08 Setembro 2021
"O senhor [Marco Feliciano] é tão 'humilde' seguidor do Evangelho, contraditório, hipócrita, que o seu então partido, o Podemos, o percebeu. E lhe deu um bilhete azul!! O senhor é um dos condutores que usam a religiosidade do povo para enganá-lo. É um lobo em pele de cordeiro!", escreve Edelberto Behs, jornalista.
O pastor e deputado federal Marco Feliciano (aquele que mandou arrumar os dentes e enviou a conta de 157 mil reais à Câmara dos Deputados, em valores de 2019, fato que contribuiu para sua expulsão das fileiras do Podemos) convocou a grei evangélica, de quem recebeu, como disse, uma procuração em branco, a se juntar às manifestações conclamadas pelo presidente Jair Bolsonaro para o dia 7 de setembro.
“Ela será um marco histórico, de união patriótica entre todos os brasileiros. Podemos considerá-la uma ‘peregrinação sagrada’”, para livrar a pátria “do comunismo materialista”. Em artigo publicado no portal Pleno News, Feliciano assinalou que no dia 7 “o povo estará nas ruas, unido em torno de um ideal cívico, em apoio à Constituição e à democracia e contra tentativas de comunistas de tomarem o poder por meio das urnas (mesmo que, para isso, tenham que de jogar com cartas marcadas e golpes baixos).”
Feliciano deveria responder algumas questões antes de incitar o povo evangélico contra “comunistas”. Quem são e onde estão esses comunistas que querem destruir a nação? Trata-se de um velho argumento, que é requentado pela ultradireita e que vem sendo usado desde o tempo do Império. Anti-abolicionistas argumentavam que a libertação dos escravos significava um perigo comunista para o Brasil!
Ou o senhor está se referindo aos “malditos” cristãos da comunidade primitiva que, segundo o livro de Ato dos Apóstolos (2, 44-45) – “Todos os que criam estavam juntos e unidos e repartiam uns com os outros o que tinham. Vendiam as suas propriedades e outras coisas e dividiam o dinheiro com todos, de acordo com a necessidade de cada um”?
Depois, Marco Feliciano, que falácia é essa de ver nessas manifestações a “união patriótica entre todos os brasileiros”? O senhor não enxerga a polarização política que se instalou no país incentivada pelo presidente da República que o senhor apoia? Recorrer ao “ideal cívico” que une “todos” os brasileiros é uma mentira que o senhor divulga. Qual ideal cívico? De entregar os bens da nação a interesses estrangeiros?
Ora, sou protestante e não lhe dei procuração em branco para defender entreguistas e exploradores de rachadinhas! O Movimento Batista por Princípio chegou a emitir um “desconvite” à convocação dirigida a igrejas evangélicas, para que seu povo não comparecesse às manifestações. E o senhor se diz porta-voz de evangélicos?
“Quando a nossa voz se faz ouvir, não é pretensiosa a ponto de querer falar pela totalidade. Do nosso jeito de ser não conseguimos atender nem contemplar todas as questões que hoje palpitam e necessitam da presença da Igreja”, diz pronunciamento da Pastoral Popular Luterana (PPL) para o dia que marca as comemorações da independência do Brasil.
O Movimento Batista “estranha que pastores, embora ensinem em suas igrejas uma eclesiologia democrático-congregacional, expressam sua solidariedade a uma manifestação de claro apoio a iniciativas autoritárias e pouco democráticas do atual Presidente da República”. Também manifestou perplexidade com o caráter contraditório da manifestação que, em nome da defesa da liberdade, “faz apologia institucional do fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal”.
Apoio à Constituição? Ora, quem é que ataca, seguidamente, magistrados do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal Eleitoral? Lembra de quem ameaçou mandar um jipe e um cabo para fechar a Corte maior do país?
Não é justamente o presidente e seus seguidores que estão no topo dessa lista? O senhor se reporta ao jogo de cartas marcadas, certamente lembrando como o parcial juiz Sérgio Moro atuou para dar a vitória nas urnas a Bolsonaro e ganhar como recompensa um ministério?
O pastor alertou, no artigo, que “se não reagiremos com retidão e não nos manifestarmos pacificamente nesse evento, nossas tradições judaico-cristãs estarão em perigo”. Qual o perigo, deputado? De questionar as mentiras do presidente que o senhor apoia? Como cristão, como o senhor, e ainda por cima pastor, é condescendente com mentiras e enganações?
Feliciano encerra o seu artigo agradecendo a Deus “por essa conscientização coletiva verde amarela de um povo lindo, ordeiro e pacífico”. Então, senhor deputado, qual a razão do seu presidente querer armar uma população que é ordeira e pacífica? Como o senhor, na qualidade de pastor, justifica o recurso às armas, a tal ponto que o presidente recomenda a população a comer menos feijão para comprar uma pistola? Como o senhor, defensor da vida, justifica o negacionismo que já provocou a morte de mais de 580 mil brasileiros e brasileiras?
O senhor é tão “humilde” seguidor do Evangelho, contraditório, hipócrita, que o seu então partido, o Podemos, o percebeu. E lhe deu um bilhete azul!! O senhor é um dos condutores que usam a religiosidade do povo para enganá-lo. É um lobo em pele de cordeiro!
Como ensina a parábola do empregado infiel (Lucas 12,45): “Será pedido muito de quem recebe muito; e daquele a quem muito é dado, muito será pedido”. O senhor, com essa boca rica, certamente estará na fila dos quais muito será pedido!
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Não lhe passamos qualquer procuração, deputado! - Instituto Humanitas Unisinos - IHU