18 Mai 2011
Auxiliada pelos líderes da coalizão governista no Congresso, a bancada ruralista aproveitou a situação de fragilidade política do ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, para arrancar do governo um acordo favorável aos seus interesses na votação do Código Florestal.
A reportagem é de Mauro Zanatta e Caio Junqueira e publicada pelo jornal Valor,19-05-2011.
Acuado por denúncias de ter multiplicado por 20 seu patrimônio em apenas quatro anos, Palocci, que vinha comandando o tema com "mão de ferro" nos bastidores, foi obrigado a recuar em algumas imposições e ceder aos ruralistas, a maior parte deles integrante da coalizão governista na Câmara dos Deputados. A oposição tentou convocar o ministro a explicar-se no plenário da Casa. Nas comissões, houve várias tentativas semelhantes.
Mas um acordo fechado ontem pelos líderes dos principais partidos aliados do Planalto, à exceção do PT, pavimentou a "boa vontade" dos ruralistas com o governo. E deve permitir a votação de um texto mais "palatável" na terça-feira.
Apenas a delegação de poderes ambientais aos Estados ficou de fora, segundo os líderes reunidos na Comissão de Agricultura da Câmara. Esse item ficará a cargo do Senado. Assinaram a proposta o PMDB, PDT, PP, PR e PTB.
Para garantir uma votação ao gosto dos ruralistas, uma emenda de plenário será apresentada pelo líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), e não mais pelas bancadas oposicionistas do DEM e do PSDB. A tática "poupa" o governo de uma derrota no plenário da Câmara ao "descaracterizar" o texto como uma exigência da oposição.
O texto, elaborado pelo relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP), consolida todos as áreas cultivadas até julho de 2008, concede "anistia" de multas a quem regularizar a área e permite a soma de áreas de preservação (APP) com a reserva legal (RL). Autoriza a compensação de exigências legais fora do Estado do desmatamento original, mas no mesmo bioma, e garante uma averbação simplificada. Também desobriga a recomposição de RLs em propriedade de até quatro módulos fiscais (de 20 a 400 hectares, segundo o município), além de regularizar produção em encostas,topos de morro e áreas" salgadas".
Deputados aliados e da oposição rejeitaram uma "troca" entre um refresco ao ministro Palocci e a aprovação do código. "É uma acusação maldosa. Se fosse assim, seria muito mais fácil fechar esse acordo pela manhã. Não há qualquer relação", disse o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP). No mesmo tom, o líder do DEM, ACM Neto (BA), disse que "nunca aceitaríamos" um acordo para livrar Palocci. "Isso é loucura. Vamos continuar toda a luta nas comissões e no plenário para que Palocci venha a esta Casa prestar os esclarecimentos sobre sua evolução patrimonial".
Ao fim do dia, porém, era unânime a impressão de que o governo preparou um modo de amenizar sua derrota. O código será votado antes de qualquer outra matéria, para sinalizar à oposição a formalização do acordo descumprido na semana passada pelos líderes governistas. Essa foi a promessa de Henrique Alves para "domar" os ruralistas rebeldes no PMDB.
Parlamentares ligados ao Planalto afirmaram, nos bastidores, que o acordo teve claro objetivo de "encerrar" a radicalização do caso Palocci. O governo avaliou que medidas provisórias com temas que considera relevantes, como a que torna menos rígidas as regras de licitação da Copa 2014 e a Olimpíada 2016, tornavam necessário fechar logo um acordo para "destravar" a pauta. "Foi o acordo possível. Hoje, não tem como o código ser mais para a frente", disse um interlocutor da Casa Civil.
O texto do novo código será votado com Palocci em situação complicada. Mas com uma base satisfeita e ansiosa por tirá-lo da crise. "Para nós, a questão do Palocci está encerrada. Esse assunto é página virada", afirmou o líder Henrique Alves. E completou: "Convocar o ministro para o plenário? Pelo amor de Deus!".
A votação do código também mobilizou o vice-presidente Michel Temer. Ele sugeriu ontem ao ministro Palocci que o governo desista de adiar a votação na Câmara. Mesmo que isso represente um resultado adverso ao Planalto. E lembrou a Palocci que o texto ainda pode ser modificado no Senado ou, em última instância, sofrer vetos da presidente Dilma Rousseff. Palocci ponderou que ainda preferia negociar um pouco mais o texto, e que aguardaria uma reunião com os líderes Cândido Vaccarezza e Henrique Alves.
Temer rejeitou ter ficado "melindrado" por estar fora das negociações do Código Florestal. "Eu só entrei nessa negociação porque percebi que as conversas estavam emperradas. Quando a presidente Dilma estava na China, sugeri ao presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), que chamasse ao meu gabinete os integrantes da Comissão de Agricultura, os ambientalistas e os ruralistas". Michel Temer lembra que, no dia seguinte, reuniu-se novamente para tratar do assunto, dessa vez com os ministros envolvidos na questão. "Mas em nenhum momento quis mudar as coisas. O interlocutor do governo nessa matéria é o chefe da Casa Civil, ministro Antonio Palocci", declarou o vice-presidente.
O líder do PV na Câmara, José Sarney Filho (MA), afirmou não ter participado do "acordão" patrocinado pelos partidos da base aliada ao governo, e avisou que vai obstruir a votação do Código Florestal no plenário da Câmara, na terça-feira. Na mesma linha, o PSOL também está definindo sua atuação.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Ruralistas arrancam de Palocci, fragilizado politicamente, acordo para o código - Instituto Humanitas Unisinos - IHU