07 Junho 2019
"Assim, como sempre aconteceu, o tema dos direitos humanos continua a ser terra prometida em todas as discussões com Pequim. No entanto, ninguém pode se surpreender com o fato de que o aniversário do massacre consumado sob o retrato de Mao tenha caído no esquecimento. Às vezes, o esquecimento é uma escolha estratégica. Observando Pequim, é uma escolha crucial", escreve Alberto Bobbio, em artigo publicado por L’Eco di Bergamo, 06-06-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
É o aniversário mais indesejado. Ninguém quer lembrar a Praça Tiananmen e o banho de sangue ordenado pelo camarada Deng. As informações são escassas e ainda hoje é muito difícil reconstruir os fatos e as responsabilidades políticas dentro do Partido Comunista Chinês. Nem mesmo há certeza sobre o número de mortes. Variam de 319 admitidas oficialmente pela propaganda de Pequim a dezenas de milhares relatadas por agências ocidentais. A impressão é que nunca se chegará à verdade política e judicial sobre o que aconteceu na praça mais evocativa do dragão asiático na noite entre 3 e 4 de junho de 1989.
A história trinta anos ruiu. O ano 1989, agora inscrito na memória coletiva, parecia capaz de desenhar o grand finale do sistema comunista. Aconteceu em novembro com a queda do Muro de Berlim. Mas também devido a euforia, perdeu-se imediatamente a memória de Pequim. Assim, o ano de 1989 tornou-se annus mirabilis e os mortos de Tiananmen foram rapidamente varridos pelas retóricas pós-Guerra Fria.
Os estudantes chineses foram massacrados no ano errado. A China, então, não era o que acabaria se tornando. A Ásia não contava, era periferia do confronto entre as superpotências. Os estudantes que há meses se manifestavam nas ruas de Pequim eram um incômodo no grande jogo de normalização entre Moscou e Washington. Eles pediam um pouco mais de democracia e não apenas os radiantes horizontes econômicos prometidos pelo camarada Deng com sua política do autoritarismo desenvolvimentista, que não admitia primaveras.
Hoje, Tiananmen continua a ser um acidente não apenas para as autoridades de Pequim. É um incidente para todo o mundo que faz acordos com a China, que detém as chaves para muitas economias e possui importantes dívidas soberanas, começando por aquela elevadíssima dos Estados Unidos. Por que incomodar com a memória de Tienanmen, o maior jogador global indispensável para todos, a partir de Donald Trump? Assim, como sempre aconteceu, o tema dos direitos humanos continua a ser terra prometida em todas as discussões com Pequim.
No entanto, ninguém pode se surpreender com o fato de que o aniversário do massacre consumado sob o retrato de Mao tenha caído no esquecimento. Às vezes, o esquecimento é uma escolha estratégica. Observando Pequim, é uma escolha crucial.
O presidente Xi Jinping propôs um plano, a Rota da Seda, que cobre todo o planeta, e não apenas a Europa, com implicações geoestratégicas que abrem novos cenários sobre a importância da supremacia global chinesa. Ele lançou no plano interno novamente as palavras de ordem de uma "Longa Marcha" 4.0 e mostrou ao mundo estar apto a usar com enorme e inquietante perícia a inteligência artificial. As guerras comerciais prometidas, anunciadas e lançadas são um pequeno incômodo que não o perturbam.
Claro, os números da economia chinesa estão em declínio, mas tirar conclusões políticas negativas sobre supostas dificuldades em Pequim, olhando aos percentuais, está errado. São os números absolutos que dão a medida, apesar de tudo, do poder chinês. Mesmo que o PIB tenha desacelerado e cresça apenas 6,5 em termos absolutos, ainda continua sendo um valor impressionante. A economia de Pequim hoje vale praticamente dois terços da economia norte-americana e uma guerra comercial prejudica mais Washington do que Pequim.
Para os direitos humanos sempre houve pouco espaço. O jogo de pingue-pongue entre Nixon e Mao, que começou em 1972 e nunca terminou, sempre previu "uma abordagem construtiva" sobre o tema.
A desistência sobre Tiananmen é seu resultado perfeito. O mundo não pode se dar ao luxo de empalidecer diante do horror da vez. Nem sobre Tienanmen trinta anos atrás, nem sobre as praças sírias e iemenitas hoje.
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Tiananmen e a memória - Instituto Humanitas Unisinos - IHU