19 Junho 2012
Peter Stengele (foto), religioso do mosteiro de Hegne, é um dos padres e diáconos que, com os coirmãos, convidou a assinar a declaração Divorciados em segunda união. Na entrevista concedida à revista Konradsblatt, ele explica por que uma reforma nesse âmbito é urgente e como ele responde à crítica de desobediência.
O documento de um grupo de padres e diáconos da diocese de Friburgo, de maio de 2012, pede que se admitam os divorciados em segunda união aos sacramentos.
A reportagem é de Stephen Langer, publicada no sítio da revista Konradsblatt, 13-06-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Juntamente com outros padres, o senhor foi um dos promotores da iniciativa sobre o tema Divorciados em segunda união. Por quê?
Por que esse tema é a ponta do iceberg de um enorme bloco da reforma da nossa Igreja e, ao mesmo tempo, um assunto extremamente urgente para milhares de pessoas envolvidas, para os agentes de pastoral e para as comunidades. Ele ficou evidente em março, quando foram encontrados cerca de 60 signatários do apelo em apoio ao memorando dos teólogos do ano passado. Nas intensas intervenções daquele encontro, também veio à tona urgentemente a dificuldade de muitos padres e diáconos de não poderem agir abertamente segundo as suas convicções no acompanhamento espiritual de divorciados em segunda união. É preciso pôr fim agora a esse conflito interior. Por isso, decidimos elaborar posicionamentos claros sobre temas individuais, bem fundamentados do ponto de vista teológico, com uma orientação pastoral, e expressá-los publicamente.
Por que vocês se manifestam exatamente agora e desse modo? Não está em curso um processo de diálogo?
Para mim, o Katholikentag (congresso dos católicos alemães) de Mannheim também já mostrou que a paciência de muitas pessoas se esgotou. Elas não querem mais falar de diálogo e de reviravolta, nem querem ser novamente repassadas para a Igreja universal ou para Roma, também não querem mais ser iludidas com o discurso sobre "processos espirituais" – elas querem, ao contrário, pôr-se verdadeiramente a caminho e viver realmente a mudança. O tema dos divorciados em segunda união já é considerado há décadas um problema pastoral urgente e continuamente se fala sobre ele. Eu mesmo sou padre agora há 34 anos e, durante todo esse período, fui muitas vezes confrontado, de um lado, com a dor provocada por essa regulamentação jurídica cruel e, de outro lado, também com a sincera luta de tantas pessoas nessa situação de vida, que eu preciso dizer: esse tema não admite mais nenhuma postergação.
A dificuldade é uma coisa, as prescrições da Igreja universal são outra...
Sim. Acima de tudo, devemos considerar a dificuldade das pessoas envolvidas. Mas também é assim para o evangelho. A boa notícia é uma notícia que convida, um anúncio de misericórdia e de amor – não um documento legal, de juízo e de exclusão. Estou convencido de que Jesus, com as suas palavras e os seus comportamentos, nos indicam um outro caminho, se o escutarmos. Ele se comportou de modo misericordioso com as pessoas e não aceitou nenhum compromisso. Queria que as pessoas se sentissem livres do medo. E ainda uma terceira coisa: nós nos preocupamos também com a nossa Igreja. Com a prática atual no modo de se relacionar com os problemas e as preocupações das pessoas, continuando a adiar os problemas, no fim, nós nos desmantelamos. Quantas pessoas deixaram a Igreja por causa dessa atitude! Nós não queremos aceitar esse fato e ficar olhando sem fazer nada. Na verdade, o futuro da nossa Igreja é muito importante para nós.
Por essa convicção, vocês agem até mesmo contra o direito canônico...
O direito, na realidade, deve tornar a vida possível. Naturalmente, estamos comprometidos com a obediência. Mas, a meu ver, a obediência não deve ser cega. Isso seria contrário à essência do anúncio cristão. Nós nos colocamos em uma atitude de lealdade crítica à nossa Igreja, porque a amamos. Portanto, para nós, obediência significa ouvir juntos o evangelho, tomar o exemplo da atitude de Jesus e ajudar-nos reciprocamente a permanecer no caminho – em seu caminho.
Da parte da cúpula do arcebispado, a sua iniciativa foi rejeitada e definida como "nem útil nem construtiva"...
Estamos cientes do fato de que o arcebispo Zollitsch (bispo de Friburgo e presidente da Conferência dos Bispos da Alemanha) se encontra em uma situação difícil. Mas nós permaneceremos com ele: queremos buscar novos caminhos com ele. Quando se diz que é preciso falar juntos, um com o outro, e não um acima do outro, bem, essa é justamente a nossa atitude. Vemos a nossa iniciativa como uma contribuição para manter vivo o diálogo e para chegar finalmente a uma solução. Ainda mais que, em um número crescente de pessoas da nossa Igreja, não diminui a séria vontade de um diálogo aberto. Também me parece importante que as comunidades saibam como os seus padres e diáconos pensam.
O senhor realmente acredita que a sua iniciativa pode mudar alguma coisa?
É inegável que não só entre nós, mas em todas as dioceses e nas cidades vizinhas há homens e mulheres empenhados, grupos eclesiais, associados etc. que tomam a palavra. Lembro-me da grande contribuição da KDF (Associação das Mulheres Católicas Alemãs) justamente em torno do tema dos divorciados em segunda união, que coletaram no outono de 2011, quase 100 mil assinaturas em favor desse pedido. Ou, quase simultaneamente a nós, uma iniciativa de padres em Rottenburg, que também se posicionaram sobre esse assunto.
Talvez seja o espírito do Concílio que volta à memória por causa do próximo 50º aniversário e que nos impulsiona. Eu acredito nisso. Sim, nós realmente esperamos que agora algo se mova – e, ao mesmo tempo, os nossos bispos. O próprio arcebispo Zollitsch, em entrevista, definiu o tema dos divorciados em segunda união como "uma questão de misericórdia". Eu gostaria que ele compreendesse a nossa iniciativa como um impulso nessa direção.
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Divorciados em segunda união: ''Chega de conflito interior'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU