Por: Cesar Sanson | 03 Agosto 2016
O Congresso retomou suas atividades nesta semana. E as ameaças aos direitos socioambientais continuam. Dividida em frentes distintas, a atuação da bancada ruralista, do lobby de grandes mineradoras e empreiteiras segue na Câmara e no Senado.
Veja abaixo e entenda quais são as principais ameaças ao meio ambiente, às populações indígenas e tradicionais e porque precisamos seguir acompanhando cada uma delas!
O alerta é publicado por Instituto Socioambiental - Isa, 02-08-2016.
Proposta de Emenda à Constituição 65/2012 > O fim do licenciamento ambiental
A PEC 65/2012 simplesmente acaba com o licenciamento ambiental, o principal instrumento de controle e prevenção de danos socioambientais previsto na lei. Prevê que a mera apresentação dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA-Rima) de um empreendimento implicará sua autorização e que, daí em diante, ele não poderá ser suspenso ou cancelado. Caso aprovado o projeto, não haverá análise aprofundada da viabilidade socioambiental de qualquer obra. Populações e ecossistemas ficarão à mercê da boa vontade dos empresários. A PEC voltou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que deve apreciar parecer contrário do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) em breve. Na sequência, o projeto vai a plenário.
O projeto foi incluído na "Agenda Brasil", conjunta de propostas prioritárias do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). A PEC é de autoria do senador Acir Gurgacz (PDT-RO). Em entrevista, ele reconheceu que a proposta pode beneficiar uma empresa da família. No Supremo Tribunal Federal (STF), Gurgacz é alvo de uma ação, acusado de falsificação de documentos, e um inquérito sobre crimes tributários, além de ações em outras instâncias judiciais (veja). O ISA publicou um editorial sobre o assunto e vem participando da mobilização contra a PEC junto com o Ministério Público Federal (MPF) e outras organizações.
Projeto de Lei do Senado 654/2015 > Licenciamento Ambiental a Jato!
O PLS Pretende enfraquecer o licenciamento ambiental, reduzindo para cerca de oito meses o prazo para o licenciamento de grandes obras consideradas estratégicas pelo governo – um “Licenciamento a Jato”. O projeto interessa grandes empresas, como empreiteiras, várias envolvidas nos recentes escândalos de corrupção. Se for aprovado, aumentam os riscos de desastres, como o de Mariana (MG), e as dificuldades para evitar e atenuar os danos socioambientais de empreendimentos. A proposta não prevê a realização de audiências públicas e elimina uma série de fases do licenciamento (licenças Prévia, de Instalação e de Operação).
Pelo projeto, se um órgão governamental envolvido descumprir os prazos, automaticamente será considerado que ele aprova o licenciamento, num “quem cala consente”. O projeto pode ser votado a qualquer momento no plenário do Senado. Se for aprovado, segue para a Câmara. A proposta é do senador Romero Jucá (PMDB-RR) e relatada pelo senador Blairo Maggi (PR-MT), hoje ministro da Agricultura e um dos maiores produtores de soja do mundo. Jucá é um dos principais adversários dos direitos indígenas, alvo de quatro inquéritos no STF e duas ações na Justiça Federal (leia mais). Ele é mencionado nas operações Lava Jato e Zelotes. Maggi é alvo de um inquérito no STF, acusado de lavagem de dinheiro, e uma ação na Justiça Federal por improbidade administrativa (veja aqui). O ISA elaborou um manifesto, assinado por mais de 130 organizações, e uma nota pedindo discussão mais aprofundada da matéria. Os dois documentos foram fundamentais na mobilização contra o PLS.
Projeto de Lei do Senado 620/2015 > Biodiversidade em perigo!
O PLS pretende autorizar a implantação de parques e áreas de aquicultura em até 0,5% da superfície de lagos de hidrelétricas, açudes e barragens de domínio da União. Sob esse pretexto, fragiliza ou acaba com os dispositivos que visam exercer algum controle sobre as atividades do setor. Por exemplo, permite a atividade pesqueira sem licença, concessão, autorização ou registro expedido pelo órgão competente. A proposta abre caminho para a introdução de espécies não nativas nessas áreas, uma das maiores ameaças à biodiversidade, à pesca e aquicultura com peixes nativos. O projeto pode ser votado a qualquer momento na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Se aprovado em outras comissões da casa, pode seguir direto para a Câmara, sem passar pelo plenário. O projeto é de autoria do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), candidato à prefeitura do Rio e ministro da Pesca no governo Dilma, e atende grandes empresas do setor. O ISA publicou um artigo sobre o tema e encaminhou ao Senado uma nota técnica contra a proposta.
