22 Outubro 2012
A medida provisória (MP) 584, editada no dia 10 de outubro com isenções fiscais de R$ 3,8 bilhões para a Olimpíada do Rio em 2016, deve ser o próximo alvo de polêmica envolvendo a legislação referente aos grandes eventos esportivos que o país sediará. O motivo é que alguns dos seus dispositivos são controversos e contrários à prática tributária no país.
A reportagem é de Caio Junqueira e publicada pelo jornal Valor, 22-10-2012.
Caso do artigo 19, que delega ao Comitê Olímpico Internacional (COI), ao Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de 2016 (Rio 2016) as pessoas físicas e jurídicas que poderão ser alvo dessas isenções. Ou seja, órgãos alheios a estrutura estatal terão poder de apontar quem poderá deixar de pagar tributos federais. O Rio 2016 é presidido por Carlos Arthur Nuzman, também presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB).
Para a oposição, isso abre espaço para possíveis favorecimentos a empresas que tenham relação com dirigentes dessas instituições. Tanto que o presidente do DEM, senador José Agripino (RN), apresentou uma emenda para impor a necessidade que sejam respeitados os princípios da impessoalidade e da isonomia nessa indicações. "O objetivo é evitar que a escolha dos beneficiários reste contaminada por eventuais relações de apreço e desapreço em relação às autoridades com poder de indicação. Busca-se conferir um mínimo de objetividade ao processo", justificou.
A MP também prevê que, se o COI ou o Rio 2016 não indicarem os beneficiários das isenções, isso será feito pela Autoridade Pública Olímpica (APO), o consórcio público formado pela União, Estado do Rio e município do Rio para, entre outras obrigações, monitorar a execução das obras dos Jogos.
Outra ponto controverso foi apontado em uma nota técnica da Consultoria de Orçamento do Senado publicada na quarta-feira da semana passada. O consultor José Rui Gonçalves Rosa considerou a MP uma afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). "[A MP] Não veio acompanhada de estimativa de renúncia fiscal e de medidas de compensação conforme determina a LRF. A adequação orçamentária diz respeito à compatibilidade de medidas tributárias adotadas, cuja eventual renúncia de receitas seja contrabalançada por medidas compensatórias, frente à necessidade de se manter o resultado primário. Ela não atende aos requisitos da LRF. Não está adequada do ponto de vista orçamentário e financeiro", disse.
De fato, a exposição de motivos não acompanhou a MP quando foi publicada no "Diário Oficial da União", embora conste no site da Presidência da República. Ali, seu signatário, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, afirma que "essas renúncias serão consideradas para efeito de manter o ajuste fiscal", mas não aponta de onde sairão as compensações, conforme determina o artigo 14 da LRF.
Um terceiro item que pode gerar polêmica é o artigo 27 da MP. Ele impõe a retroatividade a essas isenções fiscais, que passariam a valer desde 1º de janeiro de 2012. A oposição reclamou. A deputada Carmen Zanotto (PPS-SC) também pediu a exclusão desse artigo. "Não há justificativa para a retroação desses benefícios. Não pode o governo simplesmente devolver recursos já arrecadados de empresas que se beneficiarão a partir de 1º de janeiro de 2013", afirma.
O Valor pediu esclarecimentos ao Ministério da Fazenda, mas não obteve retorno. Na exposição de motivos, Barbosa garante que há previsão orçamentária para a retroatividade, tendo em vista que "operações econômicas, que estão acobertadas por garantias do governo federal, já estão em curso desde 1º de janeiro de 2012". Sobre a delegação da indicação dos beneficiários, afirma que "somente são alcançadas pelos benefícios as operações diretamente relacionadas com a organização e realização dos eventos, devendo tais operações serem passíveis de comprovação por intermédio de documentação fiscal idônea".
Tamanha a relevância da MP para o Rio que a bancada fluminense se articulou para comandar a comissão mista instalada na semana passada para analisá-la. Por enquanto, já garantiram assento nela os senadores Lindbergh Farias (PT) e Francisco Dornelles (PP); e os deputados Edson Santos (PT), Rodrigo Bethlem (PMDB), Marcelo Matos (PDT) e Felipe Bornier (PSD). O prazo para indicação partidária ainda não se encerrou. Bethlem será o presidente da comissão. Ele é braço direito do prefeito reeleito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), de quem foi secretário de Ordem Pública e depois de Assistência Social. Em suas emendas, os parlamentares do Rio buscam ampliar o leque de beneficiários com a isenção de tributos. Dornelles sugere que ela alcance a importação para cavalos, armas brancas, embarcações à vela e remo, embarcações de passageiros que sirvam de hospedagem a turistas, projetos de infraestrutura urbana, entre outros. Otávio Leite (PSDB-RJ), candidato derrotado à Prefeitura do Rio neste ano, propôs a aprovação de uma emenda que cria um regime especial de tributação "para construção, ampliação, reforma ou modernização da infraestrutura necessária à realização dos Jogos". Alessandro Molon (PT-RJ) pretende que as isenções alcancem a Jornada Mundial da Juventude, que será realizada no Rio em 2013.
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MP confere ao COI poderes da Receita Federal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU