14 Mai 2011
"Santo já!": foi ouvida, no último dia 1º de maio, Dia do Trabalhador, com a beatificação de João Paulo II, o pedido gritado pelos neocatecumenais e pelos jovens focolarinos e da renovação carismática no funeral de Wojtyla, no dia 8 de abril 2005.
A reportagem é de Luca Kocci, publicada na revista italiana Adista, nº. 37, 14-05-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Beatificação em tempo recorde, seis anos após sua morte (para o papa do Concílio, João XXIII, foram necessários 37), fortemente desejada por Ratzinger, que, desse modo, pôde se "apropriar" da popularidade do seu antecessor. É uma imagem eloquente a de Bento XVI que beatifica João Paulo II (o homem para quem emprestou sua obra durante anos), de um papado que santifica a si mesmo para reforçar o poder da instituição eclesiástica e para reafirmar a centralidade de Roma e da cúria em uma Igreja cada vez menos "povo de Deus", segundo a expressão do Concílio Vaticano II, e cada vez mais verticalista e hierárquica.
Mesmo tendo passado tão pouco tempo desde o final do seu pontificado, é possível tentar historicizar a figura de João Paulo II e dos seus 27 anos na liderança da Igreja Católica. Falamos a respeito com Daniele Menon, professor de história contemporânea da Scuola Normale di Pisa, um especialista em papado na idade moderna e autor do livro editado pela Morcelliana Giovanni Paolo II, una transizione incompiuta? Per una storicizzazione del pontificato [JP II, uma transição incompleta? Por uma historicização do pontificado].
Eis a entrevista.
Como o pontificado de João Paulo II se coloca na história da Igreja do século XX?
A Igreja do século XX é marcada pelo confronto com a modernidade: da condenação do começo do século se passou à tentativa, com João XXIII e do Vaticano II, de integrar alguns de seus princípios. Wojtyla teve que se confrontar com os limites até os quais podia estimular essa integração, já que a exigência de autodeterminação do homem contemporâneo ia bem além das previsões do Concílio. Sua escolha foi clara: a capacidade apostólica da Igreja não está posta em jogo no esforço de acompanhar os homens rumo ao cumprimento histórico da modernidade, mas sim no apoderamento de todos os instrumentos que esta coloca à disposição, para reafirmar a autoridade da hierarquia eclesiástica sobre as instituições fundamentais do consórcio civil.
Quais são os elementos fundamentais do seu pontificado?
Parece-me que ele permaneceu constante à orientação, em uma percepção aguda das estruturas profundas da sociedade do espetáculo e da imagem, a assegurar uma presença de primeiro plano da Igreja e do próprio papa nos meios de comunicação de massa, o que lhe permitiu o inegável relançamento do papel público da instituição eclesiástica. Mas também houve reviravoltas, até significativas, como a mudança da atitude com relação aos ordenamentos liberal-democráticos depois de 1989.
Em que sentido?
No início, João Paulo II se inseriu na linha assumida pelo Vaticano que, com relação ao tradicional princípio católico de indiferença para com os regimes políticos, substitui o princípio da preferência pelos ordenamentos democráticos, considerados como a condição em que melhor se realizam, nas presentes circunstâncias históricas, as exigências éticas da Igreja com relação à pessoa e à sociedade. Mas depois do colapso dos regimes comunistas e na fracassada construção na Europa de uma ordem democrática que incorporasse as prescrições da Igreja sobre os direitos fundamentais das pessoas, particularmente com relação ao direito à vida desde a concepção até a morte, o seu juízo se torna mais sombrio. Um regime que fixa as regras da convivência só com base nas escolhas da maioria, sem levar em conta aquela verdade objetiva que a Igreja proclama possuir exclusivamente, ainda é equiparado aos totalitarismos.
Qual foi a atitude de João Paulo II com relação ao Concílio Vaticano II?
Wojtyla sempre se apresentou como um fiel executor das deliberações do Concílio. Na realidade, os documentos conciliares, fruto de longas mediações, contêm múltiplas possibilidades de leitura, e ele deu uma interpretação restritiva a eles: o Vaticano II não representou, como muitos queriam, um novo início no caminho de uma Igreja que precisa de reformas radicais, mas se pôs no rastro de uma tradição voltada a adequar os meios da Igreja às condições históricas para tornar mais eficaz a sua capacidade de expansão.
Devido às suas posições com relação à guerra, João Paulo II foi considerado por todos como um papa pacifista...
O papa nunca abandonou a teologia da "guerra justa", pelo contrário, reafirmou o seu valor em documentos oficiais, como o Catecismo da Igreja Católica. No entanto, ele endureceu as suas condições, com base na avaliação de que, no mundo contemporâneo, o recurso à violência bélica torna muito mais problemático aquela restauração de uma ordem justa da convivência humana à qual a ética cristã deve ter como objetivo. E proclamou que a religião jamais pode legitimar uma guerra, anulando-se assim qualquer justificação para a guerra santa. Esses deslocamentos induziram a considerá-lo como um papa pacifista, mas ele não o foi.
Por que o Vaticano se apressou para beatificá-lo?
Em uma estrutura monárquica como a Igreja Católica, a cúpula decidiu suspender as normas vigentes com base em avaliações de oportunidade política. Trata-se, aqui, de apoiar os impulsos dos setores eclesiais que queriam a canonização de João Paulo II no momento do seu funeral, com a intenção de mostrar uma plena sintonia entre hierarquia e "povo" dos fiéis. Mas também se quer, em uma perspectiva autocelebrativa, enfatizar o papel desempenhado por ele na restituição à Igreja de uma nova centralidade na cena pública. Também não falta, me parece, a vontade de repropôr a ideia medieval segundo a qual o próprio desenvolvimento da função papal torna santo quem a executa.
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Wojtyla beato: a Igreja se autocelebra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU