Por: Cesar Sanson | 22 Dezembro 2011
Em uma reunião da Cúpula do Mercosul, realizada em Montevidéu e marcada pela morte do subsecretário de Comércio Exterior da Argentina, Ivan Heyn, os presidentes chegaram a acordos em matéria tarifária. Cristina Kirchner assumiu a liderança pro tempore pedindo uma resposta comum à crise.
A reportagem é de Julián Bruschtein e publicado pelo Página/12, 21-12-2011. A tradução é de Luiz Carlos Correa Soares, colaborador do Cepat.
"Há um novo mundo, mas não há novas idéias", enfatizou a presidente Cristina Kirchner, parafraseando o lema da última reunião do G-20, em seu discurso na 42ª Cúpula do Mercosul, ao assumir a presidência pro tempore do bloco, função que estava com o uruguaio José Mujica. Em um dia ofuscado pela morte do subsecretário de Comércio Exterior argentino, Ivan Heyn, o encerramento da Cúpula dos presidentes do Mercosul foi agitado e com muito debate entre os mandatários.
A admissão da Venezuela tomou grande parte da discussão e, nesse tema, nada se aprovou em definitivo. Os aumentos das tarifas de exportação ocuparam outra parte e, neste caso, foi alcançado um acordo importante. Também se sancionou uma declaração de que os países membros não aceitarão a entrada de navios com bandeira das Ilhas Malvinas. "O que alguns vêem como algo ameaçador para a região eu vejo como uma oportunidade histórica.Temos muito trabalho a ser feito", disse a presidente em seu discurso ao assumir a presidência do bloco para os próximos seis meses. A crise internacional e suas consequências sobre a região foi uma questão sobre a qual os presidentes se manifestaram com firmeza em seus pronunciamentos.
"O acordo sobre o aumento na pauta de exportação vai nesse sentido", explicou um funcionário da comitiva, que estava distribuída entre o salão de reuniões e a sala de imprensa. As idas e vindas sobre o tema durante todo o debate colocaram sobre a mesa novamente as diferenças entre países pequenos e grandes no bloco sul-americano.
O dia só começou após as 13 horas, quando já tinham chegado todos os chefes dos Estados membros do Mercosul: José Mujica, Dilma Rousseff, Fernando Lugo, Rafael Correa e mais Hugo Chávez, da Venezuela, em nome dos países associados, com pedido para serem integrantes plenos.
Após a recepção oficial e o almoço oferecido por Pepe Mujica, a primeira tarefa política do dia foi a assinatura do Tratado de Livre Comércio com a Palestina. O acordo tem um caráter profundamente político, já que é "mais um passo no reconhecimento internacional de um Estado palestino", disse um funcionário nos corredores da sede do bloco, em um intervalo da reunião.
O evento se desenrolava sem problemas até que um assessor da presidente informou-lhe da morte de Heyn, encontrado enforcado em seu quarto no Hotel Radisson. Aí, Cristina Kirchner teve de fazer uma pausa, abalada pela notícia, antes de retornar às atividades.
Não tão calmo
A discussão foi intensa e duradoura na reunião que manteve os presidentes ocupados grande parte da tarde. A proposição da delegação uruguaia para que a Venezuela entre como membro pleno do bloco tomou a maior parte do debate, enquanto os chanceleres estavam em uma sala contígua tentando chegar a um acordo sobre o aumento das tarifas.
Os presidentes se mostraram de acordo com a participação plena, mas apesar da proposta resguardar o Tratado de Assunção, não foi bem sucedida. Lugo destacou sua incapacidade de aceitar dada a situação que existe no Senado de seu país, no qual a oposição é maioria, e se recusa a aceitar a adesão da Venezuela. Alguns legisladores paraguaios estiveram todo o dia lançando, desde terras guaranis, advertências sobre o "julgamento político" que fariam a Lugo no caso de ser ignorado o parecer do poder legislativo local.
A proposta dos ministros do exterior tentou "dar um impulso político" para a questão, mas de modo a afetar o mínimo possível o presidente Lugo. Assim, a variável que se trabalhou foi a admissão como um socio pleno com direitos e deveres, mas em "processo de regularização", para não passar por cima da votação a ser realizada pelo Senado paraguaio. Na parte da manhã, Lugo já se reunira com Mujica na sede do governo uruguaio para discutir amplamente o assunto porque Mujica quis antecipar a questão por ser o criador e o iniciador da proposta.
No final da reunião, o chanceler paraguaio sublinhou que "defendemos ir construindo com o Congresso do Paraguai, onde temos dificuldades, por visões diferentes, não só com refrência à Venezuela, mas também sobre a importância do processo de integração", explicou o ministro das relações exteriores paraguaio Jorge Lara, após a reunião bilateral e a ratificação de que o Paraguai "está comprometido com a entrada da Venezuela no Mercosul".
A presença de Hugo Chávez no encontro - a primeira saída internacional oficial realizada desde que ele tomou conhecimento de sua doença e do tratamento -, mostrou a decisão do lider bolivariano de que seu país faça parte do bloco comercial do sul. A partir da assinatura do acordo se confirmará um "grupo de diálogo de alto nível para a promoção da incorporação de novos membros de pleno direito ao bloco regional", que irá trabalhar para dar fecho final com a adição da Venezuela e começar a desenvolver mecanismos para inclusão também do Equador.
Intenso debate
No recinto em que se reuniram os chanceleres também houve um intenso debate. Chegava a hora do fecho e os temas centrais da Cúpula não ainda estavam acordados. A discussão trouxe de novo situações de diferenças de tamanho e de industrialização dos países. A proposta de elevar a tarifa extra-zona foi impulsionada pela Argentina e pelo Brasil - Cristina e Rousseff tinham falado sobre o assunto na posse do segundo mandato na Argentina - como uma medida para proteger a economia contra os golpes da crise internacional. Portanto, Uruguai e Paraguai tornaram a realçar o problema das assimetrias que predominam no bloco, embora finalmente aprovassem a proposta. O acordo consiste em implementar um instrumento transitório que possibilite a seleção das posições tarifárias para aumentar taxas até 35%, limite máximo permitido pelas normas internacionais.
Palavra final
"Lembro-me como abordamos a crise quando parecia que o mundo estava vindo a baixo. Lembro de Lula dizendo que devíamos convencer a nossa sociedade de que tínhamos de continuar a consumir e fortalecer o mercado interno," observou a presidente em seu discurso ao final na rodada em que todos os chefes de Estado já tinham falado. Cristina trouxe o exemplo do tremor de 2009 para reforçar a idéia de unidade na região. "Aquele que acredita que crescendo em detrimento de outro vai se salvar, eu o notifico de que ele está equivocado. Na Argentina isso aconteceu e quebrou tudo", ressaltou recordando a crise de 2001. "Temos que ter uma visão que vá além do comercial, tomando-o como um instrumento para apoiar-nos, porque nossa obrigação é que toda a região vá bem", sentenciou.
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Cúpula do Mercosul. Intenso debate - Instituto Humanitas Unisinos - IHU