Sínodo Pan-Amazônico. “O Instrumentum laboris não é um documento terminado, o discernimento não foi concluído, o processo segue em andamento”. Entrevista com Maurício López

08 Agosto 2019

À medida que se aproxima a Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Região Pan-Amazônica, se intensificam também as atividades preparatórias nos nove países que integram o bioma pan-amazônico.

No caso da Colômbia, a Igreja previu uma Assembleia Pré-Sinodal em Bogotá, no próximo 13 de agosto – com o apoio da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM – que abordará os “novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.

Esse será, ademais, o tema do painel em que participará o secretário-executivo da REPAM, Mauricio López, que compartilha algumas perspectivas sobre o processo sinodal, o Instrumentum Laboris e suas implicações para a Igreja colombiana.


Maurício López, secretário-executivo da REPAM. Foto: Vida Nueva

A entrevista é publicada por Vida Nueva Digital, 08-08-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

Eis a entrevista.

Tempo de escuta.

Em que etapa se encontra o Sínodo Pan-Amazônico?

Consideramos muito importante insistir que o Sínodo é um processo que leva consigo um caminho histórico feito pela Igreja desde o Concílio Vaticano II, pelas Conferências do CELAM na América Latina, e depois pela vida entregada por mulheres e homens missionários, missionárias, padres, religiosas e religiosas e bispos, que entregaram sua vida na Amazônia, com suas luzes e sombras.

Então, o Sínodo começa como consequência disso e arranca formalmente em Puerto Maldonado, em janeiro de 2018, e nesse sentido, a etapa em que estamos vivendo agora, depois da escuta ao território, o discernimento e a síntese das informações recebidas, tem que ver com a necessidade de devolver aos territórios e aos padres sinodais aquilo que foi trabalhado no Instrumentum Laboris.

As assembleias pré-sinodais

Nesse processo, que lugar ocupam as assembleias pré-sinodais que se realizam nos países pan-amazônicos?

Essas assembleias são essenciais por dois motivos. Um, para honrar as vozes que nos deram todos os agentes e todas as pessoas e comunidades que participaram na enorme escuta sinodal e agora, por outro lado, é ajudar aos padres sinodais a se preparar adequadamente para levar consigo também as esperanças, as dores e todos os horizontes que vêm do território.

O próprio papa Francisco, em audiência privada com o cardeal Hummes, cardeal Barreto e eu, nos disse que lhe interessava muito que essa fosse uma possibilidade de escutar depois de termos trabalhado o Instrumentum Laboris, a ver como as pessoas se sentem a respeito, e que não fosse somente um encontro de bispos, que o povo siga sendo partícipe desse processo.

O outro que é essencial, é que estão sendo conduzidas pelas conferências episcopais, diretamente, e isso é uma notícia muito boa. Embora a REPAM esteja ajudando, em todos os países através das REPAMs nacionais, são as conferências episcopais que estão conduzindo esses processos, apropriando-se da responsabilidade da preparação para os padres sinodais de cada um dos países.

São mínimas as vozes contra

Que impacto teve o Instrumentum Laboris?

Sobre a recepção do Instrumentum Laboris tenho que dizer que em várias ocasiões escutei que o povo de Deus, o povo que caminha cotidianamente, tecendo a Igreja, quando o lia dizia: “aí está a minha voz”, “está representada minha palavra”, “acolheram o que aqui se discutia”, e isso é uma graça, porém ao mesmo tempo é uma grande responsabilidade.

As esperanças de nosso povo, que agora se sente refletido nesse documento, estão também postas no discernimento sinodal, na Assembleia mesma que ocorrerá em outubro e nesses espaços preparatórios. Assim, creio que haja uma grande esperança, são mínimas as vozes que estão falando contra o Instrumentum Laboris, mas são vozes estridentes, com canais potentes.

No povo de Deus, aquele que o papa Francisco pediu que se escute, que tem o sensus fidei, o sentido de Deus, enquanto crê que se torna também infalível quando é um elemento de discernimento, aí está como uma grande esperança. Então, creio que se fez um grande trabalho, porém é muito importante insistir que o Instrumentum Laboris é um grão de trigo. O que isso quer dizer? Que se não morre, não dá fruto. Não é um documento terminado, o discernimento não se concluiu, o processo segue em andamento. O Instrumentum Laboris é uma coleção de grandes temáticas com uma sustentação que permite entrar ao discernimento na fase final do Sínodo.

