27 Fevereiro 2015
O que fazes aqui? O que buscas? Deixas-te surpreender por Deus? E ainda: queres entender para onde queres ir? Então, "refaz os teus passos". Foi aberto sob a insígnia de perguntas e convites dirigidos diretamente ao coração dos presentes o quarto dia dos exercícios espirituais quaresmais para o papa e a Cúria Romana, realizados na casa Divin Maestro, dos religiosos paulinos de Ariccia.
A reportagem é do jornal L'Osservatore Romano, 25-02-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O carmelita Bruno Secondin disseminou essas perguntas na primeira meditação dessa quarta-feira, 25 de fevereiro, que, depois das reflexões dedicadas a recuperar a própria verdade interior e a liberdade de adesão à proposta de Deus, abriu o caminho para essa proposta.
A discutida história do profeta Elias, que luta com zelo e sacro furor, mas com um egocentrismo exagerado, para defender a aliança entre o Senhor e o seu povo, e que se encontra exausto, derrotado e assustado em uma caverna do monte Horeb, continuou a oferecer os impulsos para as reflexões do pregador.
Na meditação da tarde da terça-feira, 24, o religioso tinha completado a proposta de "sondagem da consciência", analisando justamente a trágica situação de Elias, que, como narrado no capítulo 19 do Primeiro Livro dos Reis, se encontra em um estado de "depressão mortal", assustado, em fuga, sozinho, exausto, decepcionado com o próprio fracasso.
Um estado de depressão que, disse o padre Secondin, "não é tão raro, mesmo na vida sacerdotal. Muitos desmoronam, mesmo entre os padres". Por isso, é preciso prestar atenção a certos sinais que poderiam desembocar em enormes dificuldades interiores.
Acima de tudo, o "medo". Ele surge quando temos medo do futuro, d assumir responsabilidades. E pode ser acompanhado pela "solidão", pelo sentir-se excluído e diferente, pelo sentimento de "vazio" dado por uma vida ressequida, decepcionada com os insucessos, pelo "colapso psicofísico" e pela "autoacusação" (o próprio Elias diz: "Não sou melhor do que os meus pais").
Tudo isto pode desembocar na "fuga" – que pode ser física ou no imaginário – ou na repetição obsessiva de certos gestos (como o consumo de álcool e de alimentos, ou na evasão no mundo virtual), ou até no "desejo de morte".
Para evitar tudo isso, é importante levar uma vida em que "a relação entre trabalho, repouso, oração e relações sociais" seja "bem equilibrada".
Reconhecer o mais rapidamente possível certas dinâmicas interiores, certos "sinais de estresse" é fundamental para poder encontrar aquela solução que é proposta no relato bíblico através da intervenção do anjo, que conforta Elias e o convida a se dirigir ao Horeb.
"Elias – explicou o carmelita –, precipitado aos infernos, conhece a transformação da fuga assustada que se torna peregrinação." E nós perguntou-se, na dificuldade, "sabemos reconhecer ao nosso redor a mão do anjo?". Assim como o pão serviu de apoio para Elias, "reconhecemos na Eucaristia o viático que nos acompanha?". Assim como a viagem levou Elias de volta para as raízes da aliança, sabemos também nós "voltar às raízes" da nossa fé?
Uma fez que se assumiu a verdade dentro de si mesmo e se predispôs à escuta, pode-se chegar ao confronto com Deus. E a "manifestação misteriosa" que Elias experimenta no Horeb, aquele "sussurro de uma brisa suave" sobre a qual tantos exegetas se angustiaram, pode sugerir muito à meditação pessoal.
O padre Secondin, na meditação da manhã da quarta-feira, repassou detalhadamente o diálogo entre Deus e Elias. O profeta é caracterizado por um "eu hipertrofiado", que o leva a se considerar "o umbigo do mundo".
Sob essa ótica, "a sua derrota poderia parecer a derrota de Deus". O Senhor "deixa-o discursar no seu solilóquio hipertrofiado", quer que Elias "se deixe decompor" e opere uma "catarse profunda". E o desloca com a pergunta: "O que fazes aqui?". Deus "se apresenta com uma pergunta" e obriga o homem "a se olhar dentro, a dar voz às inquietações que carrega".
Às vezes, avisou o pregador, Deus também se torna para nós uma espécie de "bibelô", e corremos o risco de "manipulá-lo" com a mesma fúria que parece permear o profeta. Mas "Deus é livre diante dos poderosos e também diante da fúria de Elias": o fracasso de Elias não perturba Deus, que já tem um desígnio próprio e tem um povo ao qual ele permaneceu fiel.
Elias é abalado interiormente. O vento impetuoso, o terremoto, o fogo em que o profeta não encontra Deus também poderiam ser – sugeriu o padre Secondin – "projeções de estados interiores" de uma pessoa a quem o mundo inteiro caiu sobre si.
A partir dessa lectio, explicou o pregador, devem brotar perguntas pessoais: "Nós também temos Jezebéis que arruínam a nossa vida? Somos obcecados por problemas com algumas pessoas, ou de trabalho, ou de carreira?". Como nos relacionamos com Deus? Sabemos "estar em adoração temente do Deus que passa?". Como o Senhor é intimidade, "temos o hábito de estar com ele em intimidade?". Ou há rumores ensurdecedores ("sucesso, vaidade, dinheiro, culpas dos outros") que nos distraem?
Por fim – lembrando os sete mil israelitas que permaneceram fiéis ao Senhor –, damo-nos conta de que estes podem representar "a fidelidade silenciosa do povo"? E quem medita também deve se perguntar: sou capaz de compreender e de interceptar essa fidelidade, sou capaz de escutar "os ultrassons dos pobres, dos simples, dos pequenos", que são "dons preciosos e não fragmentos perdidos"?
As respostas podem encontrar um apoio naquela que é a reação de Deus no relato bíblico. Elias queria acabar ali, morrer no Horeb, onde havia iniciado a aliança. Ao contrário, Deus "manda-o de novo a uma nova estação". Também nós somos chamados a "captar sinais de futuro" nas nossas raízes, a "reencontrar frescor", a nos pôr a caminho.
E se, como Elias, "estamos decepcionados, cansados, acreditamos ser os melhores de todos e pensamos que o mundo é habitado apenas por diabos enfurecidos", deixemo-nos "surpreender por Deus" e iniciemos um novo caminho.
Eis, então, o convite com o qual o pregador concluiu a meditação: "Refaz os teus passos!". Um convite que o padre Secondin enriqueceu com uma série de sugestões concretas, convidando a compartilhar os próprios bens materiais com os mais pobres, a "abrir os armários cheios de paramentos inúteis" e a jogá-los fora, a abrir os braços para "fazer a paz sincera com aqueles que não se consegue suportar", a abrir os horizontes "à verdade polifônica, à beleza das culturas e à riqueza das tradições", para admirar aquilo que Deus fez de belo.
O carmelita exortou por fim: "Move os teus passos nas periferias, vai celebrar nos barracos, vai almoçar com quem tem pouco para comer. Vais entender onde Deus te espera".
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Exercícios espirituais da Cúria Romana: ''Refaz os teus passos'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU