19 Março 2019
O capitalismo está “sob uma séria ameaça” porque “deixou de prover as massas”. E “quando isso acontece, as massas se rebelam contra o capitalismo”, adverte o ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, Raghuram Rajan.
A reportagem é publicada por BBC Mundo, 17-03-2019. A tradução é do Cepat.
Em 2005, Raghuram Rajan também havia advertido que os complexos produtos financeiros tinham criado o que considerou uma “maior probabilidade de um colapso catastrófico”.
Suas preocupações foram desestimuladas pela elite financeira. No entanto, dois anos depois, a crise econômica global lhe deu a razão.
E agora o também ex-diretor do Banco Central da Índia faz soar outra campainha de alerta.
“Penso que o capitalismo está sob uma séria ameaça porque deixou de satisfazer as necessidades de muitos, e quando isso acontece, ocorrem muitas revoltas contra o capitalismo”, disse ao programa Today da BBC Radio 4.
“Penso que pode acontecer mais cedo que tarde”, advertiu.
Rajan, que foi mencionado como possível sucessor do canadense Mark Carney à frente do Banco da Inglaterra, acaba de publicar seu último livro El Tercer Pilar: cómo los mercados y el estado dejan a la comunidade atrás, onde adverte sobre os defeitos do capitalismo.
E o economista enfatiza que os governos já não podem se dar ao luxo de ignorar a desigualdade social em suas políticas econômicas.
No passado, era possível obter um trabalho de classe média com uma “educação modesta”, exemplifica Rajan.
Contudo, o panorama mudou a partir da crise financeira mundial de 2008 e a austeridade resultante.
“Agora, se você realmente quer ter êxito, precisa de uma boa educação”, afirmou.
“E, infelizmente, as mesmas comunidades que se veem afetadas pela globalização do comércio e da informação tendem a ser comunidades com suas escolas em péssimo estado, onde há um aumento da delinquência, aumento das doenças sociais e não podem preparar seus membros para a economia global”, disse à BBC.
É por isso que Rajan acredita que o capitalismo está se desmoronando, pois não oferece igualdade de oportunidades.
“Não está proporcionando igualdade de oportunidades e, de fato, as pessoas estão caindo em uma situação muito pior”, enfatizou.
O que, no entanto, não significa que o capitalismo não possa ser resgatado, esclareceu.
Efetivamente, na opinião de Rajan, os regimes autoritários surgem “quando todos os meios de produção são socializados”.
“O que se necessita é um equilíbrio. É preciso melhorar as oportunidades”, é sua solução. E, para Rajan, a democracia tem um papel importantíssimo no processo de renovação do capitalismo.
“Essa é a razão pela qual a democracia de mercado livre era um sistema equilibrado, mas necessitamos recuperar esse equilíbrio mais uma vez”, insiste o agora professor na Universidade de Chicago.
De qualquer modo, não é só o futuro do capitalismo a longo prazo que preocupa Rajan.
Um relatório da agência S&P Global Ratings sugere que existe a possibilidade de voltar a ocorrer outra recessão no crédito global, devido ao aumento de 50% da dívida mundial desde a crise financeira.
O relatório explica que, desde 2008, a dívida dos governos aumentou em 77%, ao passo que a dívida corporativa atingiu 51%.
E ainda que os analistas sustentem que é pouco provável que a próxima recessão seja tão grave como a crise financeira de 2008, Rajan aconselha a ficar sempre preocupados com a próxima crise financeira, pois “essa é a única maneira possível de evitar que ocorra”.
Rajan também disse que uma de suas preocupações é “a enorme quantidade de acomodação ou relaxamento monetário que houve a partir da crise global e a quantidade de liquidez que se espalhou pelos mercados”.
Em outras palavras, taxas de juros muito baixas e muita impressão de dinheiro.
“É dinheiro fácil. E o que acontece quando se recebe dinheiro fácil é que fica mal-acostumado”, alega.
“Se você tem alavancagem econômica, é alavancagem que depende do dinheiro fácil para o refinanciamento. E, ao final, isso acaba, quando acaba o dinheiro fácil”, acrescenta.
O que permanece nesses casos, no entanto, é a alavancagem que ele considera a fonte das dificuldades do setor financeiro.
E por isso o economista pensa que a próxima crise poderá ser causada pelas mesmas medidas que foram impostas para nos resgatar da última crise.
“Chega um ponto em que temos de dizer: ‘Precisamos normalizar as coisas’. Porque se não normalizamos, o sistema se reajusta a um estado em que se torna vulnerável a mudanças nas condições financeiras”, explicou.
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“O capitalismo está sob séria ameaça”, adverte Raghuram Rajan, economista que previu a crise financeira global - Instituto Humanitas Unisinos - IHU