O Sínodo é um espaço eclesial, não sócio-político

Como poderia repercutir o Documento de Trabalho na Assembleia Pré-Sinodal que se realizará na Colômbia?

Para a Assembleia Preparatória que ocorrerá na Colômbia, permitirá de alguma maneira trabalhar em uma realidade cotidiana e concreta, como a colombiana – e assim se sucederá nos demais países – sobre como se sente o povo representado ou não por esse documento, quais orientações dão a partir da realidade colombiana, especificamente dos povos, comunidades e bispos que serão padres sinodais, para que possam ser levadas ao sínodo, e que outras instâncias, como as governamentais, que sabemos que estão interessadas nesse processo, saibam que seu lugar é aí, no nível nacional.

O Sínodo em Roma, é um espaço eclesial, não é um espaço sócio-político. Não tem cabida representações governamentais, independentemente da linha que sejam, porque é um espaço de discernimento espiritual e eclesial e, então, é muito importante e agradecemos que nesses encontros ou assembleias nacionais, em cada conferência episcopal nacional possam participar todas as vozes diversas dos atores, incluindo expressões de instâncias governamentais ou outras com as quais queremos seguir trabalhando para o bem dos povos, para o futuro da Amazônia, para que tenha mais justiça, sobretudo na Colômbia, onde há situações que preocupam porque se percebe uma violência crescente contra os líderes sociais. Creio que isso poderá gerar uma sensibilidade para todo o país da Colômbia – não somente para os que estão na Amazônia – sobre a importância desse território para o presente e para o futuro.


Chamado à colegialidade


O que espera a REPAM da Igreja colombiana?

Mais além do Sínodo, desde antes e para o futuro se espera que se consiga estabelecer uma rede eclesial pan-amazônica colombiana, com profunda implicação e participação dos territórios, onde as próprias organizações e os povos façam parte junto com os bispos nesses processos de tecido conjunto. Que os bispos que pouco se implicaram, seja por falta de conhecimento, mas também as vezes por falta de interesse, realmente tomem em suas mãos essa responsabilidade histórica, nesse kairós, nesse momento preciso.

E que o exercício de coordenação, que agradecemos tanto a Pastoral Social – Cáritas da Colômbia, seja muito mais um espaço colegiado, de tomada de decisões conjuntas, de tecer em conjunto, porque isso é o que vai garantir que aqueles resultados do Sínodo, que são apenas uma semente em muitos casos, possam ser levados adiante, com seriedade, capacidade e eficácia, depois desse acontecimento.

O mais importante do Sínodo, é o depois do Sínodo, e o serviço da rede à Igreja – porque a rede é parte da Igreja, como instância de articulação – possa se fazer em condições adequadas para levar com valentia, força e profunda fraternidade, todos os chamados proféticos e samaritanos que esse Sínodo tem.

Assim que, em concreto, reconhecer a posição da Igreja colombiana em muitos casos também a favor dos povos, denunciando os assassinatos dos líderes sociais, promovendo alternativas específicas também econômicas e caminhando em temas de direitos humanos. Esperamos que isso se amplifique, que articule uma grande rede e que se sintam, cada vez mais, parte desse grande dinamismo territorial pan-amazônico.


A Igreja pan-amazônica em movimento


Quais outras assembleias preparatórias ainda serão feitas?

Estarão acontecendo em próximas datas, encontros como esse na Colômbia, Peru, Bolívia, Brasil e Equador. Já se deu o encontro na Venezuela e na Guiana Francesa.

Assim que toda a Igreja Pan-Amazônica se encontra em movimento, em discernimento e na chave de envio para a Assembleia Sinodal de Outubro, escutando e acolhendo as próprias vozes dos povos e as comunidades, porém sendo enviados também por isso para que os padres sinodais sejam portadores que levam suas esperanças, seus desejos e suas dores.

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