23 Julho 2025
Órgão da ONU abre investigação sobre tentativa de mineradora canadense e dos EUA para burlar regras globais para exploração no fundo do mar.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 23-07-2025.
A Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA, na sigla em Inglês) divulgou na última 2ª feira (21/7) a abertura de apuração formal sobre a conduta de empresas envolvidas na mineração em águas profundas, entre elas a canadense The Metals Company. A decisão foi vista como um recado às iniciativas lideradas pelos EUA para burlar normas da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar e infringir o Direito Internacional.
Em abril, Trump ordenou que seu governo acelerasse a concessão de licenças para mineração submarina fora das águas territoriais dos EUA. O país não é signatário da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar (UNCLOS), que criou a ISA. Pouco depois, a TMC entrou com o primeiro pedido de licença comercial para explorar nódulos polimetálicos em águas internacionais — estruturas ricas em cobalto, níquel, cobre e manganês.
A ISA, sediada em Kingston, na Jamaica, é a única autoridade reconhecida globalmente para gerir os recursos minerais em águas internacionais. Seu Conselho, composto por 36 países, aprovou uma decisão que pede à sua Comissão Jurídica e Técnica atenção especial a possíveis violações contratuais por parte das empresas detentoras de contratos de exploração – e que formule recomendações na próxima sessão, em 2026. A TMC, embora não mencionada diretamente, é alvo evidente da resolução.
Até então, a empresa planejava submeter o pedido à ISA via sua subsidiária Nauru Ocean Resources Inc. (NORI), patrocinada pelo pequeno estado insular de Nauru. A NORI tem contrato de exploração vigente até 2026, mas busca agora um atalho, amparada no governo Trump. Caso o contrato com a ISA não seja renovado, a situação poderá gerar disputas legais e regulatórias, já que a Unclos define os fundos marinhos em alto-mar como patrimônio comum da Humanidade — o que proíbe sua apropriação unilateral.
Há pouco mais de um mês, a pesquisadora brasileira Letícia Carvalho, atual secretária-geral da ISA, já havia reagido a essa tentativa de avanço unilateral em artigo publicado pela Economist. Ela alertou que “acelerar o desenvolvimento fora da supervisão da ISA traz riscos sérios não apenas para o meio ambiente, mas também para atividades como o comércio e a navegação”. E completou: “O risco para os investidores é igualmente alto. Produtos oriundos de empreendimentos que violem o direito internacional virão acompanhados de riscos legais e reputacionais.”
Segundo o NY Times, a pressão já afeta os negócios da TMC: uma empresa japonesa parceira declarou estar reavaliando a relação com a mineradora canadense, e o parlamento dos Países Baixos pediu que seu governo tome medidas legais contra a TMC e os EUA após uma entrevista com o CEO Pieter Heerema ter repercutido mal. Delegados da ISA também discutiram se a empresa deveria perder suas permissões de exploração para pesquisa.
Organizações ambientalistas como a Deep Sea Conservation Coalition (DSCC) defendem uma moratória global até que haja garantias de segurança para esse tipo de atividade. A proposta já conta com o apoio formal de 37 países, incluindo o Brasil.
A movimentação da ISA também ganhou repercussão em veículos internacionais como Bloomberg, Canberra Times, Público, Oceanographic e AFP, reproduzida no Brasil pelo UOL, entre outros.