Yukiya Amano, diretor geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), não é conhecido pela fala enérgica. Portanto, foi uma surpresa quando, na abertura da
Conferência Ministerial sobre Segurança Nuclear, na semana passada, em
Viena, ele declarou que, mesmo depois do desastre da
usina de Fukushima - após o terremoto seguido de tsunami em 11 de março no Japão -, nada corre menos risco do que o futuro da energia nuclear.
A reportagem é de
Cordula Meyer, da
Der Spiegel e reproduzida pelo jornal
O Estado de S.Paulo, 03-07-2011.
Amano disse que muitas coisas precisam ser melhoradas, para abranger agências reguladoras e uma política de informação e prevenção de desastres. Ele defendeu inspeções obrigatórias das usinas, que devem ser feitas pela agência, e propôs que, nos próximos três anos, um décimo dos 440 reatores em todo o mundo seja selecionado aleatoriamente para inspeção sem aviso.
Além disso, segundo ele, as empresas que operam centrais nucleares deverão ser mais responsabilizadas no caso de acidentes futuros. "Deixar tudo como está não é uma opção", disse
Amano aos delegados presentes à conferência em Viena.
Contudo, os delegados sabiam como interpretar corretamente as palavras de
Amano. "Na realidade, a mensagem foi "por favor, deixem tudo da maneira como está"", disse um delegado.
Especialistas em energia nuclear e políticos de 150 países reuniram-se em Viena. Quase todos concordaram que as lições tiradas de
Fukushima só tornaram mais firme a noção de que a energia nuclear é segura.
Após a tripla fusão na central nuclear japonesa, ministros de gabinete de muitos países, na verdade, estão tentando manter as coisas como estão da maneira mais discreta possível. Não parecem muito interessados no fato de que, hoje, a maior parte da humanidade opõe-se à energia nuclear.
As opiniões estão mudando. De acordo com pesquisa realizada pelo instituto de opinião Ipsos, somente na
Índia, na
Polônia e nos
EUA a maioria da população ainda aprova a energia nuclear.
Mesmo na
França, país que retira grande parte da sua energia dos reatores nucleares, dois terços dos entrevistados disseram ser contra essas usinas. No
Japão, 58% são contra, sendo que muitos mudaram de opinião após o desastre de
Fukushima. Embora os especialistas e políticos tenham debatido zelosamente a proposta de inspeções obrigatórias feita por Amano, ela não tem chance de ser aprovada. Foi categoricamente rejeitada por EUA, Grã-Bretanha e Japão.
Além disso, foi um pouco irônico a
AIEA procurar se declarar autoridade reguladora suprema do mundo. De acordo com seus estatutos, a missão da agência é apenas promover o uso pacífico da energia nuclear. Então, como pode se tornar o órgão regulador mais estrito do setor? Por outro lado, os delegados mostravam-se confiantes. "Vamos expandir a energia nuclear", anunciou o enviado russo, acrescentando que o seu país planeja continuar desenvolvendo reatores de nêutrons rápidos. "Sem dúvida, a energia nuclear é uma fonte de energia limpa, que pode sustentar o crescimento econômico global atendendo às necessidades energéticas, especialmente no mundo em desenvolvimento, e, ao mesmo tempo, solucionar os problemas de mudança climática e aquecimento global", afirmou o delegado indiano. Ele observou que seu país pretende aumentar 12 vezes a quantidade de eletricidade produzida a partir da energia nuclear nos próximos 20 anos.
Malásia e
Vietnã, por seu lado, manifestaram intenção de lançar em breve programas de tecnologia nuclear.
No entanto, a decisão da
Alemanha de fechar gradativamente suas centrais nucleares deixou as pessoas confusas e perplexas.
Mongólia e
El Salvador estão entre os poucos países que elogiaram a política antinuclear de
Alemanha e
Áustria.
Bacilo teutônico
O secretário de Energia e Mudança Climática da Grã-Bretanha,
Christopher Huhne, queixou-se de que a decisão alemã provocou um aumento dos preços do gás natural.
Em conversa recente com
Huhne,
Jürgen Grossmann, CEO da gigante do setor energético alemão, a RWE, disse que "se ele não puder construir ou operar usinas nucleares no seu país, talvez o faça na Grã-Bretanha".
Entretanto, acima de tudo, foi observado um temor crescente em Viena de que o "bacilo teutônico", como disse um dos delegados presentes, possa se propagar para outros países agora que contaminou a
Suíça e a
Itália.
O desastre de Fukushima acabou ficando em segundo plano, apesar de um delegado afirmar que, "ao que parece, os japoneses cometeram graves erros". O muro destinado a proteger a usina de Fukushima contra tsunamis era muito baixo, salientou o delegado, e as válvulas de escape falharam.
Por outro lado, a
Tepco, proprietária da usina e responsável por seu funcionamento, nunca instalou os chamados recombinadores de hidrogênio, que agregam os átomos de hidrogênio potencialmente explosivos a átomos de oxigênio, evitando, com isso, as explosões de hidrogênio que destroçaram os edifícios que abrigavam o reator em
Fukushima nos dias que se seguiram ao terremoto e ao tsunami.
Os graves erros cometidos pelo governo japonês no tocante à proteção contra radiação também foram discutidos. Nas primeiras semanas após o desastre, o centro de gerenciamento de emergências não usou os modelos de cálculo de dados climáticos.
Em consequência, as autoridades demoraram muito para reconhecer que havia uma zona seriamente contaminada a noroeste da usina afetada. Após o acidente, havia poucos dosímetros e, com a falta do equipamento, os testes de medição de radiação nos trabalhadores da usina foram retardados.
Nada disso diminuiu os elogios ao Japão feitos pelo chefe da comissão de investigação da
AIEA: "Tudo o que podia ser feito, foi feito", disse ele.
Não é a primeira vez que a
AIEA faz uma avaliação desse tipo e realiza uma reunião dessa natureza. Há 25 anos, a agência reuniu-se em Viena para discutir a fusão nuclear verificada em
Chernobyl. Na ocasião, o diretor da AIEA,
Hans Blix, apresentou algumas propostas para melhorar a segurança nuclear: inspeções obrigatórias por parte da agência e fazer c0m que as empresas que administram usinas nucleares assumissem mais a responsabilidade por possíveis incidentes.
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Nada muda na área da energia atômica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU