24 Novembro 2015
Jornal critica recuperação histórica de crimes do Estado nos anos 1970 feita por governos Kirchner; presidente eleito diz que julgamento de repressores prosseguirá em seu governo.
A reportagem é de Vanessa Martina Silva, publicada por Opera Mundi, 23-11-2015.
O presidente eleito da Argentina, Mauricio Macri, afirmou durante sua campanha eleitoral que irá acabar com o “negócio” que se tornou a questão dos direitos humanos na Argentina. Na mesma linha do novo líder, o diário argentino La Nación, o segundo maior do país, publicou nesta segunda-feira (23/11) um editorial com críticas à prisão de militares acusados de crimes durante a ditadura mil itar que durou entre 1976 e 1983.
“Por estarem muito velhos para estar presos”, a medida representa uma “vergonha nacional” e os novos tempos são propícios para “terminar com as mentiras sobre os anos 1970”, diz o La Nación, em uma referência contra o julgamento dos militares.
Jorge Videla, ex-presidente argentino, foi condenado a 50 anos de prisão em julho de 2012 e morreu na cadeia em maio de 2013.
O chamado resgate da memória realizado pela Argentina nos últimos anos é apontado por organismos de direitos humanos em toda a América Latina como importante para impedir que se repitam os fatos que resultaram no desaparecimento forçado e na morte de mais de 30 mil pessoas.
O texto se inicia com declarações da senadora Norma Morandini, do partido Frente Cívico da Província de Córdoba, cujos irmãos foram jogados ao mar durante a ditadura e ela teve que deixar o país por causa da perseguição: “a senadora escreveu dias atrás nessas páginas que a questão dos direitos humanos não pode ser defendida com mentiras. Também não pode ser defendida com as novas violações de direitos humanos que estão ocorrendo no país”, afirma o jornal em referência à situação dos militares.
O editorial segue afirmando que “a cultura da vingança tem sido defendida pelos meios de difusão do Estado e nas escolas habituadas a seguir as pautas históricas nada confiáveis do kirchnerismo. Ou seja, a mentira à qual se referiu Morandi”.
“Há duas questões urgentes para resolver”, segue o texto. “Uma é o vergonhoso padecimento dos condenados, processados e inclusive suspeitos de crimes cometidos durante os anos da repressão subversiva e que se encontram nas prisões apesar da avançada idade. São mais de 300 os detidos por alguma daquelas razões que morreram na prisão, e isso constitui uma verdadeira vergonha nacional”, diz o jornal.
A segunda questão, aponta o jornal, é que “continuaram os atos de perseguição contra magistrados judiciais em atividade ou aposentados” por estarem supostamente vinculados a crimes de lesa humanidade.
Resposta ao La Nación
Em resposta ao editorial, Morandini disse, em entrevista ao uruguaio Portal Montevideo nesta segunda, que se trata de um “editorial totalmente inoportuno” e ressaltou que “não tem nada a ver com o que disse o La Nación”.
Ela afirmou que as falas utilizadas pelo jornal foram tiradas do contexto. “Me incomoda ser colocada nesse lugar. Eu não acredito na teoria dos dois demônios. Creio que existe um só demônio que é a violência política. Não defendo o fim dos julgamentos [dos militares]. A menos de dez dias escutei o que ocorreu com meus irmãos Néstor e Cristina, presos e jogados ao mar”.
Vários jornalistas que trabalham no La Nación vieram a público repudiar o editorial. "Trabalho no La Nación e não compartilho do editorial de hoje. Não sou o único jornalista na redação que pensa assim", escreveu em seu perfil no Twitter Ricardo Sametband, que escreve sobre tecnologia no jornal. Patricio Insua, que escreve sobre esporte, também se manifestou: "Trabalho no diário La Nación. O editorial de hoje é grave a partir de qualquer ponto de vista; um atentado à democracia e ao país".
Mauricio Macri, durante a entrevista coletiva realizada nesta segunda após sua vitória nas eleições, afirmou que as investigações e os julgamentos de ex-agentes de Estado atuantes durante a ditadura militar prosseguirão em seu governo.
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Após vitória de Macri, 'La Nación' chama de 'vergonhosa' prisão de militares que agiram durante ditadura - Instituto Humanitas Unisinos - IHU