13 Fevereiro 2017
Até ontem, poderiam se pronunciar os 450 mil registrados no partido de esquerdas que, quando foi criado, em 2014, queria apoiar as reivindicações dos espanhóis "indignados".
A reportagem é publicada por Página/12, 12-02-2017. A tradução é de Henrique Denis Lucas.
Os militantes da formação de esquerdas espanholas, o partido Podemos, resolve hoje, mediante votação, se eles querem manter como instrumento a pressão que prevê manifestações nas ruas ou se optam por dar mais peso ao trabalho do partido nas instituições.
O líder do partido, Pablo Iglesias, e seu braço-direito, Iñigo Errejón, representam respectivamente ambas as posições sobre as quais poderiam se pronunciar, até ontem, os 450 mil registrados nesse partido de esquerdas que, quando foi criado, em 2014, queria apoiar as reivindicações dos espanhóis "indignados" que exigiam a regeneração da vida pública. Na atualidade, o Podemos é o terceiro partido no Congresso dos Deputados, atrás do governante, o Partido Popular (PP, de centro-direita), e os socialistas (Partido Socialista Operário Espanhol, PSOE), mas as pesquisas já o situam em segundo lugar, atrás apenas dos conservadores.
Apesar desta situação, notável para um partido tão jovem, o Podemos chegou a seu segundo congresso, neste fim de semana, com uma profunda divisão entre duas linhas defendidas por Iglesias e Errejón. Os gritos de "unidade, unidade" com os quais ambos foram recebidos ontem pelos participantes da conferência denotam a preocupação pelo risco de uma cisma, uma vez que as semanas anteriores foram marcadas por duros ataques entre ambos os lados.
Nesta oportunidade, foram votados os quatro documentos que marcarão a linha política do Podemos, os 62 membros do órgão diretivo (Conselho Cidadão) e o seu secretário-geral. Para esta posição, não há dúvidas, pois Iglesias tem como rival apenas um militante pouco conhecido da Andaluzia, de maneira que o líder será reeleito. Mas ele, diante do desafio proposto pelos documentos políticos de Errejón, lançou mão de um "tudo ou nada", de modo que, caso as suas propostas não sejam apoiadas, rejeitará a secretaria-geral, o que aprofundaria a crise.
Em seu discurso à assembleia ontem, Iglesias advertiu contra o "ensimesmamento e a fragmentação", que em sua opinião só beneficiariam os seus rivais, identificados com o PP e o PSOE. "Ninguém disse que seria fácil, seguimos dispostos a ganhar frente este mal governo. Não se fiem, senhores do PP (Partido Popular), os ventos da mudança continuarão soprando", disse Iglesias no início da assembleia. "Cometemos muitos erros, mas esta assembleia tem que ser um exemplo de unidade, fraternidade e inteligência", proclamou o secretário-geral do Podemos.
Enquanto isso, Errejón veio subestimando a ameaça de Iglesias de abandonar o cargo caso sua proposta política perca, e ontem voltou a enfatizar a importância do trabalho nas instituições. "O PP tem dito que estamos aqui, em Vistalegre, nos matando, mas estamos nos descobrindo", afirmou Errejón, para depois convocar à unidade "os que erguem o punho (referindo-se aos partidários de Iglesias) e aqueles que fazem o 'V' de vitória (para os seus adeptos)". Em seguida, o secretário político da força de esquerda argumentou que as tarefas fundamentais do Podemos já não são mais as de adentrar nas instituições, de pensar fora da caixa ou assustar os poderosos, mas oferecer um horizonte para o país. "A ofensiva dos que estão acima, a sua falta de vergonha, não serão opostas mediante a unidade dos rótulos comuns, mas através das pessoas simples e trabalhadoras", disse ele.
Ainda que ontem Iglesias e Errejón estavam mais calmos, há dias eles trocam fortes críticas, a tal ponto que o líder se lamentou de ter deixado que seu braço-direito acumulasse tanto poder, enquanto este assegurou que caso a linha política de Iglesias triunfe, o PP garantirá muitos anos no governo da Espanha.
No partido Podemos há um terceiro setor, minoritário, conhecido como os anticapitalistas, liderados pelo eurodeputado Miguel Urbán, que pode desempenhar um papel importante, caso restem atribuições para que seja feita uma direção mais colegiada, já que defendem a liderança de Iglesias mas compartilham alguns princípios com os apoiadores de Errejón. "Aqui em Vistalegre não há inimigos, somos parceiros, nossos inimigos estão lá fora e são poderosos", disse Urbán diante das bases do partido.
Depois de revolucionar o mapa político da Espanha, tornando-se a terceira força política do país, com cinco milhões de votos, o Podemos se encontra em um momento crítico que reflete não apenas uma luta pelo poder na liderança do partido, mas também diferentes concepções ideológicas que dizem respeito à estratégia a seguir frente ao governo de minoria do conservador Mariano Rajoy. Iglesias é a favor de reforçar o discurso de esquerda confrontante e agressivo com os partidos tradicionais, enquanto Errejón defende um Podemos mais transversal, capaz de tecer alianças parlamentares e gerar confiança e segurança para os cidadãos, de maneira a ampliar a base de apoio.
O resultado das votações será anunciado hoje, no início da tarde, depois do prazo de alguns dias concedido aos militantes para que votassem de forma telemática.
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Votação define o futuro do Podemos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU