26 Outubro 2015
Padre, pensando no sínodo do ano passado - isto é, depois de dois Sínodos sobre a Família - há uma Igreja diferente?
Há uma Igreja mais aberta. Não sei se mais ou menos diferente, mas mais aberta. Uma Igreja que ao menos pode escutar o que Francisco diz. Acho que no início não o escutava porque era tão diferente...
Adolfo Nicolás, Superior Geral da Companhia de Jesus, 29º sucessor de Santo Inácio de Loyola, participou da comissão nomeada pelo Papa para escrever o relatório final do Sínodo. Tem o ar cansado, mas sorri. "Também o Papa estava contente. Os resultados foram bons. Ensinei teologia, no Japão, e sei o que é preciso repetir muito as coisas para que sejam ouvidas. Francisco sabe disso. E agora acredito que do Sínodo saia uma Igreja com os ouvidos mais aguçados, e isto é bom, porque poderá se traduzir em medidas concretas nas paróquias e será uma ajuda para a comunidade cristã".
A entrevista é de Gian Guido Vecchi, publicada por Corriere della Sera, 26-10-2015. A tradução é de IHU On-Line.
Eis a entrevista.
No ínicio do Sínodo o senhor dizia: Francisco poderia andar mais rápido, mas não quer fazer isto sozinho e a Igreja precisa de tempo. E agora?
O fato de que a relatório final tenha sido aprovado, que todos os pontos tenham superado os dois terços,é importante. É um documento que deixa as mãos livres para Francisco agir. O Papa pode fazer o que considera bom, oportuno e necessário. Na mente de todos os membros da comissão, havia a ideia de preparar um documento que deixasse as portas abertas de tal modo que o Papa pudesse entrar e sair, ou seja, fazer o que achar melhor.
O cardeal Schönborn dizia: a palavra chave do documento é 'discernimento'...
Acho que é o efeito deste Papa. O discernimento é capital na mente de Santo Inácio e Francisco é muito inaciano. A palavra 'discernimento' apareceu muitas vezes, na apresentação, nos grupos e também no texto final...
Que coisa quer dizer "discernimento" nas 'situações irregulares'como os divorciados e recasados excluídos dos sacramentos?
A recomendação do Papa é de não fazer teorias, por exemplo, não colocar os divorciados e recasados todos juntos, porque os padres deverão fazer um discernimento caso a caso e ver a situação, as circunstâncias, aquilo que acontece, e a partir disto tudo decidir uma coisa ou outra. Não há teorias gerais que se traduzem numa disciplina férrea imposta a todos. O fruto do discernimento quer dizer que se leva em conta cada caso e se busca encontrar saídas de misericórdia.
Agora a palavra passa para Francisco, não é assim?
Sim. Haverá uma exortação apostólica do Papa. Não creio que tardará, depois de um ano, como aconteceu em outros Sínodos e com outros Papas. Um ano é demasiado tempo. Os entendidos em management me dizem que se passam oito meses sem dizer nada, as pessoas voltam ao ponto de partida e então é preciso refazer todo o processo. Acho que Francisco será mais rápido.
O que lhe parece que acontecerá?
Penso que uma coisa sempre frágil, na Igreja, é o 'follow up'. O fruto do Sínodo não pode ser um documento, ainda que seja muito bom. O fruto é prático: o que se faz, o que acontece na situação pastoral, nas paróquias, quando as pessoas vão até lá com suas problemáticas. É lá que se vê. Para mim o 'follow up' ideal consistiria em Sínodos particulares: cada um dos bispos volta para casa e faz um Sínodo com os seus diocesanos, padres e leigos, para avaliar o modo até agora seguido e examinar outras possibilidades.
Qual foi a mudança mais importante acontecida no Sínodo?
Francisco não quer uma aplicação mecânica da lei, a defesa da letra e não do espírito. Este não é o modo de agir da Igreja. Ele mesmo nos falou dos corações fechados que se escondem atrás do ensino da Igreja e se sentam na cadeira de Moisés para julgar os feridos. Ao contrário, é preciso buscar, com compaixão e misericórdia, encontrar novos caminhos para ajudar as pessoas. Um discernimento da situação concreta que veja antes de tudo as pessoas, e depois os princípios. Este é o mais forte encorajamento aos padres, para que não sejam funcionários: não, não são funcionários. Eles têm um trabalho de discernimento a fazer. Santo Inácio ficaria muito contente em ver que o discernimento entrou na Igreja. E também o Papa Francisco está muito contente.
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"Agora o Papa tem as mãos livres. Ele escreverá logo o seu documento". Entrevista com Adolfo Nicolás - Instituto Humanitas Unisinos - IHU