19 Junho 2015
Acadêmicos de diversas áreas opinaram sobre a nova encíclica de Francisco, concordando que as implicações políticas e antropológicas dentro do texto são inerentes à discussão.
A reportagem é de Soli Salgado, publicada no sítio National Catholic Reporter, 18-06-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Por mais de um século, os norte-americanos – incluindo os católicos – reagiram ao ensinamento da Igreja, argumentando que o papa e os bispos deveriam ficar fora da política e se limitar a falar de religião, disse Una Cadegan, professora da University of Dayton, em Ohio, especialista na cultura intelectual e literária católica do século XX.
"Mas se estamos falando de salário mínimo, ou de justiça social, ou de proliferação nuclear ou do destino do planeta, estamos falando da nossa vida comum, que é apenas outra palavra para política", disse. "E, se somos cristãos, no coração dessa vida comum, está o amor."
Marian Diaz, professora assistente de estudos pastorais da Loyola University Chicago, concordou que discutir a justiça ambiental exige que se aborde a justiça social, cultural, antropológica e econômica.
"Defender uma ecologia integral na nossa casa comum requer uma justiça integral", afirmou.
Também devemos redefinir sucesso e progresso, acrescentou, a partir do mero desenvolvimento econômico, para todas as "ações criativas, construtivas e comuns" feita no sentido do cuidado ambiental e social.
John Sniegocki, professor de teologia e ciências ambientais da Xavier Univesity, disse que tomar medidas requer uma transformação fundamental dos sistemas culturais, econômicos e políticos que estão "destruindo a boa criação de Deus e causando graves prejuízos para os pobres".
"Devemos tomar medidas ousadas para realizar essas reformas estruturais e também para mudar os nossos próprios estilos de vida. Trabalhar juntos para realizar essas mudanças é uma parte essencial da fé cristã", disse.
Sniegocki acrescentou que, embora a encíclica ofereça uma "forte afirmação do valor intrínseco de todas as criaturas aos olhos de Deus" – a mais clara declaração que ele já viu em declarações papais –, ela perdeu a chance de explorar as implicações de tais afirmações, tais como as relacionadas com as escolhas alimentares e, especificamente, com o consumo de carne.
"A encíclica deixa de salientar que a indústria mundial de gado está entre as maiores causas de destruição ambiental, sendo também uma das principais fontes de emissões de gases de efeito estufa", disse ele, embora também tenha reconhecido que as afirmações de Francisco facilitariam que as pessoas enfrentem a questão no âmbito da doutrina social da Igreja.
A promessa do céu não deve nos distrair de apreciar os dons que temos atualmente, disse Nancy Rourke, diretora do Programa de Estudos Católicos do Cansius College, em Buffalo, Nova York.
"Nós, cristãos, pensamos na criação como um dom, mas também pensamos no além com Deus como uma coisa melhor, um dom superior", disse ela, acrescentando que esse tipo de pensamento facilitar assumir a terra como algo garantido. "Na verdade, esse dom, essa criação é tudo o que precisamos para ser felizes, completos e estar em comunhão com Deus".
Embora a maioria dos acadêmicos expressaram entusiasmo para o leque de questões que a encíclica aborda sobre a ação ambiental, Kevin Ahern – especialista em ética teológica e e professor do Manhattan College, em Riverdale, Nova York – disse ter percebido três coisas que faltam no texto.
Ele observou que não há menção ao pecado social e estrutural, o que o surpreendeu, "dada a análise de Francisco sobre as causas profundas". E, embora tenha dito que há rumores de que a próxima encíclica será sobre o desarmamento, ele disse que deveria haver mais menções ao efeito da guerra sobre o ambiente e os pobres. Por último, Ahern considerou que o texto carece de um forte apelo à ação para as paróquias, escolas e instituições eclesiais.
"Eu posso até ver um pároco, um reitor de universidade ou um administrador de hospital olhando para isso e dizendo: 'E daí?'", disse Ahern, acrescentando que o desafio consiste em articular melhor como as instituições podem ser instrumentos de Deus na proteção do nosso planeta.
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Acadêmicos defendem implicações políticas e antropológicas da Laudato si' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU