18 Outubro 2006
Para complementar o tema pós-humano, abordado na edição 200, da revista IHU On-Line, entrevistamos o professor do curso de Engenharia da Computação da Unisinos, Wictor Carlos Magno, sobre a palestra que proferiu ontem, dia 18 de outubro, no evento Quarta com Cultura. Confira a entrevista concedida pelo professor por e-mail à IHU On-Line.
A palestra Aplicações recentes da nanotecnologia e da nanociência acontece, hoje, às 19h30 na Livraria Cultura do Bourbon Country, em Porto Alegre.
IHU On-Line - Como podemos definir nanotecnologia e nanociência? Quais suas aplicações na contemporaneidade? Quais foram os avanços?
Wictor Magno - A nanociência estuda objetos com dimensões físicas da ordem de alguns nanômetros. Um nanômetro (1nm = 10-9 m) representa a bilionésima parte do metro, um comprimento extremamente pequeno para nós seres humanos. A espessura de um fio de cabelo humano, por exemplo, é tipicamente da ordem de um décimo de milímetro (0.1 mm). Um nanômetro é, portanto, 100.000 vezes mais fino que um fio de cabelo. Esta escala de comprimento compreende o mundo dos infinitamente pequenos, como os vírus, pequenas bactérias e a própria molécula de DNA, fundamental para a existência da vida na Terra. A nanotecnologia emprega as propriedades dos nano-materiais para produzir dispositivos tecnológicos aplicados nunca antes imaginados, como a produção de nano-máquinas, nano-robôs, miniaturização dos computadores, criação de novos materiais e novos displays de altíssima resolução utilizando nanotubos de carbono, dentre outras aplicações. Estas áreas são interdisciplinares, pois envolvem conhecimentos diversos como química, física, biologia, medicina, informática, filosofia, dentre outras áreas.
Avanços nos estudos
Nos últimos anos foram feitos enormes avanços no desenvolvimento das bases teóricas e experimentais desta nova ciência, com o aumento das pesquisas em instrumentação na escala nanométrica e a criação de novos sistemas de imagens na escala abaixo da microscopia eletrônica convencional (sub-micrométrica). A nanotecnologia promete para um futuro próximo uma revolução tecnológica de forma semelhante à Revolução da Informação, ocorrida logo após a invenção do transistor há 50 anos e com o advento da microeletrônica e o estabelecimento da base tecnológica dos materiais semicondutores na escala micrométrica, a partir dos quais surgiram os computadores e os dispositivos eletro-eletrônicos atuais que caracterizam a sociedade de informação contemporânea em que vivemos.
IHU On-Line - Um novo tipo de ser humano está em ascensão. Qual é o seu ponto de vista?
Wictor Magno - Acredito que a tecnologia e a informação têm mudado o modo como os países se relacionam e como as pessoas interagem entre si. A miniaturização dos dispositivos eletrônicos (celulares, computadores portáteis, palmtops) tem favorecido a disseminação da informação em um ritmo sem igual na história da Humanidade, o que favorece o acesso permanente a dados e a informação, de forma independente de equipamento, lugar ou tempo (computação pervasiva ou ubíqua). Esse fato tende a criar um novo tipo de ser humano interligado em tempo real com sua realidade exterior.
IHU On-Line - O homem contemporâneo é um homem pós-humano? Como o senhor definiria esse conceito?
Wictor Magno - A idéia de um homem pós-humano começou com a ficção científica, através dos livros de Issac Asimov, considerado o pai da robótica. A criação de autômatos e robôs inteligentes e auto-replicantes é um desafio atual da tecnologia e a nanotecnologia permite hoje a construção de nano-engrenagens e nano-máquinas, as quais poderío em um breve transformar-se em nano-robôs. Existem pesquisas em desenvolvimento sobre a interação homem-máquina, como por exemplo, a possibilidade de estabelecer interfaces entre os computadores e o cérebro humano. Nessas pesquisas são utilizados dispositivos que capam os sinais neurais sob a forma de impulsos elétricos e com a ajuda de computadores é possível movimentar braços robóticos e servomecanismos, o que é particularmente útil para pessoas portadoras de deficiências físicas. O homem pós-humano seria então a integração completa das pessoas com máquinas e dispositivos inteligentes, o que se convencionou chamar de AI (Inteligência Artificial).
