16 Outubro 2015
Uma ideia que circulou no Sínodo foi a de permitir uma tomada de decisões mais local sobre as abordagens pastorais a algumas das questões da família consideradas mais polêmicas, como o divórcio/recasamento e as questões LGBT. Porém, essa abordagem descentralizada tem um lado negativo: ela permite que bispos locais também sejam excludentes no seu ministério pastoral.
A opinião é de Francis DeBernardo, diretor-executivo da New Ways Ministry, organização católica de gays e lésbicas. O artigo foi publicado no blog Bondings 2.0, 14-10-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Eu gostaria de olhar para uma estratégia criativa que está sendo discutida no Sínodo em Roma, que pode ser um bom prognóstico para as pessoas LGBT. Uma ideia que foi proposta por vários bispos de várias maneiras diferentes é a de permitir uma tomada de decisões mais local sobre as abordagens pastorais a algumas das questões da família consideradas mais polêmicas, como o divórcio/recasamento e as questões LGBT.
Um dos primeiros bispos a levantar essa questão foi o bispo Johan Bonny, da Antuérpia, na Bélgica, que virou manchete no fim de 2014, quando se tornou o primeiro bispo católico a apelar à Igreja para abençoar casais do mesmo sexo. Aqui está o trecho mais relevante da intervenção de Bonny no Sínodo, no dia 5 de outubro:
"Nas suas Igrejas locais, os bispos encontram uma grande variedade de questões e necessidades, para as quais devem dar uma resposta pastoral hoje. Em todo o mundo, fiéis e pastores fizeram uso do Sínodo e do questionário para apresentar as suas questões prementes aos bispos e ao papa. Essas questões são claramente diferentes entre países e continentes. Entretanto, há um tema comum nessas questões, ou seja, o desejo de que a Igreja fique no 'grande rio da misericórdia' (Instrumentum laboris 68, 106). É importante que o Sínodo dê espaço e responsabilidade para que os bispos locais formulem respostas adequadas às questões pastorais daquela parte do povo de Deus que é confiada aos seus cuidados pastorais. As Conferências Episcopais individuais têm um papel especial nisso. O Sínodo não lida apenas com 'a família como Igreja', mas também com a 'Igreja como família'. Cada família sabe o que significa trabalhar em unidade na diversidade, com paciência e criatividade."
Michael O'Loughlin, do sítio Crux, escreveu um bom artigo sobre o tema da tomada de decisões pastorais local, em que ele conecta essa ideia às mudanças que ocorreram desde que o Papa Francisco entrou em cena:
"Durante décadas, alguns bispos e teólogos se queixaram daquilo que eles veem como uma excessiva concentração de poder em Roma e a necessidade de empoderar as Conferências Eepiscopais e as Igrejas locais para lidarem mais com as questões por conta própria. O que mudou com Francisco é o sentido de que um movimento na direção de uma maior 'colegialidade', ou seja, uma autoridade compartilhada, é possível."
O'Loughlin também citou outro proponente do Sínodo sobre a tomada de decisão local:
"O cardeal Luis Tagle, de Manila, disse que as diferenças culturais podem levantar a necessidade de soluções variadas, mas sempre com a unidade em mente. 'Há uma unidade da fé, uma só Igreja, uma só doutrina, mas as situações são diferentes', disse ele. 'Houve uma séria proposta para ver que espaço poderia ser dado às Conferências Episcopais para tratarem de questões de alguma forma peculiares a elas, mas sempre à luz da fé comum'."
Na coletiva de imprensa dessa quarta-feira, o abade Jeremias Schroder, OSB, arquiabade da Congregação Beneditina de Santa Otília, na Alemanha, disse que muitas propostas de estratégias pastorais descentralizadoras foram levantadas muitas vezes durante as discussões sinodais, especialmente em torno da forma como lidar com a coabitação e com o alcance pastoral para as pessoas homossexuais.
Ele disse que o público católico alemão está muito preocupado com a questão do alcance às pessoas divorciadas/recasadas, e "essa parece ser uma área onde se poderia pensar em soluções pastorais regionais".
Em seguida, ele continuou:
"Eu também tenho a impressão de que a compreensão da homossexualidade, a aceitação social da homossexualidade, é culturalmente muito diversificada, e essa também me parece ser, muito obviamente, uma área onde as Conferências Episcopais deveriam ser autorizadas a formular respostas pastorais que estejam em sintonia com o que pode ser pregado, anunciado e vivido em um dado contexto."
Eu tenho que dizer que eu fiquei muito intrigado com essa ideia e saí da coletiva de imprensa do Sínodo animado com essa possibilidade. Mas, no momento em que eu voltei para o meu quarto e reconectei o meu computador, eu vi uma história que me fez pensar se a tomada de decisão em nível local é realmente uma boa ideia.
David Gibson, do Religion News Service, tinha postado uma história com a manchete: "Arcebispo de Nova Jérsei define regras para barrar católicos da Comunhão". Aqui está a sua essência:
Enquanto o Papa Francisco e líderes católicos de todo o mundo debatem formas para tornar a Igreja Católica mais inclusiva, o arcebispo de Newark, John Myers, deu aos seus padres diretrizes rígidas sobre a recusa da Comunhão a católicos que, por exemplo, apoiam o casamento gay ou cujo casamento não é válido aos olhos da Igreja.
No memorando de duas páginas, Myers também ordenou que paróquias e instituições católicas não hospedem pessoas ou organizações que discordam com os ensinamentos da Igreja.
Ele diz que os católicos, "especialmente os ministros e outros que representam a Igreja, não devem participar ou estar presentes em eventos religiosos ou eventos destinados a endossar ou apoiar aqueles que rejeitam ou ignoram o ensinamento da Igreja e o Direito Canônico".
A tomada de decisão local de Myers mostra o lado negativo de uma abordagem descentralizada. Ela permite que bispos locais sejam excludentes no seu ministério pastoral. Eu mencionei esse problema em um post há alguns dias sobre as leis de criminalização das pessoas LGBT. Em alguns casos no mundo, os bispos dão uma aprovação tácita ou até mesmo apoiam fortemente tais leis, que, obviamente, se opõem à doutrina católica. Nesses casos, é bom que a Igreja universal tenha alguma supervisão, para corrigir fraternalmente aqueles bispos cujas medidas, pastorais ou políticas, não estejam alinhadas com os valores do Evangelho.
Mas, como eu estou aprendendo aqui no Sínodo, ao ouvir tantas perspectivas culturais diferentes da nossa Igreja Católica universal, as soluções não tem que ser binárias: plano A ou plano Z. De fato, parece haver uma grande variedade de formas para abordar um problema, mais do que a minha mente insignificante jamais imaginaria, isso é certo.
Nós só precisamos confiar e facilitar o Espírito Santo, permitindo que todas as vozes e todas as perspectivas falem as suas verdades, para que possamos chegar a boas soluções para todos.
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Sínodo: mais autonomia para os bispos? Artigo de Francis DeBernardo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU