04 Novembro 2015
Nello Scavo relata ao sítio Il Sismografo a sua investigação sobre as forças que, com táticas diferentes, tentam deslegitimar o Papa Francisco para desnaturalizar a sua obra e a sua pastoral.
A reportagem é de Luis Badilla e Francesco Gagliano, publicada no sítio Il Sismografo, 31-10-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Não é preciso apresentar Nello Scavo, repórter internacional, assinatura de prestígio do jornal Avvenire e já afirmado escritor de investigação, traduzido em várias línguas. O seu livro mais conhecido certamente é A lista de Bergoglio: os que foram salvos por Francisco durante a ditadura (Paulinas, 2013) e pode ser lido em 15 línguas.
Outros livros seus são I salvati di Bergoglio (Piemme, 2014), Non tacerò (escrito por o Pe. Luigi Ciotti) e Francesco contro l'economia di rapina e la mafia 2.0 (Piemme, 2015), em colaboração com Daniel Zappalà.
A sua última obra, um grande e documentado volume – I nemici di Francesco –, poucas semanas depois do seu lançamento, é um "clássico", também porque a sua publicação coincidiu com os fatos, alguns muito graves e relevantes, que colocam no centro de ataques, calúnias e mentiras a figura e a pessoa do pontífice.
Esse livro é lido com grande facilidade, graças à sua linguagem precisa e pontual, e porque ele nunca deixa cair a tensão da narrativa, orgânica, clara e convincente. Por um lado, o texto é investigação "quimicamente pura" e, por outro, é crônica histórica imprescindível para quem não esgota os seus conhecimentos na óbvia homologação midiática.
Sobre essa obra de Nello Scavo, alguns poderiam dizer que é "uma boa leitura para os pessimistas". Podemos concordar se, por pessimista, entendermos nada mais do que um otimista bem informado.
Eis a entrevista.
Como nasceu esse seu novo livro? Qual é a passagem, o momento ou o dado que convenceu vocês de que esse assunto, "os inimigos do Papa Francisco", devia ser o centro do seu novo trabalho, da sua investigação?
Na noite em que Jorge Mario Bergoglio se tornou Francisco, um "cura" de Buenos Aires me contou sobre o seu amigo Jorge Mario que, como jesuíta e como arcebispo, exigia que se lutasse "contra a pobreza, não contra os pobres". Desde os primeiros dias de pontificado, eu compreendi que essa síntese era a descrição plástica do sentido de uma vocação e de uma perspectiva pastoral. E, enquanto eu investigava naqueles dias para as crônicas como A lista de Bergoglio, a maioria das pessoas salvas pelo Padre Jorge durante a ditadura me ofereciam a descrição de um jovem jesuíta que explorava os bairros pobres, que se deixava interrogar pelo desconforto e que percebia a pobreza não como uma condição para se resignar, talvez para ganhar um lugar no paraíso, mas como uma forma de violência a qual os homens do Evangelho não podiam se resignar.
Eu entendi que as estruturas de poder político-econômico-financeiras não estariam apenas olhando no outono de 2013, quando um economista da JP Morgan atacava o papa, sem citá-lo, defendendo que "nunca antes como nesta época se fez tanto para combater a pobreza". Para mim, esse foi o momento em que ficou claro o temor de algumas elites, que se sentiam ameaçadas pela autoridade moral de Francisco. Assim, eu propus que a editora Piemme, que me oferecia a oportunidade de uma investigação jornalística abrangente, me deixasse trabalhar sobre aquilo que se tornaria I nemici di Francesco. Poucos dias depois, no dia 24 de dezembro de 2013, o Financial Times desferiu um duro ataque contra Francisco. Para mim, foi a confirmação de que essa pista devia ser seguida.
No seu livro, o "mapa" das oposições, resíduos ou antipatias contra o Papa Francisco é bastante aprofundado e argumentado. Na sua opinião, qual dessas coisas poderia ser a mais insidiosa e por quê?
Há um velho ditado que diz: "Que Deus me proteja dos meus amigos. Dos inimigos, cuido eu". No caso de Francisco, embora não faltem armadilhas internas, eu acredito que as pressões de fora são particularmente agressivas. O papa está consciente das dificuldades que o seu ritmo pode encontrar, e eu não acho que é por acaso que, ao encerrar o Sínodo, ele não escondeu que nem todas as intervenções foram marcadas pela benevolência. Mas o que está acontecendo ao redor de Francisco – eu diria, ao redor da Igreja de Francisco – é a tentativa de separar, no imaginário coletivo, o pastor do rebanho, como que sugerindo que Francisco é uma coisa, e a Igreja, outra.
Nos próximos dias, vão estourar polêmicas e supostos escândalos. Como que dizendo: "Nós gostamos do papa. Da Igreja, não". Ao mesmo tempo, tenta-se dividir a comunidade eclesial a partir de dentro, criando rixas entre ordens religiosas, entre congregações, entre bispos. O objetivo é o de enfraquecer o impulso de Francisco, minando o carisma pessoal do papa e a sua grande obra de reforma. Uma Igreja dividida e um papa que se gostaria de fazer parecer desgastado pelas disputas internas são o melhor seguro para aqueles poderes globais que querem continuar prosperando sem serem incomodados.
O seu livro saiu mais ou menos em torno do recente Sínodo, contra o qual, como se sabe, desencadearam-se muitos ataques, insinuações ou fofocas midiáticas que, às vezes, foram lidas ou interpretadas como relacionadas com setores internos à Igreja. Na sua opinião, existe uma relação entre adversários internos e adversários externos?
Tenho ouvido e lido sobre ridículos complôs no estilo de Dan Brown. Mas nenhum conspirador sério teria inventado uma história estranha como uma doença tão grave sem que houvesse apenas um indício crível. Em todo o caso, eu acho que mirar – literalmente – na cabeça do papa é um sinal que não deve ser subestimado. Nos próximos dias, vamos assistir a uma série de episódios, notícias, boatos e revelações (verdadeiras ou supostas), que serão liderados por aqueles que pretendem jogar obstáculos na Igreja e em torno do papa, alimentando um clima de suspeita e desconfiança paranoicas, de modo a fazer com que se acredite que Francisco não pode confiar senão em si mesmo.
Muitos pontífices atravessaram os pântanos da história. E, para ficar apenas com os últimos, basta lembrar o atentado contra João Paulo II e o Vatileaks sofrido por Bento XVI. É um roteiro já visto. Há 2.000 anos, o Nazareno era caluniado, alvejado, por fim preso por uma conspiração aparentemente sem direção. E, para podê-lo agarrar, foi usado um dos seus "fidelíssimos". Nem mesmo na Igreja de hoje faltam os "servos tolos", que, sob o pretexto de defender sabe-se lá quais posições ideológicas, oferecem o lado para aqueles que têm o único interesse de atacar e enfraquecer a Igreja.
Sobre o "Sínodo midiático", e sabendo que você é um leitor muito atento de todas as coisas relativas ao pontificado, eu gostaria de saber se você compartilha ou não uma impressão nossa, isto é, de que agora há também "um pontificado midiático"; não aquele que o papa diz e faz de verdade, mas aquele segundo o qual – de um lado e de outro – Francisco é visto, analisado e contado.
Eu respondo como cronista e não como vaticanista (esta última qualificação requer qualidades e competências que eu não possuo, embora recentemente não faltaram colegas que sujaram essa preciosa e nobre categoria de repórter). Justamente a falsa notícia de uma doença do papa e, antes, o caso Charamsa parecem não ter desviado o Sínodo, ao contrário do que acontecia ao se ler alguns jornais italianos e estrangeiros. Se acreditássemos em certas versões, pareceria que os Padres sinodais não falaram de outra coisa.
O fato de querer forçar a mão sobre a notícia de que alguns parágrafos do documento final foram aprovados "por um único voto de diferença", deixando em segundo plano que se tratava de uma maioria qualificada de dois terços, também me pareceu querer alimentar o curto-circuito informativo que veria o papa como "um homem sozinho". As resistências, naturalmente, não faltaram, e, em primeiro lugar, o próprio Francisco não as escondeu, mas a ideia de um papa "em minoria", forçado a compromissos a fim de não "perder a confiança" do Sínodo, não poderia ser sustentada nem mesmo por um cartunista bêbado.
Como a história recente demonstra, e não só, todo papa teve inimigos ou adversários. Eles não faltaram a João Paulo II e a Bento XVI, assim como aos seus antecessores. Com relação a isso, hoje, não há nenhuma novidade. No fim da sua grande investigação, você teve uma ideia dos perfis singulares e únicos daqueles que hoje se opõem ao Papa Francisco?
"O diabo entra pela carteira", o Papa Francisco gosta de repetir. E isso é comum a muitos dos seus inimigos. Deixe-me esclarecer: não é o papa que os percebe como "inimigos", mas são eles que consideram o pontífice como tal. Com relação a certas dinâmicas mundanas, Bergoglio tem o feio "defeito" de se deixar preceder pelos fatos. Se ele fala de exclusão e marginalização, ele faz isso acima de tudo cuidando dos sem-teto de Roma. Se ele pede para se construir oportunidades de diálogo, ele não isenta a diplomacia vaticana de enfrentar os mais complicados conflitos internacionais.
A obra-prima sobre a rota Washington-Havana; o relançamento do processo de pacificação na Colômbia; o fato de ter demonstrado que é possível, com a boa vontade de todos, parar a guerra na Síria (com o dia de oração e jejum acompanhado por um cessar-fogo); as muitas moções na ONU apoiadas pelos principais líderes mundiais. E isso só para citar alguns dos resultados alcançados. Em suma, quando Francisco fala dos traficantes de armas, ele age em conformidade, obstaculizando o negócio dos armamentos, e isso assusta aqueles que embolsam riquezas e expandem o poder através das guerras. Quando ele fala de traficantes de seres humanos, ele se move in loco, convocando também simpósios no Vaticano, nos quais – como eu documentei no livro – são dados até os nomes das multinacionais que prosperam graças ao trabalho mal pago. E esses são só alguns exemplos.
Em todo o caso, eu não sou pessimista. No último dia 29 de junho, no dia em que se lembram os santos Pedro e Paulo, o Papa Francisco com a costumeira franqueza, demonstrou todo o seu conhecimento e toda a sua fé: "Quantas forças, ao longo da história, tentaram – e tentam – aniquilar a Igreja, tanto de fora quanto de dentro, mas são todas aniquiladas, e a Igreja continua viva e fecunda!, continua inexplicavelmente firme". E, depois, acrescentou: "Passaram reinos, povos, culturas, nações, ideologias, potências, mas a Igreja, fundada sobre Cristo, apesar das muitas tempestades e dos muitos pecados nossos, permanece fiel ao depósito da fé no serviço, porque a Igreja não é dos papas, dos bispos, dos padres, nem mesmo dos fiéis, é apenas e somente de Cristo". Será assim também desta vez. E que os detratores de Bergoglio se resignem: apesar deles, "a Igreja continua inexplicavelmente firme".
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"Existem estratégias para enfraquecer Francisco, minando a sua grande obra de reforma." Entrevista com Nello Scavo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU