02 Abril 2012
Esse cemitério chamado Mediterrâneo. De acordo com as estimativas da Fortress Europe, de 1998 até agosto de 2011, 17.738 pessoas morreram tentando chegar à Europa. Só em 2011, cerca de 2000 homens, mulheres e crianças morreram no Estreito da Sicília: 5% de todos aqueles que tentaram chegar à Europa partindo da Líbia.
A reportagem é de Umberto De Giovannangeli, publicada no jornal L'Unità, 30-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Muitos – observa o relatório – são refugiados que fogem de guerras, violências e perseguições, que não têm outra alternativa senão tentar a perigosa viagem de mar para obter a proteção de que precisam. A possibilidade de pedir asilo na União Europeia depende da presença física da pessoa no território de um Estado membro. Mas as medidas introduzidas no âmbito do regime de vistos e das fronteiras da UE tornaram praticamente impossível para quase todos os requerentes de asilo e refugiados chegar aos territórios da UE de modo legal.
Não só foram reforçados os controles nas fronteiras externas, mas os sistemas de vigilância também foram ampliados para os territórios dos países terceiros. Estima-se que em 2011 cerca de 90% de todos os requerentes de asilo na UE tenham entrado ilegalmente. Além disso, a maior parte das pessoas que tentam chegar à Europa geralmente são sujeitas a graves violações dos direitos humanos em sua viagem e, em particular, nos países de trânsito e em alto mar. Os migrantes muitas vezes são interceptados e rejeitados no mar, sem ter a possibilidade em muitas ocasiões de buscar asilo na UE, com o risco real de que os direitos humanos dos refugiados e o princípio da "não rejeição" ser violado.
A gravidade desse contexto traz à tona a sentença sobre o "caso Hirsi" do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que estabeleceu que, ao rejeitar os migrantes para a Líbia, a Itália violou a Convenção Europeia dos Direitos Humanos e particularmente o princípio que veta o repatriamento dos emigrantes nos países onde poderiam sofrer perseguições ou tratamentos desumanos e degradantes. A Europa e a Itália têm a obrigação de oferecer proteção aos refugiados e deveriam abrir entradas legais como único remédio para impedir as viagens desesperadas por mar.
Nesse cenário inquietante, o Centro Italiano para os Refugiados (CIR) apresentou no dia 29, em uma coletiva de imprensa na Câmara dos Deputados, propostas operacionais e recomendações políticas para promover vias de acesso para a proteção em favor dos requerentes de asilo e refugiados. Para lhes dar uma possibilidade diferente do que a de pagar os traficantes, atravessar o mar em botes improvisados e arriscar suas vidas, forçados a um ingresso irregular na Itália e em outros países da UE.
"O acesso à proteção é um direito humano", destaca Sabino Pezzotta, presidente do CIR, que salientou que na Europa vivem apenas 10% dos refugiados totais e, na Itália, há apenas 56.397 pessoas às quais foi reconhecido o status de refugiados, enquanto no Paquistão estão 1.900.621 e na Síria, 1.005.472. "Precisamos introduzir gradualmente medidas que permitam chegar à UE de modo protegido e regular", acrescentou.
São propostas complementares às do programa de reassentamento, que também preveem a saída protegida de pessoas diretamente dos países de origem onde temem graves perseguições, através da emissão de vistos especiais. "O nosso relatório é apresentado em um dia extremamente simbólico e importante", afirma Christopher Hein, diretor do CIR. "De um lado, pela primeira vez, o Parlamento Europeu adota um programa europeu em matéria de reassentamento, justamente uma daquelas formas de acesso que nós promovemos fortemente, e, de outro, o Conselho da Europa condena duramente a criminosa omissão de socorro que levou 63 imigrantes e refugiados à morte no ano passado".
"O CIR – continua Hein – colaborou com a Assembleia Parlamentar nessa investigação, e consideramos que os resultados deveriam dar uma sacudida na consciência coletiva e evitar no futuro que navios que poderiam prestar socorro simplesmente se dirijam para outro lado".
O programa, em vigor a partir de 2013, prevê que a UE irá conceder uma contribuição de 6.000 euros por pessoa em favor de todos os Estado membros que aderirem ao programa para transferir refugiados reconhecidos pelas Nações Unidas de países de primeira chegada para o Estado membro. Trata-se de um mecanismo que permite a chegada regular de refugiados com base em cotas anuais que os governos individuais disponibilizam. Atualmente, apenas 13 Estados estabeleceram essa cota. A Itália não está entre eles, embora recententemente algumas operações de reassentamento tenham sido realizadas com base em decisões ad hoc.
A última dessas operações ocorreu há um ano em favor de 115 refugiados eritreus transferidos de Trípoli para Crotone pela Força Aérea. "Estamos muito satisfeitos – conclui Hein – com essa importante decisão como primeiro passo para a abertura de canais de ingresso protegidos na UE de pessoas que fugiram de perseguições, guerras e violências, e que não podem encontrar proteção nos países de primeiro refúgio. Seria muito desejável que a Itália também ponha em ação um programa de reassentamento, notificando-nos a respeito até o dia 1º de maio, para poder se beneficiar com a contribuição europeia do próximo ano".
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Cemitério do Mediterrâneo: 17 mil cadáveres - Instituto Humanitas Unisinos - IHU