02 Julho 2014
Depois de Müller, Brandmüller, Caffara e De Paolis, outro cardeal entrou em campo de forma grandiosa contra as teses pró-comunhão aos divorciados em segunda união apoiadas pelo seu colega teólogo Walter Kasper no consistório de fevereiro passado.
A reportagem é de Sandro Magister, publicada no blog Settimo Cielo, 29-06-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
É o canadense Thomas Collins, arcebispo de Toronto, 66 anos, cardeal desde 2012 e estrela em ascensão do sagrado colégio, dentre outras coisas chamado pelo Papa Francisco para fazer parte da renovada comissão de cardeais de superintendência do IOR.
O cardeal Collins falou sobre a questão em uma extensa entrevista com Brandon Vogt para o blog católico norte-americano The Word on Fire, publicada no dia 25 de junho, véspera da divulgação do Instrumentum laboris, isto é, o texto-base do próximo Sínodo sobre a família.
Em uma passagem da entrevista, Collins argumenta assim sobre a impossibilidade de dar a comunhão aos divorciados em segunda união:
Os católicos divorciados e em segunda união não podem receber os sacramentos a Sagrada Comunhão, porque, seja qual for a sua disposição pessoal ou as razões para a sua situação, talvez conhecida apenas por Deus, eles persistem em um estilo de vida que é objetivamente contrário ao claro mandamento de Jesus.
Esse é o ponto. O ponto não é que eles cometeram um pecado; a misericórdia de Deus é abundantemente assegurada a todos os pecadores. Assassinato, adultério e outros pecados, não importa quão sérios, são perdoados por Jesus, especialmente mediante o sacramento da Reconciliação, e o pecador perdoado recebe a comunhão. A questão em matéria de divórcio e de recasamento é a decisão consciente da pessoa, por quaisquer razões, de persistir em uma situação contínua de desconexão do mandamento de Jesus. Embora não seria certo para eles receber os sacramentos, precisamos encontrar melhores formas para ir ao encontro das pessoas que se encontram nessa situação, para lhes oferecer uma ajuda amorosa.
Uma coisa que poderia ajudar é que todos nós percebêssemos que receber a comunhão não é obrigatório na missa. Há muitas razões pelas quais um cristão pode optar por não receber a comunhão. Se houvesse menos pressão sobre cada um para receber a comunhão, isso seria de alguma utilidade para aqueles que não estão em uma posição para fazê-lo.
E ainda:
Precisamos pensar sobre o que podemos fazer para ir ao encontro das pessoas que se encontram nessa situação, de uma forma amorosa e efetiva. Mas, ao fazer isso, também devemos estar atentos ao mandamento de Jesus e à necessidade de não minar a santidade do matrimônio, com mais consequências graves para todos, especialmente em um mundo em que a estabilidade do matrimônio já está tragicamente comprometida. Se proclamássemos em ações, mesmo que não por palavras, que a aliança matrimonial não é realmente o que Jesus diz que é, então isso daria um conforto de curto prazo às custas de um sofrimento de longo prazo. Se a santidade da aliança matrimonial for progressivamente enfraquecida, no fim, serão as crianças que vão sofrer mais.
Mas, na entrevista, Collins diz muito mais do que o relatado aqui. Perto do fim, ele também faz um paralelo entre as expectativas de mudança que antecederam a Humanae vitae, de Paulo VI, e as que – na sua opinião igualmente infundadas – precedem o próximo Sínodo:
Nos anos anteriores à carta do Papa Paulo VI que reafirmou a constante doutrina cristã que ensina que a contracepção não está de acordo com a vontade de Deus, havia uma especulação generalizada de que a Igreja iria mudar a sua doutrina. Esse tipo de especulação se baseia, em certo grau parte, na ideia de que a doutrina cristã é como a política de um governo: quando as circunstâncias mudam, ou quando mais pessoas apoiam esta alternativa em vez daquele, então as políticas mudam.
Mas o ensino cristão se baseia na lei natural que está escrita nas nossas próprias naturezas por Deus e, especialmente, na palavra de Deus revelada. Descobrimos a vontade de Deus, e as escrituras e a fé viva da Igreja nos ajudam a fazer isso. Nós não moldamos a vontade de Deus de acordo com o que atualmente nos parece ser melhor.
Então, quando o Papa Paulo VI não mudou o que ele não podia mudar, mas reafirmou a fé cristã, muitas, muitas pessoas ficaram chateadas e simplesmente decidiram ignorar o ensino. Essa é a nossa situação atual. Eu certamente espero que não soframos uma repetição disso, já que uma especulação infundada circula acerca de uma mudança por parte da Igreja do ensino explícito de Jesus sobre o matrimônio.
Uma curiosidade: como se viu acima, o cardeal Collins, para explicar a impossibilidade de dar a comunhão aos divorciados em segunda união, também faz a comparação entre a sua situação de perdurante e consciente "afastamento do mandamento de Jesus" e a de um culpado de outro pecado até mesmo gravíssimo como o homicídio, que, no entanto, arrependido, pode ser absolvido e readmitido à comunhão.
A curiosidade é que essa mesma comparação, feita nos mesmos dias pelo pároco de Cameri, na diocese de Novara, Pe. Tarcisio Vicario, o expôs ao ridículo público por parte do cardeal Lorenzo Baldisseri, secretário-geral do Sínodo, que, no dia 26 de junho, definiu as palavras do sacerdote como "uma loucura, uma opinião estritamente pessoal de um pároco que não representa ninguém, nem mesmo a si mesmo".
No dia anterior, o bispo de Novara, Franco Giulio Brambilla, também se sentira no dever de "um claro distanciamento tanto dos tons quanto dos conteúdos do texto" daquele seu pároco, por causa da "inaceitável equiparação, embora introduzida como exemplo, entre as coabitações irregulares e o homicídio. A exemplificação, mesmo que escrita entre parênteses, é inoportuna e enganosa, e, portanto, errada".
Mais especificamente, aqui estão as palavras textuais do infeliz padre: "Para a Igreja, que atua em nome do Filho de Deus, o matrimônio entre batizados é sempre e apenas um sacramento. O matrimônio civil e a coabitação não são um sacramento. Portanto, quem se coloca de fora do sacramento, contraindo o matrimônio civil, vive uma infidelidade continuada. Não se trata de um pecado ocasional (por exemplo, um homicídio), nem de uma infidelidade por leviandade ou por hábito que a consciência, no entanto, chama ao dever de se emendar através de um arrependimento sincero e o propósito verdadeiro e firme de se afastar do pecado e das ocasiões que levam a ele".
O cardeal Collins não disse nada diferente. Uma "loucura", também dele?
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O cardeal, o pároco e os divorciados - Instituto Humanitas Unisinos - IHU