26 Novembro 2021
"Uma das situações que me levam a pensar na triste realidade que vivemos é que muitos de nós perdemos o encanto, e alegria e ofuscamos a beleza do nosso ministério", escreve Pe. José Rafael Solano Durán, da PhD Teologia Moral e pertence ao Clero da Arquidiocese de Londrina - PR, em artigo publicado por Vatican News, 25-11-2021.
O clero do pré-Trento e o clero do século XXI.
Ernest Rennan um dos maiores historiadores franceses tinha muita razão quando afirmava: “O homem encontra santidade naquilo que crê e beleza naquilo que ama.”
Muito tem se refletido ultimamente sobre o suicídio no clero do Brasil. Vale a pena afirmar que não só no clero Brasileiro há suicidas. O suicídio é uma das realidades, mas atenuantes da sociedade contemporânea. Seja como for quero me limitar única e exclusivamente ao meio ao qual pertenço. Sou e faço parte do clero. Uma das situações que me levam a pensar na triste realidade que vivemos é que muitos de nós perdemos o encanto, e alegria e ofuscamos a beleza do nosso ministério. Aqui já há um problema de base. Como recuperar aquele primeiro amor do qual o apóstolo Paulo já nos convidava constantemente a resgatar e manter. Presbíteros, diáconos e bispos desencantados. Homens que já não se sentem mais atraídos por nada é muito menos por ninguém. Neste caso por Cristo. Para muitos fazer parte do clero é muito mais do que um problema um dilema. Homens capazes de pensar e refletir, mas incapazes de decidir! Quem não sabe decidir perde o horizonte do fundamental e chega a um ponto no qual situações inesperadas o absorvem se tornando simplesmente alguém que vive segundo as decisões dos outros. Muitos presbíteros, diáconos e bispos carecem do senso moral da objeção de consciência. Fazem opções contra a sua própria dignidade e capacidade. Para muitos ficar “bem na foto” significa só se adaptarem as ideologias do momento. Há quem use batina porque um padre ou bispo “pop” numa frase do seu Instagram afirme que a batina não é fantasia. Há quem use calça jeans e camiseta justa porque é chamado de padre moderno e bonito, há quem faça regímen porque precisa reafirmar sua figura e há quem tem pânico de envelhecer e inventa todos os tratamentos possíveis para fazer parte do mundo dos cosméticos e das propagandas de beleza. Isso sem contar quando como eu; deixamo-nos levar pela moda litúrgica.
Exageradamente o Brasil se transformou numa plataforma comercial das empresas litúrgicas e do comércio de belos paramentos e objetos.
Um clero insatisfeito quase que desde o dia da ordenação. “A minha ordenação deve ser diferente a todas aquelas que já assisti”; e então aquele homem prostrado no chão vira motivo de curtidas e aplausos. Meses depois o neopresbítero deve fazer vestibular e ingressar na faculdade mais próxima porque os dez anos de estudo no processo formativo não foram suficientes para que a sua inteligência se desenvolvesse o suficiente. Um clero que muitas vezes não quer aceitar a necessidade de se aproximar das realidades do mundo para influenciar e questionar, mas um clero que se torna escravo e dependente do mundo para viajar e gastar.
Muitos criticam a nossa sexualidade. Há quem afirme que somos uma imensa maioria de homens anormais. Já o disseram para mim inúmeras vezes. Penso que a maior doença sexual e afetiva que temos no clero é que nós membros do mesmo clero não acreditamos no dom sobrenatural da amizade. A castidade cristã nos ajudaria a sermos amigos entre nós! “Sacerdos lupi sacerdotum”. Somos lobos nos devorando uns aos outros. Ter amigos sacerdotes é a maior dádiva para os nossos leigos; mas entre nós não é assim. Vivemos sobre a suspeita, não podemos viajar juntos, sair juntos, caminhar juntos e pedimos para rezar juntos! Que anacronismo. Precisamos romper as barreiras dos medos e dos preconceitos e acreditar na castidade. Sem ela não superaremos nosso egoísmo e carreirismo desenfreado.
Os sacerdotes do século XXI temos muitos mais problemas dos que já tinham os sacerdotes antes do concílio de Trento. Antes de Trento faltava formação acadêmica, algo de disciplina e maior entrosamento com o mundo. Mas antes de Trento os membros do clero eram homens unidos ao seu bispo e aos seus irmãos. Pode ser questionado a situação do alto e do baixo clero vivido antes de Trento; mas o mesmo Carlos Borromeu e posteriormente Jean J. Olier, Jean Eudes, Vincet de Paul nos séculos sucessivos fortaleceram a formação e deram grandes luzes para à internet ajuda do clero. Não serão as confraternizações de natal e de aniversário aquelas que nos tornarão mais irmãos; não serão os retiros anuais ou as reuniões mensais aquelas que nos ajudarão a sermos e permanecermos mais unidos a igreja particular ou ao carisma dos fundadores. Só um encontro constante com aquele que nos chamou e nos fez membros do seu corpo nos tornará verdadeiros irmãos. Aproximemo-nos uns dos outros em Cristo; só assim não teremos mais suicídios quer em vida ou em fato… nove foram os suicídios do clero no nosso Brasil, mas penso que há mais de nove vivos que já se suicidaram.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O suicídio no clero do Brasil - Instituto Humanitas Unisinos - IHU