16 Novembro 2020
É provável que o grau diferente de confiança expressado em relação ao Papa Francisco e à Igreja reflita, em certa medida, a impressão de que o pontífice age de forma diferente – e quase alternativa – em relação à Cúria vaticana. Não à toa, no passado, ele a definiu como “a última corte da Europa”.
O comentário é de Ilvo Diamanti, sociólogo, politólogo e ensaísta italiano, professor da Università degli Studi di Urbino “Carlo Bo”, em artigo publicado por La Repubblica e reproduzido por FineSettimana, 14-11-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O Papa Francisco sempre esteve no centro da atenção pública e da mídia. Em primeiro lugar, porque ele é a autoridade mais importante da Igreja. E porque desempenha o papel de uma forma pouco “convencional”. Isto é, menos atento às “convenções”. Assumindo posições e tomando decisões discutidas até mesmo entre os católicos, assim como fora.
A “atenção” tornou-se recentemente “tensão” diante das suas palavras, retomadas por um documentário apresentado no Festival de Roma. No qual ele deseja “uma lei que proteja as uniões civis”. E acrescenta que “as pessoas homossexuais são filhas de Deus e têm o direito de estar em uma família”.
Por outro lado, ainda está forte a polêmica em relação ao escândalo financeiro que levou à renúncia imposta pelo papa ao cardeal Giovanni Angelo Becciu, seu colaborador durante anos. Além dos casos específicos, que se repetem com frequência, o Papa Francisco alimentou o debate desde 2013, quando foi eleito depois que Bento XVI decidiu renunciar. Um evento sem precedentes, que ainda hoje alimenta o “mito” da (co)presença de dois papas. Impróprio, pois entra em contraste com a unidade da Igreja.
Porém, desde o seu “advento”, o Papa Francisco obteve um amplo consenso, que supera as fronteiras do mundo católico. Ao contrário dos antecessores. Incluindo o Papa Ratzinger, cuja popularidade, durante o pontificado, de 2005 a 2013, conheceu fases alternadas. E, depois de alguns anos difíceis, havia subido para mais de 53% logo depois da renúncia, o que reforçou e “humanizou” a sua imagem.
Em vez disso, desde os primeiros anos de pontificado, mais de oito em cada 10 italianos manifestaram um alto grau de confiança no Papa Francisco. Muito mais alto do que na Igreja. Porque a Igreja, muitas vezes, é avaliada com distância e, às vezes, desconfiança pelos “não católicos”. E pelos não praticantes.
Por outro lado, é provável que o grau diferente de confiança expressado em relação ao Papa Francisco e à Igreja reflita, em certa medida, a impressão de que o pontífice age de forma diferente – e quase alternativa – em relação à Cúria vaticana. Não à toa, no passado, ele a definiu como “a última corte da Europa”.
No entanto, a popularidade do Papa Francisco caiu significativamente após 2016, quando, de 82%, caiu para 72% em 2018. Esse redimensionamento tem duas explicações principais.
A primeira se refere ao apoio declarado e reiterado de Francisco em favor dos “pobres do mundo”. Em particular, os imigrantes, que cruzam as nossas fronteiras. E geram insegurança. Dão um rosto ao nosso medo da globalização. Por isso, tornaram-se um tema de campanha eleitoral permanente.
A segunda razão para a queda de popularidade de Francisco após 2016 refere-se à mudança, anunciada por Bergoglio. Não só “no mundo”, mas também, sobretudo, “dentro” da Igreja. Um propósito que, em parte, gerou decepção.
No entanto, o declínio observado após 2016 nos últimos dois anos parou. E a confiança no Papa Francisco ainda é muito alta. A maior, na Itália, entre as figuras públicas, de acordo com as pesquisas mais recentes. Na realidade, ele continua recebendo o consentimento de sete em cada 10 italianos. E se trata de um apoio “transversal”. Que atravessa setores diferentes. Dentro e fora da Igreja. Reflexo de um “diálogo entre crentes e não crentes”, proposto, em diversas ocasiões, por Eugenio Scalfari, nestas páginas.
Assim, a confiança no Papa Bergoglio é quase total entre os “praticantes assíduos”, aqueles que vão à missa (quase) todos os domingos. Mas também é majoritária entre os “praticantes ocasionais”. E envolve metade dos “não praticantes”. A confiança na Igreja, por outro lado, cai sensivelmente, junto com a prática religiosa. Até chegar a 9% daqueles que nunca vão à missa.
A credibilidade de Francisco, quando observada a partir de uma perspectiva política, parece igualmente transversal. Mesmo que contradiga, em parte, a orientação de antigamente, quando a distância do papa e da Igreja crescia à esquerda.
Por outro lado, o muro caiu. Junto com o Partido Comunista. Assim, hoje, a confiança no papa chega ao máximo entre os eleitores do Partido Democrático (87%) e diminui na direita. Mas permanece elevado por toda a parte. À esquerda, no centro e à direita.
De fato, o Papa Francisco é estimado por mais de 70% dos eleitores do Força Itália e do Movimento Cinco Estrelas. Além disso, por cerca de dois terços da base do Fratelli d’Italia. E por pouco mais da metade dos que votam na Liga.
Por outro lado, a Igreja só é levada em consideração pelos eleitores do Força Itália. Hoje, quando o partido de Berlusconi perdeu a “centralidade” de antigamente.
No fundo, repete-se aquilo que acontece na política. Em que a personalização se tornou dominante. Essa é a “Igreja de Francisco”. E o Papa Francisco, consequentemente, não hesita em abrir conflitos na Igreja. Porque, se a confiança no papa desmoronasse, a “fé” também desmoronaria. Na “sua” Igreja.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Da fé à confiança. Francisco, mais popular do que a sua Igreja. Artigo de Ilvo Diamanti - Instituto Humanitas Unisinos - IHU