04 Dezembro 2015
A atual Conferência do Clima em Paris tenta fechar o que a de Copenhague não conseguiu: um acordo global para limitar as emissões de gases do efeito estufa, que aceleram as mudanças climáticas.
Naquela ocasião, em 2009, o mundo viveu a expectativa de que isso acontecesse e, depois, teve que lidar com fracasso das negociações e repensar todo o processo.
A entrevista é de Nádia Pontes, publicada por Deutsche Welle, 04-12-2015.
O holandês Yvo de Boer estava no comando daquele clima tenso como secretário-geral da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), órgão que conduz as negociações. Ele deixou o posto no ano seguinte, depois de quatro anos na função.
O mundo não estava preparado para assumir compromissos sérios em Copenhague, avalia De Boer em entrevista concedida à DW Brasil nesta terça-feira 1º. "Todos já reconhecem que Paris não vai limitar o aumento da temperatura em 2 graus".
Na capital francesa, De Boer acompanha o desenrolar da COP21, mas agora no comando de uma instituição que apoia países em desenvolvimento, o Global Green Growth Institute (GGGI), baseado em Seul, na Coreia do Sul.
Eis a entrevista.
O senhor liderou as negociações climáticas de 2006 e 2010. O que espera desta edição da Conferência do Clima?
Muitos líderes mundiais estiveram em Paris no primeiro dia de negociações. Eu acho que isso é um sinal de que eles estão comprometidos com o assunto – você não precisaria voar até Paris para fazer um discurso de três minutos. Você voa até Paris se está comprometido com a discussão.
O segundo ponto positivo é que praticamente todos os países do mundo apresentaram planos de ação. O foco não está mais apenas em pequenos países industrializados, movemos para um nível de engajamento global. São dois aspectos positivos.
O que não é tão bom é que todas as promessas feitas aqui não são suficientes para reduzir as emissões; elas vão reduzir o nível de crescimento das emissões.
Em outras palavras, o resultado desse encontro é que ele vai criar uma espécie de guia para garantir que os países revejam suas promessas a cada cinco anos, analisem o que estão fazendo e aumentem suas metas.
Em 2009 o senhor liderava as negociações à frente da UNFCCC, e o mundo esperava que um acordo global saísse daquela COP em Copenhague, o que não ocorreu e trouxe uma grande frustração. A expectativa é que desta vez o acordo saia em Paris. O senhor acredita que as negociações avançaram num bom ritmo ou foram lentas demais?
Eu diria: se você quer ir rápido, vá sozinho. Mas se quer progresso, vá com os outros. Mas pode ser que você vá mais devagar. Acho que o nível de ambição em Copenhague era alto demais, muitas pessoas defendiam um acordo internacional legalmente vinculante que imediatamente limitasse o aumento da temperatura em 2 graus. Eu acho que o mundo não estava pronto para isso.
Agora, esse acordo legalmente vinculante não está sobre a mesa de negociação, as pessoas reconhecem que a COP de Paris não vai limitar esse aumento em 2 graus, mas elas estão começando a entrar nesse barco juntas.
Os Estados Unidos foram um dos países que bloquearam as negociações em 2009, e hoje assumem metas para diminuir as emissões de gases do efeito estufa. Isso foi surpreendente para o senhor?
O presidente Barack Obama reconheceu que ele nunca vai conseguir aprovar um acordo climático no Senado. Então, ele abandonou essa rota e optou pela regulamentação por meio da Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês).
Politicamente, ele adotou outra ação e, dessa maneira, pôde fazer com que o país assumisse metas mais facilmente. É claro que tudo vai depender de quem vencer as próximas eleições no país. Será que essas políticas terão continuidade?
E no caso da China, maior poluidor, que recentemente se comprometeu a diminuir suas emissões?
Os motivos que levaram Estados Unidos e China a tomar essa atitude são completamente diferentes. Acredito que a China reconhece que atual modelo econômico está falido.
Em muitas partes do país o ar é "irrespirável", não dá para beber a água, as terras estão tão poluídas que não podem sequer ser usadas para a agricultura.
A China também importa muitos recursos naturais, os transforma em produtos econômicos que são muito consumidos no Ocidente. Acho que a China reconhece que o modelo econômico precisa mudar. Mesmo que as mudanças climáticas não fossem um problema, o país faria o que tem feito pra reduzir as emissões, acredito.
Atualmente, o senhor trabalha com países em desenvolvimento. Como o senhor avalia o caminho que esses países, principalmente na América Latina, têm tomado para desenvolver suas economias?
A postura dos países em desenvolvimento está mudando de uma forma meio desesperada, eu diria, no seguinte sentido: esses países estão sentindo os efeitos das mudanças climáticas – que são algo que eles não causaram. Eles reconhecem que a comunidade internacional não vai salvá-los, que eles precisam sair dessa sozinhos.
Vários países que, no passado, assumiram posições muito políticas dizendo que os países mais ricos deveriam tomar uma atitude primeiro [para combater as mudanças climáticas], agora reconhecem que o problema também é deles e que talvez tenham que resolvê-lo sozinhos. E estão começando a agir sozinhos pra proteger seus territórios.
Todos os dias, no meu trabalho, eu vejo que os países em desenvolvimento lutam para entender como podem impulsionar suas economias, tirar as pessoas da pobreza e combater as mudanças climáticas ao mesmo tempo.
Vários desses países gastam muito dinheiro importando combustíveis fósseis e não precisariam disso se tivessem fontes renováveis. A eficiência energética também é baixa, e as condições das cidades, ruins.
Os países em desenvolvimento ainda buscam modelos de negócios e oportunidades econômicas que os levem a ser nações mais sustentáveis, limpas, que empreguem seus cidadãos e façam a economia crescer.
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"COP21 não vai limitar o aumento da temperatura em 2ºC" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU