Rio 2016 expõe crise do modelo de Jogos Olímpicos

Mais Lidos

  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS
  • Dilexi Te: a crise da autorreferencialidade da Igreja e a opção pelos pobres. Artigo de Jung Mo Sung

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

05 Agosto 2016

Uma tempestade era tudo de que o Rio de Janeiro não estava precisando. Na noite deste sábado (30/07), a ventania que passou pela cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016 destruiu a rampa de acesso dos velejadores na Marina da Glória. O Comitê Organizador local só tem cinco dias para reparar os danos.

A reportagem é de Astrid Prange, publicada por Deutsche Welle, 05-08-2016.

"São coisas que acontecem. Ninguém consegue evitar a natureza", disse Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Rio 2016, sobre a mais recente pane nos preparativos para os Jogos. Afinal de contas, "se esquece que as competições de vela às vezes não acontecem porque não tem vento. Então, é uma obra da natureza", concluiu.

Mas, quem paga o reparo dos danos? Às vésperas do torneio mundial, está de volta a briga em torno dos custos para sua realização, de 5 a 21 de agosto.
O economista esportivo Wolfgang Maennig propõe uma flexibilização das exigências do Comitê Olímpico Internacional (COI), adaptando-as às circunstâncias no país anfitrião. "O COI vai ter que pensar num jeito de futuramente mudar sua concepção, de forma que em pelo menos três ou quatro cidades do mundo a maioria da população seja a favor das Olimpíadas".

A biografia de Maennig, hoje professor da Universidade de Hamburgo, está intimamente ligada aos Jogos. Em 1988, ele foi campeão olímpico de remo em Seul. Depois, apoiou as candidaturas a sede dos Jogos Olímpicos das cidades alemãs Munique, Leipzig e Berlim. No Rio, ele participará de diversos debates sobre o financiamento futuro do evento.

"A grande tarefa do COI será tornar-se muito mais flexível nos pré-requisitos para os locais esportivos", prossegue. Isso diz respeito tanto ao número de espectadores quanto aos padrões de segurança. "Tudo o que o COI exige segue as normas suíças ou alemãs, e não é assim que o resto do mundo quer construir".

A organização dos Jogos Olímpicos na metrópole brasileira custou cerca de 10 bilhões de euros. A discussão sobre os custos não se refere a essa soma total, mas sim à proporção entre verbas privadas e públicas. Segundo dados oficiais, 57% dos custos serão arcados por investidores privados.

Os críticos do movimento brasileiro Comitê Popular Copa e Olimpíadas, contudo, fazem uma conta diferente: os cofres públicos estariam participando com 63%, cabendo aos investidores privados apenas 37%. Tal discrepância se deveria ao fato de o Comitê Organizador Rio 2016 não ter levado em consideração nem os benefícios fiscais nem as vantagens recíprocas nas parcerias público-privadas.

Custos imprevisíveis, como o reparo de locais de competição ou o combate ao vírus zika, também não são levados em consideração nos orçamentos normais. Por isso, após desembarcar no Rio, o presidente do COI, Thomas Bach, invocou a coesão da família olímpica.

"Vamos ajudar o Comitê Organizador local nos problemas de liquidez", assegurou à imprensa reunida na metrópole. "Vamos fazer de tudo para garantir o êxito dos Jogos".

Segundo os termos do contrato, o COI financia um pouco mais da metade dos gastos do Comitê Organizador local. Como apoio financeiro aopresidente Nuzman, Bach anunciou agora que poderão ser adiados os depósitos, equivalentes a 500 milhões de euros, previstos para os dias da abertura e da cerimônia de encerramento.

Descartada fica a hipótese de os Jogos chegarem ao fim em déficit. Pois, exatamente como a Federação Internacional de Futebol (Fifa), também o COI recebe do governo em questão a garantia de que este arcará com todos os eventuais prejuízos.

Justamente aí algo precisa mudar, na opinião de Maennig. A fim de reativar o interesse das cidades em hospedar as Olimpíadas, o COI tem que não só reduzir suas exigências, mas também elevar as subvenções para o comitê local e a cidade-sede.

"Chegamos a um ponto em que poderíamos nos perguntar se não faria sentido o COI dizer: 'Esse estádio olímpico com 20 mil lugares, de que vocês precisam, financiamos nós. Esse é o nosso presente à cidade-sede.' A meu ver, isso deveria ser possível", considera o economista.

Pelo menos um pequeno presente os cariocas já receberam dos Jogos Olímpicos: um estudo da Fundação Getúlio Vargas mostrou que a renda per capita da metrópole cresceu 30% entre 2008 e 2016, enquanto no resto do país a percentagem média foi de 19,6%.

"Os Jogos Olímpicos mantêm a economia do Rio em funcionamento", explica Marcelo Neri, economista docente na Fundação Getúlio Vargas. Enquanto nos 18 municípios vizinhos do Rio de Janeiro a renda ficou estagnada, devido à crise econômica brasileira, na metrópole o crescimento se mantém.

Seria esta uma motivação para Roma, Paris, Budapeste ou Los Angeles se candidatarem a sede dos Jogos de 2024? Para Hamburgo, cuja população rejeitou o evento em referendo, certamente não foi.