05 Agosto 2016
Por ocasião da vigília organizada dentro da Jornada Mundial da Juventude, o site 350.org e o Global Catholic Climate Movement publicaram a carta que os jovens de todo o mundo dirigiram ao Papa Francisco com um objetivo duplo: agradecer o Santo Padre pelo seu compromisso em favor do clima e pedir-lhe para lançar um apelo pelo desinvestimento em fontes fósseis dentro do mundo católico.
A reportagem é do jornal La Stampa, 29-07-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Publicamos abaixo a tradução da carta (a versão original em inglês está disponível aqui), escrita pelo 350.org e assinada por mais de 140 organizações e movimentos juvenis de todas as partes do globo.
O apelo é uma importante iniciativa para que, dentro da Igreja Católica, seja percebida como cada vez mais urgente a exigência moral de abandonar os investimentos na indústria das fontes fósseis, de acordo com os valores proclamados na encíclica Laudato si’. Uma escolha desse tipo é encorajada na Itália também pela campanha #DivestItaly, que está se dirigindo prioritariamente às instituições e organizações católicas para encorajá-las a desinvestir nas fontes fósseis.
Eis a carta.
"A luta eficaz contra o aquecimento global só será possível através de uma resposta coletiva responsável, que supere os interesses e os comportamentos particulares e se desenvolva livremente de pressões políticas e econômicas. (…) Quando se fala de mudanças climáticas, portanto, existe um imperativo ético claro, definitivo e improrrogável a agir".
Papa Francisco
Nós escrevemos para o senhor como jovens, como membros de instituições jesuítas, outras instituições católicas, cristãs e religiosas, e instituições não religiosas como pessoas de boa vontade, em prol de uma geração inteira. Estamos à beira de uma catástrofe climática. É durante o tempo de vida desta geração que poderemos alcançar, ou mesmo ultrapassar, um aumento da temperatura global de 2ºC e começar a experimentar os mais severos impactos das mudanças climáticas. Mesmo à beira desse precipício, no entanto, encontramo-nos unidos em um movimento global abrangente pela justiça ambiental. Apesar das diferenças de origens culturais, nacionais e religiosas, reconhecemo-nos como irmãos e irmãs em uma comunidade global; apreciamos a Jornada Mundial da Juventude como uma oportunidade fundamental para aprender uns com os outros sobre os nossos papéis como guardiães ambientais e olhamos para o senhor como um líder nesse movimento.
Desde a publicação da sua encíclica Laudato si’ em junho passado, fomos inspirados pelo seu chamado à justiça climática e ao despertar da comunidade católica e global às causas sistêmicas da crise climática. Concordamos com a sua crítica à falta de resposta dos nossos políticos e líderes em enfrentar as mudanças climáticas. Santo Inácio de Loyola nos incitou a ver Deus em todas as coisas. Infelizmente, muitos dos nossos líderes estão ignorando essa importante lição. É notável o quão fracas têm sido as respostas políticas internacionais. A mensagem que estamos transmitindo ao mundo através do nosso trabalho de desinvestimento nos combustíveis fósseis ecoa a sua observação de que "a submissão da política à tecnologia e às finanças demonstra-se na falência das cimeiras mundiais sobre o meio ambiente. Há demasiados interesses particulares e, com muita facilidade, o interesse econômico chega a prevalecer sobre o bem comum e manipular a informação para não ver afetados os seus projetos" (LS 54). Concordamos totalmente com a sua análise, Santo Padre, e vemos o desinvestimento como um meio para retirar o poder político dos interesses especiais dos combustíveis fósseis, o que até agora tem ajudado a impedir a concretização de uma significativa legislação climática.
Como o senhor ensinou, combustíveis fósseis altamente poluentes devem ser substituídos sem demora, e isso não pode acontecer enquanto esses interesses detêm o controle dos nossos processos políticos. Além disso, o desinvestimento em combustíveis fósseis proclama, como o senhor fez no Segundo Encontro Mundial dos Movimentos Populares, que "há um fio invisível que une cada uma das exclusões". Você perguntou: "Podemos reconhecê-lo? Porque não se trata dessas questões isoladas. Pergunto-me se somos capazes de reconhecer que essas realidades destruidores respondem a um sistema que se tornou global. Reconhecemos que esse sistema impôs a lógica dos ganhos a qualquer custo, sem pensar na exclusão social ou na destruição da natureza?".
Nós respondemos: sim. Em toda a nossa volta, vemos as consequências assustadoras de uma economia extrativista capitalista, do colonialismo, do racismo sistêmico e de outras formas de injustiça. O desinvestimento como tática é fundamental para o movimento pela justiça climática na medida em que nos força a pensar nessas questões com uma intersetorialidade em escala global. Não se pode realmente abordar a crise climática e as questões de injustiça ambiental sem desmantelar o sistema mais amplo que permite que essas injustiças continuem. Chamando as nossas instituições a desinvestirem as suas verbas em companhias de combustíveis fósseis e a reinvestirem esses fundos em tecnologias renováveis e em uma nova economia, nós forçamos o diálogo sobre as mudanças climáticas em termos de um sistema global de que urgentemente precisamos.
Apesar dos desafios colossais que a nossa geração jovem enfrenta, nós temos esperança no futuro e estamos lutando para assegurar um mundo para nós mesmos em que um futuro justo e estável seja possível. Fomos inspirados e revigorados pelo seu testemunho do Evangelho e pelos seus chamados a uma mudança real e estrutural. Nós pedimos que o senhor apele que as nossas organizações, junto com outras instituições, desinvistam nos combustíveis fósseis. Algumas das maiores organizações católicas do mundo ainda têm milhões de dólares investidos em companhias de combustíveis fósseis altamente poluentes. Dentro de poucos anos, esse movimento que cresce extremamente rápido alcançou alguns marcos incríveis, mas, infelizmente, muitas das nossas próprias instituições, embora citem valores cristãos, estão ignorando o seu apelo à justiça climática, recusando-se a desinvestir.
Além disso, pedimos que o senhor desinvista o seu próprio "campus", já que o Vaticano tem uma responsabilidade igual a das nossas universidades e instituições a cortar os laços com a indústria dos combustíveis fósseis. Nós sinceramente acreditamos nos valores católicos da salvaguarda da Terra e dos povos oprimidos, e estamos oferecendo às nossas instituições a oportunidade de viverem esses valores também. Estamos fazendo tudo o que podemos, mas precisamos da sua ajuda para que, juntos, possamos participar da "globalização da esperança".
Obrigado novamente pelo seu amor e pela sua liderança, Santo Padre.
Como jovens por um mundo justo.
(Assinam os 114 movimentos e organizações juvenis signatários. A lista completa encontra-se aqui).
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Jovens enviam carta ao Papa Francisco para pedir o desinvestimento em fontes fósseis - Instituto Humanitas Unisinos - IHU