01 Dezembro 2016
“A minha vocação, eu não devia viver na Terra Santa, embora muito amada, mas entre as almas mais doentes, as ovelhas mais remotas, mais abandonadas: este banquete divino do qual me tornei ministro, eu devia apresentar não aos irmãos, aos parentes ou aos vizinhos ricos, mas aos mais coxos, aos mais cegos, aos mais pobres, às almas mais abandonadas que mais precisam de sacerdotes.”
O jornal L’Osservatore Romano, 30-11-2016, publicou um trecho de uma carta do irmão Charles de Foucauld ao abade Caron, enviada de Beni Abbès, Argélia, no dia 8 de abril de 1905. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Sou um velho pecador que, no dia seguinte à sua conversão, há quase 20 anos, foi atraído com força por Jesus para viver a vida oculta de Nazaré. Desde então, eu me esforço para imitá-Lo, mas miseravelmente, infelizmente! Passei muitos anos nesta cara e abençoada Nazaré, doméstico e sacristão do convento das clarissas. Deixei esse lugar abençoado apenas para receber, há cinco anos, a ordem sagrada.
Padre livre da diocese de Viviers, os meus últimos retiros de diaconato e de sacerdócio me mostraram que esta vida de Nazaré, a minha vocação, eu não devia viver na Terra Santa, embora muito amada, mas entre as almas mais doentes, as ovelhas mais remotas, mais abandonadas: este banquete divino do qual me tornei ministro, eu devia apresentar não aos irmãos, aos parentes ou aos vizinhos ricos, mas aos mais coxos, aos mais cegos, aos mais pobres, às almas mais abandonadas que mais precisam de sacerdotes.
Quando jovem, eu percorri ao longo e ao largo a Argélia e o Marrocos: o Marrocos, tão grande quanto a França, com 10 milhões de habitantes, no interior não há nenhum sacerdote; no Saara argelino, sete, oito vezes maior do que a França, mais povoado do que se acreditava antigamente, há apenas uma dezena de missionários.
Como nenhum outro povo me parecia mais abandonado do que esses, eu pedi e obtive do prefeito apostólico do Saara a permissão para me estabelecer no Saara argelino para levar ali – em solidão, na clausura e no silêncio, no trabalho manual e em santa pobreza, sozinho ou com alguns outros padres ou leigos, irmãos em Jesus, na Adoração perpétua do Santíssimo Sacramento, se o bom Deus me der algum irmão – uma vida o máximo possível em conformidade com a vida oculta do amado Jesus em Nazaré.
Três anos e meio atrás, eu me estabeleci aqui em Beni Abbès, no Saara argelino, justamente na fronteira com o Marrocos, tentando, muito miseravelmente, de modo muito morno, viver ali a vida abençoada de Nazaré; até agora, fui apenas: “o grão de trigo que não morre, fica sozinho”.
Reze a Jesus para que eu morra a tudo o que não é Ele e a Sua vontade. Um pequeno vale é a minha clausura de onde eu saio apenas quando um dever muito urgente de caridade me obriga a fazê-lo – na falta de outro sacerdote (o padre mais próximo está a 400 km ao norte) – para levar Jesus a algum lugar...
Assim, fui forçado a viajar, por um longo tempo, em 1904... Mas eis-me aqui de volta à minha clausura, aos pés do divino Tabernáculo, para levar, sob olhos do Amado, uma vida tão semelhante à da divina casa de Nazaré, tanto quanto me permitir a miséria do meu coração...
Você entende agora como eu trago no coração o seu Jesus Adolescente! Quanto me comoveram as páginas em que você retrata o Modelo que, há 20 anos, eu me esforço para imitar! A sua partida para a Terra Santa me comove. Amo-a tanto, esta cara Terra Santa, e principalmente Nazaré!
Charles de Jésus, padre, 08 de abril de 1905
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Como um grão de trigo. Carta de Charles de Foucauld - Instituto Humanitas Unisinos - IHU