13 Julho 2019
Nos países ortodoxos, as Igrejas são herdeiras de uma história em que a religião se confunde com o sentimento nacional. Explicações.
A reportagem é de Henrik Lindell, publicada por La Vie, 11-07-2019. A tradução é de André Langer.
“A nação nos países ortodoxos é a religião! Ao passo que nos países católicos ou protestantes, a nação é o Estado”. Jean-François Colosimo, escritor ortodoxo e diretor-geral das Éditions du Cerf, resume assim, em tom de brincadeira, uma diferença fundamental entre a Europa Oriental Ortodoxa e o Ocidente de tradição latina ou protestante. Vistas do Ocidente, as Igrejas Ortodoxas nacionais e autocéfalas (independentes) dão a impressão de se identificarem com uma causa nacional, como se elas representassem implicitamente o povo. Na realidade, na ortodoxia existe a consciência dos riscos dessa confusão, chamada de filetismo, várias vezes condenada como heresia.
Isso não impede que os líderes políticos da Rússia à Romênia, passando pela Sérvia e a Bulgária, promovam a Igreja Ortodoxa como fator de unidade nacional. Vladimir Putin, em particular, acostumou seus contemporâneos a um uso ostensivo de discursos e sinais religiosos, apresentando a Igreja Ortodoxa Russa como uma educadora do povo. Mesmo um líder político ateu oriundo da esquerda radical, como o primeiro-ministro grego Aléxis Tsipras (que acabou de perder as eleições), não é uma exceção. Ele defende a separação entre Igreja e Estado – um projeto inacabado – e fez apenas um juramento civil em 2015 e se recusou a fazer o juramento religioso, que é uma tradição do país. Mas no dia seguinte, estava ansioso para visitar Jerônimo II, o arcebispo ortodoxo de Atenas, para apresentar seu governo. Um tempo depois, como todos os dirigentes gregos, fez a peregrinação ao Monte Athos, onde também cruzou com Vladimir Putin... “Tsipras é um ‘ortodoxo ateu’. Ele sabe que não tem nada a ganhar ao se opor de frente à Igreja grega que continua popular”, disse Jean-François Colosimo.
Para compreender este fenômeno próprio da ortodoxia, precisamos fazer um recuo na história. Desde o cisma de 1054 e a separação entre as Igrejas do Oriente e do Ocidente, a Ortodoxia desenvolve o uso de línguas vernáculas na liturgia, ao contrário da Igreja Latina, enquanto se afasta do papado de Roma, visto como arrogante. Muito rapidamente, essas Igrejas Ortodoxas tornam-se vetores de sentimentos nacionais. Esta identificação torna-se ainda mais forte a partir de 1453, data da tomada de Constantinopla pelos turcos.
Durante muitos séculos, todos os países balcânicos estão sujeitos ao Império Otomano e ao sistema dos millets, que obriga os cristãos a pagar um imposto. O sultão nomeia os hierarcas das Igrejas Ortodoxas, consideradas legítimas representantes das nações. As Igrejas Ortodoxas tornam-se uma importante referência de identidade para seus fiéis. Ao mesmo tempo, no Ocidente, desenvolve-se o Estado moderno, que cultiva, às vezes, o nacionalismo, ao mesmo tempo que opera uma desconexão progressiva em relação aos religiosos e à Igreja (católica ou protestante).
“Nos Bálcãs, nada disso acontece. Mesmo após a independência desses países, o Estado continua fraco, e a população continua a se dirigir à Igreja, que segue poderosa. Pode-se até dizer que ‘o populismo cristão’ para essas pessoas é desnecessário”, estima Jean-François Colosimo. E acrescenta: “Na ortodoxia, muitas vezes é a Igreja que faz as revoluções nacionais. E as revoluções criam Igrejas”. Assim, os nacionalistas ucranianos defendem a recente Igreja Ortodoxa do Patriarcado de Kiev, fundada em 1992, que se recusou a permanecer sob a jurisprudência da Igreja Ortodoxa Russa, para o desgosto desta e de Putin...
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Ortodoxia e nacionalismo, um casamento infernal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU