Plurais, alianças ecumênicas podem contribuir para a efetivação dos direitos LGBTQIA+

(Foto: Margaux Bellott | Unsplash)

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01 Julho 2023

"'A nossa comunhão [de pessoas cristãs pela diversidade sexual e de gênero] poderá um dia afetar a comunhão maior [igrejas convencionais]', afirmou um ativista cristão gay, em um evento ecumênico para defender o fortalecimento de alianças religiosas pelos direitos LGBTQIA+", escrevem Jeferson Batista, jornalista, mestre em Antropologia Social e doutorando na mesma área, e Luis Rabello, geógrafo, estudante de Teologia e coordenador da Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT, em artigo enviado ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Eis o artigo.

Em junho de 2023, a Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo foi palco de diversos encontros, entre eles de pessoas muçulmanas e judias, que não eram as únicas pessoas religiosas na maior parada do Orgulho do mundo. Católicos, evangélicos, umbandistas e outras pessoas ligadas a comunidades de fé também se encontraram no Bloco Gente de Fé, que, pela terceira vez, marcou presença no evento LGBTQIA+.

O bloco nasceu a partir de uma experiência do ecumenismo e do diálogo inter-religioso como chave de análise e construção de reflexões coletivas no 1º Congresso Igrejas e Comunidade LGBTI+, em que, no mês de junho de 2019, fiéis, pessoas clérigas de diversas denominações e tradições e ativistas pelos direitos das pessoas dissidentes de sexo e gênero puderam se reunir ao redor da mesa para partilhar suas perspectivas e experiências avançando no debate em pautas muitas vezes consideradas tabus no ambiente religioso. O encontro se deu na Catedral Anglicana da Santíssima Trindade, na capital paulista. Koinonia Presença Ecumênica e Serviço é uma das organizações responsáveis pela organização do bloco.

Especialmente no campo cristão, a presença de pessoas e organizações religiosas na Parada do Orgulho paulistana, bem como de outras localidades, vem se consolidando ao longo do tempo e nos ajuda a “sair da zona de conforto que liga homofobia e cristianismo”, e, portanto, “descongela imagens do religioso”, compreendendo alguns dos movimentos que transcorrem em contexto, como afirma o antropólogo Marcelo Natividade.

Esse tema também foi foco de estudo do antropólogo Aramis Silva, que analisou a participação da Igreja da Comunidade Metropolitana (ICM) na parada LGBT+ de São Paulo e demonstrou que a presença de tal instituição religiosa no evento funcionava como uma “contraprova pública e sociológica em favor do argumento da possibilidade de conciliação entre religião e homossexualidades”.

A Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT, organização fundada em 2014 e que agrega coletivos de cristãos leigos e leigas LGBTQIA+, famílias e pessoas aliadas, também tem apostado no ecumenismo e no diálogo inter-religioso baseado na diversidade sexual e de gênero como uma estratégia de atuação pastoral e política pela cidadania religiosa plena. Como demonstramos em texto anterior, pessoas ligadas à Rede promoveram ou participaram, nos últimos anos, de atividades com pessoas de outras religiões, inclusive na Parada do Orgulho.

Torna-se importante entender como tais alianças podem ir além da incidência pública provocada pelos eventos e manifestações. É preciso trilhar o caminho para a construção de pontes capazes de conquistar os corações e as mentes daquelas pessoas que são resistentes não só a efetivação dos direitos LGBTQIA+, mas a toda forma de diálogo e respeito com as diversidades.

O desafio é gigantesco. É fato que as pessoas dissidentes de sexo e de gênero são focos de fake news e pânicos morais que as desumanizam e deslegitimam seus afetos e, em matéria de cristianismo, as demonizam. Não é raro ver pastores, padres e famílias cristãs promovendo violências das mais diversas formas contra jovens LGBTQIA+ em nome de Deus e contra a falaciosa “ideologia de gênero”.

Nesse sentido, ao oferecer histórias de vida, incluindo de pais e mães que respeitam filhos e filhas LGBTQIA+, o recém-lançado livro “Semente de Vida: rejeição e aceitação de filhos/as/es LGBTI+ em lares cristãos” é exemplo de um projeto agregador de atores de diferentes orientações cristãs capaz de promover a narrativa de que pessoas LGBTIQA+ são amadas por Deus e dignas de se aproximarem do sagrado, não apenas como pecadoras, mas como dádivas para as famílias e comunidades de fé. Outra estratégia é fortalecer grupos de mães e pais de pessoas dissidentes da norma sexual e de gênero. O trabalho do MAMI (Mães de Amor Incondicional), liderado por Silvia Kreuz é um exemplo. Recentemente, ela lançou o livro "Um Café na Fronteira: a missão de mães cristãs no acolhimento de filhos LGBTQIA+".

“A nossa comunhão [de pessoas cristãs pela diversidade sexual e de gênero] poderá um dia afetar a comunhão maior [igrejas convencionais]”, afirmou um ativista cristão gay, em um evento ecumênico para defender o fortalecimento de alianças religiosas pelos direitos LGBTQIA+. Ainda que pontuais e marcadas por fissuras e diferenças, o campo demonstra que essas alianças são potentes e cumprem o papel de romper com narrativas hegemonizantes sobre o religioso.

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