Proposta de Emenda à Constituição 215/2000 > A grande ameaça aos direitos indígenas
É uma das mais graves ameaças aos direitos indígenas garantidos na Constituição e uma das principais bandeiras ruralistas. Pretende transferir do governo federal ao Congresso a última palavra sobre as Terras Indígenas, além de abri-las a empreendimentos de alto impacto socioambiental e prever uma série de dificuldades às demarcações. Caso aprovado o projeto, o reconhecimento de Terras Indígenas deverá ser paralisado de vez. O projeto pode ser votado no plenário da Câmara. Se aprovado, segue ao Senado. O relator na Comissão Especial da Câmara foi o deputado ruralista Osmar Serraglio (PMDB-PR), aliado de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O ISA elaborou um parecer técnico sobre as consequências da possível aprovação da PEC e articulou um manifesto assinado por 48 senadores contra ela. A organização tem apoiado ativamente a Mobilização Nacional Indígena, a principal articulação contra a PEC.
Proposta de Emenda à Constituição nº 76/2011 > Escancarando as portas das Terras Indígenas
Também de autoria do senador Blairo Maggi (PR-MT), a proposta pretende abrir as Terras Indígenas à instalação de hidrelétricas, empreendimentos com alto potencial de destruição do meio ambiente e dos modos de vida das populações tradicionais. Aguarda votação no plenário do Senado. Se aprovada, segue para a Câmara. Junto com líderes indígenas, o ISA denunciou o projeto na Conferência do Clima de Paris (COP-21), em dezembro de 2015, um dos maiores encontros sobre Meio Ambiente da História (leia aqui).
Projetos de Lei 1.216/2015 e 1.218/2015 > Mais demora e dificuldades para as demarcações
Na prática, pretendem dificultar ao máximo as demarcações de Terras Indígenas, por exemplo, instituindo o “marco temporal” para comprovar o direito à terra: se aprovadas, só seriam reconhecidos os territórios que estivessem ocupados pelos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal, 5 de outubro de 1988. Os projetos estão na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e, de lá, seguem para o plenário. Autor do PL 1216, o deputado ruralista Covatti Filho (PP-RS) é financiado por empresas do agronegócio.
Projeto de Lei 1.610/1996 > Mineração em Terra Indígena não!
Mais um projeto de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), objetiva permitir a mineração em Terras Indígenas. A proposta ameaça povos indígenas e o meio ambiente, uma vez que a mineração é uma atividade com alto grau de impacto socioambiental. As comunidades indígenas não foram consultadas sobre a proposta, contrariando a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. O relator na Comissão Especial que analisa o projeto, deputado Édio Lopes (PMDB-RR), é réu em ação por peculato no STF, recebeu doações de campanha da mineradora Vale e de empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato. Há vários anos, o ISA monitora a tramitação do PL e os pedidos de pesquisa e lavra sobrepostos às Terras Indígenas na Amazônia para chamar a atenção para essa ameaça.
Novo Código de Mineração (PL 37/2011) > Mineração: a quem interessa?
Pretende simplificar os procedimentos necessários para a execução de atividades minerárias, que têm, em geral, grandes impactos socioambientais. Traz poucas salvaguardas ambientais, sociais e trabalhistas para as populações e áreas afetadas. A proposição é de interesse das grandes mineradoras, pois enfraquece o poder do Estado de regular o acesso do setor privado aos recursos minerais. O atual relator do projeto, deputado Laudívio Carvalho (SD-MG), está finalizando uma nova proposta, mas ainda não se sabe qual texto final será votado, em que instância (se numa comissão ou no plenário) nem quando. A mineradora Vale está entre as doadoras de campanha do deputado. Carvalho foi relator do projeto defendido pela indústria armamentista que pretende liberar o porte de armas. O ISA foi um dos autores da denúncia inédita apresentada no Conselho de Ética da Câmara e no STF contra o antigo relator do projeto, deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), sob a acusação de que ele vinha defendendo os interesses de seus financiadores de campanha. O ISA também participa do Comitê em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, articulação de movimentos sociais e organizações da sociedade civil que se opõe ao projeto.
O projeto acaba com a obrigatoriedade do símbolo “T” nas embalagens, que avisa quando um produto é transgênico. A proposta foi aprovada na Câmara e depois rejeitada na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, após divulgação de parecer e manifestação contrária do ISA e de organizações parceiras em audiência pública. A proposta tramita hoje na Comissão de Agricultura do Senado e, depois dela, segue para as comissões de Assuntos Sociais e de Meio Ambiente.
O autor do PL, deputado Luís Carlos Heinze (PP-RS), é um dos parlamentares ruralistas mais radicais e um dos principais articuladores de projetos anti-indígenas e antiambientais na Câmara. Em 2013, em discurso em Vicente Dutra (RS), disse que “quilombolas, índios, gays, lésbicas” são “tudo que não presta”. Ele é alvo de um dos inquéritos da Operação Lava Jato no STF. Tem entre seus financiadores de campanha grandes empresas do agronegócio e a empreiteira Queiroz Galvão, também envolvida na Lava Jato (saiba mais).
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Congresso volta à ativa; e as ameaças aos direitos socioambientais continuam - Instituto Humanitas Unisinos - IHU