadas de forma diferenciada para preservar seus direitos e reivindicam a suspensão imediata das demarcações de terras indígenas nessas regiões.
A carta também solicita que seja estabelecida uma “mesa de negociação com a participação dos diversos órgãos governamentais (estaduais e federal), representantes dos agricultores para debater alternativas às questões territoriais postas”.
Leia abaixo a carta na íntegra
Carta aberta ao excelentíssimo senhor governador do Estado do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, sobre os conflitos de terras envolvendo agricultores familiares e indígenas.
Porto Alegre, 16 de maio de 2013.
A FETRAF-SUL/CUT vem se manifestar acerca dos direitos dos Agricultores Familiares que se encontram na iminência de serem violados diante da grave ameaça de desapropriação de terras produtivas, que foram regularmente adquiridas por tais agricultores, e, também, sobre a Portaria Declaratória de TI Passo Grande da Forquilha – Sananduva e Cacique Doble e Getúlio Vargas, Erebango e Erechim (Mato Preto) e demais áreas envolvidas.
CONSIDERANDO:
1. Que o RS vivencia uma série de conflitos envolvendo as comunidades indígenas e agricultores familiares. Essa situação originou-se quando a FUNAI iniciou o processo de identificação de áreas para instalação de novos territórios indígenas, mediante a emissão de grande número de laudos antropológicos que não observam o marco temporal da Constituição Federal de 1988. Hoje, no estado, são 16 áreas que se encontram em conflito ou na iminência de conflito, e que a partir da análise dos laudos, no próximo período, poderão ser declaradas como terra indígenas;
2. Que no RS ocorre, diferente do restante do país, que as terras foram colonizadas pelo Estado brasileiro (União e entidade federada), e em alguns casos, em parceria com colonizadoras que venderam os títulos de terra há mais de um século para os agricultores familiares;
3. Que em todo o processo, os agricultores familiares são vítimas, tanto quanto os indígenas, porém, com maior gravidade. Quem faz os laudos e julga todo o processo, inclusive os recursos dos agricultores é a FUNAI (FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO). Isso provoca uma distorção nos processos e gera conflitos locais, com constantes ameaças entre agricultores e indígenas, criando um quadro de tensão e insegurança que atinge toda a comunidade. A situação ganha amplitude, uma vez que permeada por conflitos sociais e ideológicos nas regiões ocupadas por agricultores familiares descendentes de imigrantes. Para exemplificar, no norte do Estado estão em estágio avançado de demarcação 10 áreas indígenas ( Mato Preto – Getúlio Vargas, Votouro – Faxinalzinho e Benjamin Constant, Passo Grande do Forquilha – Sananduva e Cacique Doble, Carreteiro – Água Santa, Xengu – Constantina e Novo Xingu, Mato Castelhano – Mato Castelhano, Inhacora – São Valério do Sul, Irai – Irai), Campo do Meio – Gentil, Marau e Ciríaco, Cacique Doble – Cacique Doble, São José do Ouro, Santo Expedito do Sul, Rio da Várzea – Nonoai;
4. A FETRAF-SUL não se manifesta contra os preceitos constitucionais tampouco contra os direitos territoriais dos povos tradicionais, mas entende como injusta e até criminosa a tentativa de desapropriar agricultores familiares que há mais de um século sobrevivem em suas terras.
DAS CONVICÇÕES
1. Diante dos fatos relatados, a FETRAF-SUL está convicta de que os agricultores familiares têm o direito legal e legítimo de continuar sobrevivendo do trabalho em suas terras, dando prosseguimento à história, à cultura e ao modo de vida iniciado pelos seus tataravôs imigrantes;
2. É inadmissível tratar regiões de colonização intensiva com pequenos agricultores minifundiários do Sul do Brasil da mesma forma como são tratadas as regiões de antigos exploradores e usurpadores de terras de povos tradicionais como no centro oeste e na Amazônia. Os agricultores familiares não podem pagar hoje pelos desmandos das elites latifundiárias, cometidos no passado.
3. Não pode a FUNAI fazer todo o processo de identificação, de emissão dos laudos e do julgamento da defesa técnica durante a fase administrativa. Portanto o Estado Brasileiro precisa corrigir essa discrepância, criando uma instância julgadora que tenha isenção para analisar e julgar a defesa apresentada pelos agricultores.
PAUTA DE REIVINDICAÇÃO
Diante das razões acima expostas apresentamos a pauta dos agricultores familiares:
1-Marco Regulatório:
a) Tratar de forma diferenciada as regiões de colonização histórica e intensiva por agricultores familiares minifundiários de forma a preservar os seus direitos contra a incidência do Art. 231, § 6º da CF/88, que declara nulos os títulos de propriedades colonizadas de boa-fé;
b) Que os processos demarcatórios de áreas indígenas sejam analisados por uma ampla comissão composta por diversos órgãos do Governo Federal, tais como, Ministério da Agricultura, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Embrapa, Advocacia Geral da União entre outros;
c) A revogação do Decreto nº 1.775/96 que dispõe sobre os procedimentos administrativos de demarcação das terras indígenas e dá outras providências;
2 – Propostas Imediatas:
a) A suspensão imediata das demarcações de terras indígenas em regiões de colonização intensiva por agricultores familiares minifundiários em terras legalmente colonizadas pelos Estados do Sul do Brasil;
b) Os agricultores não aceitam indenização porque não concordam com a desapropriação. Assim, se o Governo entender necessário criar novas áreas indígenas que o processo se dê pela compra de terras por licitação pública;
c) O imediato retorno dos indígenas acampados em áreas de conflito às suas áreas/reservas originárias de maneira a evitar o acirramento das disputas;
d) Que se constitua uma mesa de negociação com a participação dos diversos órgãos governamentais (estaduais e federal), representantes dos agricultores para debater alternativas às questões territoriais postas;
Cleonice Back
Coordenadora Estadual da Fetraf
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Trabalhadores agrícolas entregam carta a Tarso Genro sobre conflitos de terras - Instituto Humanitas Unisinos - IHU