Pontificados contemporâneos: uma história que interroga o século XX

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28 Abril 2017

Para um pontificado, quatro anos são poucos, mas são o suficiente para tentar uma primeira historicização, colocando-o no tempo ao longo do papado contemporâneo.

A reportagem é de Luca Kocci, publicada no jornal Il Manifesto, 27-04-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

É a operação realizada por Daniele Menozzi, professor de história contemporânea na Scuola Normale di Pisa, interpretando o pontificado do Papa Francisco – eleito há pouco mais de quatro anos atrás, em 13 de março de 2013 – à luz da sua relação com o “moderno” e em relação à ação dos seus antecessores com respeito à modernidade.

I papi e il moderno. Una lettura del cattolicesimo contemporaneo 1903-2016 [Os papas e o moderno. Uma leitura do catolicismo contemporâneo 1903-2016] (Ed. Morcelliana, 168 páginas) se apresenta como uma breve história da relação – que muitas vezes é um confronto – entre os papas do século XX e a modernidade, que Menozzi traduz como a “vontade de autodeterminação do sujeito”, quase sempre obstaculizada pela Igreja Católica, exceto em algumas ocasiões.

A história poderia ter começado antes: com a fogueira de Giordano Bruno (1600), com a abjuração imposta a Galileu (1633) ou com a condenação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), “a primeira formulação de uma contraposição entre a Igreja e a moderna sociedade política, que depois se prolongou ao longo das décadas posteriores”, pelo menos até o Syllabus de Pio IX (a lista que continha os principais erros do nosso tempo, em que se condenavam o liberalismo, o comunismo, o socialismo, o racionalismo e a sociedade moderna).

Mas Menozzi – também para não sobrecarregar um texto que, embora completo, mantém uma ágil legibilidade – parte de 1903, do pontificado de Pio X, que, com a encíclica Pascendi dominici gregis (1907), condena o Modernismo, apresentado como “a mais perigosa de todas as heresias, porque constituía a sutil infiltração dentro da Igreja daqueles valores modernos que alimentavam uma antítese radical ao cristianismo”.

O sucessor, Bento XV, é lembrado por ter definido a Primeira Guerra Mundial como um “inútil massacre”, mas ele também reafirma a suprema autoridade moral da Igreja: a guerra, na verdade, é uma espécie de punição divina para o pecado cometido pela sociedade ao se afastar do catolicismo.

Depois, foi a vez de Pio XI e de Pio XII, os mais renomados herdeiros da tradição do intransigentismo do século XIX.

Com João XXIII, que convocou o Concílio Vaticano II e escreve a Pacem in terris, que contém aberturas significativas sobre aspectos importantes do moderno (paz, democracia, direitos humanos), há a primeira fratura, logo recomposta por Paulo VI, que, preocupado que as ovelhas fugissem do redil (era a época da teologia da libertação, das comunidades de base, da “politização da fé”), fecha as portas e abre o caminho para os projetos de “neocristandade” de João Paulo II e de restauração de Bento XVI, que também renuncia por causa do seu fracasso.

E Francisco? Para Menozzi, ele representa uma nova cisão. Não tanto “no plano das medidas de reforma para estruturas e instituições”, no qual “a ação de Francisco pareceu, pelo menos até agora, bastante prudente e gradual”; mas sim em relação ao "escanteamento" de uma “representação da modernidade como a culpada subtração à frente da Igreja de homens que, cegados por uma incontrolável vontade de autodeterminação, confundem como progresso ilimitado os males que produzem”.

A doutrina não mudou, mas “o núcleo da mensagem evangélica” voltou a ser a “misericórdia”. A instituição eclesiástica, “em que se sedimentou bem a atitude anterior”, irá seguir essa rota diferente? É outra questão, e “só o futuro poderá desfazê-la”.

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