IHU On-Line - Quais os caminhos que estamos seguindo de novos modelos de existência?
Wictor Magno - Vivemos atualmente em uma sociedade da informação, onde a informação é o bem de consumo mais importante e valioso. O ser humano contemporâneo deve permanecer informado não apenas sobre o contexto da sua vida local, mas também sobre a realidade global que influencia e reflete-se na realidade específica da sua cidade. Os acontecimentos e os fenômenos globais afetam atualmente o preço dos combustíveis, dos insumos agrícolas, dos alimentos e dos produtos industrializados. Os meios de comunicação são responsáveis pela disseminação da informação para os indivíduos e a disponibilidade em tempo real dessa informação, através dos dispositivos eletrônicos miniaturizados, tem um profundo impacto na vida das pessoas.
IHU On-Line - Como a tecnologia auxilia na construção da identidade do sujeito contemporâneo?
Wictor Magno - Os atuais países em desenvolvimento somente conseguiram sair do subdesenvolvimento e avançar, através de investimos maciços em ciência e tecnologia, na educação e na melhoria da qualidade de vida das pessoas. A tecnologia é capaz de modificar a realidade exterior das pessoas e das sociedades, uma vez que favorece em geral a disseminação da informação e é capaz de formar opiniío e construir a identidade de um povo.
IHU On-Line - Há como traçar em um futuro próximo, quais serío nossos maiores desafios, como seres humanos?
Wictor Magno - O primeiro grande desafio é de reverter o ritmo atual devastador das atuais sociedades de consumo, relativo ao gasto de energia, disponibilidade de água potável e de alimentos para os povos do planeta. Esses pontos são considerados os grandes gargalos atuais da humanidade, com sérias repercussões mundiais nas próximas décadas. Superados esses impasses cruciais, restam questões importantes a serem resolvidas como a cura de doenças graves e o controle de endemias e epidemias. A nanotecnologia promete ser uma ferramenta eficaz no desenvolvimento de novos medicamentos e de novas técnicas de diagnóstico de doenças. Na área de energia, os nano-materiais permitem aumentar a eficiência de conversão de energia, o que é de importância fundamental para a sociedade em um futuro próximo.
IHU On-Line - É possível que nós humanos acabemos sendo prisioneiros dos computadores? Onde fica a questão ética?
Wictor Magno - Em maio de 1997 o supercomputador Deep Blue da IBM jogou a célebre partida de xadrez com o campeío mundial Garry Kasparov, um duelo inusitado entre máquina e homem, com claro domínio da máquina. O desenvolvimento de uma nova geração de robôs inteligentes, embarcados com ferramentas de Inteligência Artificial, possibilitará o domínio das máquinas em alguns setores da produção industrial e tecnológica em um futuro próximo. Alguns estudiosos apontam que a automação e a dependência atual da sociedade em relação aos computadores podem aumentar problemas sociais como o desemprego, com sérias implicações nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Outros pesquisadores defendem, no entanto, o fato de que os robôs substituem o trabalho humano pesado e perigoso, e novas formas de trabalho e ocupação estão em desenvolvimento, em substituição aos antigos postos de trabalho ocupados atualmente pelas máquinas. não há consenso, mas o fato é que há necessidade de um melhor estudo sobre o assunto do ponto de vista ético, e não apenas do ponto de vista econômico como comumente é feito.
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Nanotecnologia e nanociência. Entrevista especial com Wictor Carlos Magno - Instituto Humanitas Unisinos - IHU