21 Junho 2021
Apesar da insistência de que o documento não é político, o nome de Biden foi mencionado várias vezes.
A reportagem é de Christopher White, publicada em National Catholic Reporter, 17-06-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Os aliados mais próximos do Papa Francisco nos Estados Unidos fizeram um apelo de última hora e às vezes desesperado a seus colegas bispos dos Estados Unidos para que não seguissem em frente com os planos de redigir um documento divisivo sobre a Comunhão e os políticos católicos pro-choice antes da aguardada votação dos bispos no dia 17 de junho.
“A proposta que temos diante de nós nos apresenta uma escolha dura e histórica”, disse o cardeal Joseph Tobin, de Newark, Nova Jersey. “Votar afirmativamente produzirá um documento, e não unidade. Votar contra ele nos permitirá trabalhar juntos no diálogo para forjar um amplo acordo sobre as sérias questões embutidas na questão da dignidade eucarística.”
“A nossa própria identidade como Conferência Episcopal nos convoca a votar não, e eu votarei não”, disse Tobin, que é um dos dois únicos estadunidenses na Congregação para os Bispos do Vaticano, que tem a tarefa de aconselhar o papa sobre quais padres católicos devem ser nomeados bispos em todo o mundo.
Tobin disse que qualquer esforço para apoiar a “exclusão categórica de líderes políticos católicos da Eucaristia com base em suas posições políticas públicas” empurraria a Conferência Episcopal para “o próprio coração da tóxica luta partidária que tem distorcido a nossa própria cultura política”.
Os bispos votaram se deveriam dar luz verde ao documento durante o segundo dia de reunião online; os resultados deverão ser anunciados na sexta-feira, 18 de junho [no fim, a proposta do documento foi aprovada com quase 75% dos votos, 168 a 55, com seis abstenções].
Se os planos para o documento forem aprovados [como o foram], o documento final exigirá uma maioria de dois terços da Conferência para aprová-lo na sua reunião de novembro. Um teste de votação na quarta-feira, 16, revelou uma Conferência dividida, um possível indicador de que, com a composição atual da Conferência Episcopal, os bispos poderiam custar a aprovar o documento final, a menos que alguns dos elementos mais controversos da proposta sejam eliminados ou modificados.
O cardeal Wilton Gregory, de Washington, o mais recente estadunidense a ser elevado ao Colégio de Cardeais da Igreja por Francisco em novembro passado, também defendeu um adiamento.
“A escolha diante de nós neste momento é seguir um caminho de fortalecimento da unidade entre nós mesmos ou nos contentarmos em criar um documento que não trará a unidade, mas pode muito bem prejudicá-la ainda mais”, disse ele.
“A força da nossa voz no avanço da missão de Cristo foi seriamente enfraquecida”, lamentou.
O bispo Robert McElroy, de San Diego, disse: “A proposta apresentada a nós hoje lança as bases para uma mudança fundamental na concepção de como os bispos devem apresentar a nossa fé no debate público”.
“A mudança tornaria a negação da Eucaristia um elemento significativo do nosso ofício magisterial na sociedade contemporânea”, advertiu.
Mais de 40 bispos falaram ao longo de um debate online de mais de duas horas, oferecendo mais um vislumbre de uma hierarquia estadunidense profundamente dividida.
O bispo Kevin Rhoades, presidente da Comissão de Doutrina da Conferência, fez um grande esforço para insistir que a proposta do documento não era política, e que a sua intenção não era enfocar políticos católicos pro-choice.
No entanto, essas afirmações pareceram ser repetidamente contrariadas durante o debate, já que alguns dos defensores mais veementes do documento citaram especificamente o presidente católico, Joe Biden, e a porta-voz católica da Câmara, Nancy Pelosi, para afirmarem que acreditavam que era essencial que a Conferência avançasse sem demora em seus planos sobre o documento.
“Não foram os bispos que nos trouxeram a este ponto. Foram, na realidade, a meu ver, algumas das nossas autoridades públicas”, disse o arcebispo Joseph Naumann, de Kansas City, que preside a Comissão Pró-Vida dos bispos.
“O nosso presidente fala sobre isso [aborto] como um direito”, disse ele, acrescentando: “É um presidente católico que está fazendo isso”.
O bispo Liam Cary, de Baker, Oregon, também acrescentou o seu apoio ao documento sobre a Comunhão, porque “nunca tivemos uma situação como esta, em que o Executivo é comandado por um presidente católico que se opõe ao ensino da Igreja”.
Apesar dos repetidos apelos ao diálogo durante o dia de abertura da reunião por parte do representante do papa nos Estados Unidos, o arcebispo Christophe Pierre, o bispo Thomas Daly, de Spokane, Washington, disse aos bispos que se perguntava se “o diálogo é uma desculpa para o adiamento”.
“Sou um pouco cínico quanto à preocupação com o tempo”, rebateu o bispo Robert Coerver, de Lubbock, Texas. “Parece haver pressa em relação a isso.” Ele acrescentou que temia que as preocupações sobre os anos eleitorais de 2022 e 2024 pudessem estar nas mentes de alguns bispos.
O cardeal Blase Cupich, de Chicago, membro também da Congregação para os Bispos do Vaticano, se pronunciou contra a proposta, dizendo que vários presidentes de comissões da Conferência Episcopal deixaram claro que suas motivações para o documento envolviam o fato de colocar os políticos católicos na mira.
“Aqueles que insistem que precisamos fazer isso imediatamente revelam do que se trata”, disse ele. “Eles querem que façamos declarações para fazer algo com os políticos que ocupam posições que são contrárias ao nosso magistério. E não vamos cair nessa armadilha.”
Em uma coletiva de imprensa após o debate, Rhoades disse que não comentaria se Biden deveria ser autorizado a receber a Comunhão e disse que tais julgamentos não são o propósito do documento.
“Examinaremos toda a questão da coerência eucarística e da lei da Igreja, isto é, o papel do próprio bispo”, disse Rhoades.
Gregory, de Washington, que é o bispo local de Biden, deixou claro que não negaria a Comunhão a Biden. Durante a discussão, Gregory apresentou um dos argumentos mais contundentes contra a proposta do documento, dizendo que, em quase 38 anos como membro da Conferência Episcopal, ele não havia experimentado um momento em que a Conferência enfrentasse tal desafio à sua unidade.
Rhoades também rejeitou a ideia de que propor o documento deixaria a Conferência fora de sintonia com Francisco.
“Vocês sabem que eu amo o Papa Francisco. Eu não acho que o que estamos fazendo é incoerente com os ensinamentos do Papa Francisco. Na realidade, ei gostaria de incluir alguns de seus ensinamentos no documento”, disse Rhoades.
Ele acrescentou que a Eucaristia é o que obriga os católicos a defenderem os nascituros, os migrantes, os doentes e os moribundos.
“Há uma íntima conexão entre a Eucaristia e a nossa missão de amar, e eu acho que é disso que o Papa Francisco sempre fala.”
Ao longo do debate, vários bispos disseram que talvez os prelados pudessem primeiro realizar reuniões regionais ou provinciais para discutir a proposta antes de seguirem em frente. Outros recomendaram, sem sucesso, a eliminação da parte final do documento proposto, que deverá abordar questões sobre a coerência eucarística e os políticos católicos.
Em particular, o arcebispo John Wester, de Santa Fe, Novo México, propôs um documento diferente, que ele sugeriu que fosse intitulado “Bem-vindos de volta à casa”.
Disse que “poderia ser um convite a redescobrir aquilo que nos une, nos dá forças e nos envia a proclamar a Boa Nova, a defender a vida e a dignidade humanas e a servir aos ‘últimos’”.
“Seria um convite a voltar à Eucaristia e à missão que compartilhamos como discípulos de Cristo”, disse ele. “Seria um lembrete positivo, afirmativo e desafiador de que somos uma única família de fé, unida pela Eucaristia e pelo Evangelho de Jesus Cristo.”
No fim, Rhoades disse que não queria retirar o plano atual da comissão, mas esperava que o documento, caso os bispos votassem para seguir em frente com ele, fosse “positivo”.
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EUA: antes de votação de documento sobre Comunhão, aliados do Papa Francisco tentam pedir adiamento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU