14 Dezembro 2015
Não é só uma declaração sobre o que é possível realizar juntos pela paz e pela justiça no mundo. Mas sim uma reflexão sobre a atualidade da Nostra aetate e sobre a natureza das relações com os cristãos a partir da tradição judaica. É um salto de qualidade importante que está contido em um novo documento hebraico intitulado "Fazer a vontade do Pai Nosso nos céus: rumo a uma colaboração entre judeus e cristãos".
A reportagem é de Giorgio Bernardelli, publicada no sítio Vatican Insider, 09-12-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O documento traz a assinatura de 25 rabinos de expressão do judaísmo ortodoxo e vem à tona em um momento particularmente significativo: justamente nessa quinta-feira, o Vaticano apresentou o novo documento da Comissão para as Relações Religiosas com o Judaísmo, intitulado "Por que os dons e o chamado de Deus são irrevogáveis (Rm 11, 29). Reflexões sobre questões teológicas concernentes às relações católico-judaicas por ocasião do 50º aniversário da Nostra aetate (n. 4)".
O que sugere que a concomitância entre os dois textos é algo mais do que uma simples coincidência é o fato de que um dos signatários do documento judeu – o rabino David Rosen, diretor para as questões inter-religiosas do American Jewish Committee, uma das maiores instituições judaicas mundiais – esteve em Roma nessa quinta-feira ao lado do cardeal Kurt Koch, para a apresentação do documento vaticano.
Para além desse gesto, também é significativa a composição do grupo dos 25 rabinos, todos de expressão do judaísmo ortodoxo: nada menos do que 13 dos signatários, de fato, vivem em Israel, enquanto os outros residem nos EUA ou na Europa (há também o ex-rabino-chefe da França, René Samuel Sirat). Mas, entre os nomes mais conhecidos, está sobretudo o de Benny Lau, rabino muito conhecido em Jerusalém, sobrinho do ex-rabino-chefe de Israel, Yisrael Meir Lau, além de descendente de Samson Raphael Hirsch, um dos gigantes do pensamento judaico do século XIX.
E justamente a referência – tipicamente judaica – aos grandes mestres da própria tradição salta logo aos olhos ao se percorrer o documento. O ponto de partida é a Shoá, a grande tragédia de 70 anos atrás, momento culminante da inimizade entre cristãos e judeus: "Olhando para trás – escrevem os rabinos – aparece claramente que a incapacidade de ir além do desprezo e de se comprometer com um diálogo construtivo pelo bem da humanidade enfraqueceu a resistência às forças malvadas do antissemitismo que arrastaram o mundo ao homicídio e ao genocídio".
Mas essa não foi a última palavra: "Reconhecemos – continua o texto – que, a partir do Concílio Vaticano II, o ensinamento oficial da Igreja Católica sobre o judaísmo mudou de maneira radical e irrevogável. A promulgação da Nostra aetate há 50 anos deu espaço a um processo de reconciliação entre as nossas duas comunidades. Apreciamos a afirmação da Igreja sobre a unicidade da posição de Israel na história sagrada e em relação à redenção final do mundo. Os judeus de hoje já experimentaram o amor sincero e o respeito por parte de muitos cristãos, através de iniciativas de diálogo, de encontros e de conferências em todo o mundo".
Segundo os signatários, porém, isso também deve levar os judeus hoje a se interrogar sobre quem são os cristãos no desígnio de Deus sobre o mundo: "Como já fizeram Maimônides e Yehudah Halevi – continua o documento – reconhecemos que o cristianismo não é nem um incidente nem um erro, mas um fruto da vontade divina e um dom para as nações. Separando entre si o judaísmo e o cristianismo, Deus quis criar uma separação entre companheiros com diferenças teológicas significativas, não uma separação entre inimigos".
Daí o convite a um olhar teologicamente novo sobre a colaboração com os cristãos: "Agora que a Igreja Católica reconheceu a Aliança eterna entre Deus e Israel, nós, judeus, podemos reconhecer o perdurável valor construtivo do cristianismo como nosso parceiro na redenção do mundo, sem nenhum medo de que essa comunhão possa ser explorada para finalidades missionárias. Como afirma a Comissão Bilateral entre o Grão-Rabinato de Israel e a Santa Sé, sob a liderança do rabino Shear Yashuv Cohen, 'não somos mais inimigos, mas inequivocamente companheiros na articulação dos valores morais essenciais para a sobrevivência e o bem-estar da humanidade'. Nenhum de nós pode desempenhar sozinho a missão que lhe foi confiada por Deus neste mundo".
O texto dos 25 rabinos também contém outras referências importantes para a tradição judaica: por exemplo, cita uma frase do rabino Naftali Zvi Berliner, outro grande pensador judeu do século XIX, segundo o qual, "quando os filhos de Esaú forem conduzidos por uma alma pura a reconhecer o povo de Israel e as suas virtudes, então nós também seremos conduzidos a reconhecer que Esaú é nosso irmão". E acrescenta ainda: "A colaboração entre nós não diminui de modo algum as diferenças que permanecem entre as duas comunidades e as duas religiões. Cremos que Deus se serve de muitos mensageiros para revelar a Sua verdade, enquanto afirmamos os imperativos éticos fundamentais que todos os povos têm diante de Deus e que o judaísmo sempre ensinou através da doutrina da aliança universal de Noé".
"Imitando Deus, judeus e cristãos devem ser modelos de serviço, amor incondicional e santidade", concluem os 25 rabinos. "Somos todos criados à imagem santa de Deus, e judeus e cristãos permanecerão fiéis à Aliança desempenhando juntos um papel ativo na redenção do mundo."
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25 rabinos ortodoxos: "O cristianismo é um dom para as nações" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU