11 Mai 2014
Um pastor, um redil e uma porta aberta para todos: o Senhor vela por nós, ele conhece cada um de nós pelo nome e nos oferece a verdadeira vida, a vida em abundância.
A reflexão é de Marcel Domergue, sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando as leituras do 4° Domingo da Páscoa. A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
Eis o texto.
Referências bíblicas:
1ª leitura: Atos 2,14.36-41
2ª leitura: 1 Pedro 2,20-25
Evangelho: João 10,1-10
Passar pela porta
Que porta é essa, pela qual o «bom pastor» entra no redil das ovelhas? Impossível não pensar em Mateus 7,13-14, que nos fala da porta estreita que conduz à vida. Passagem obrigatória a ultrapassagem das portas da morte. O que aconteceu? Bom pastor, o Cristo veio até o cerco fechado em que éramos prisioneiros. Atravessou a porta estreita para vir compartilhar as nossas sujeições. Em seguida, ele saiu. Foi o primeiro a sair, abrindo-nos a porta da vida. E somos chamados a segui-lo, em direção às verdes pastagens da liberdade. Não há qualquer outra porta além da porta pascal. As outras saídas todas são ilusórias e os que nos convidam a pular o muro a fim de evitá-la são «ladrões e assaltantes» que buscam tomar para si as nossas vidas, fazendo de nós os seus discípulos e clientes. Depois que saímos do cerco da morte e da servidão, somos convidados a voltar aí de novo. Não para reencontrar as nossas antigas escravidões, mas para fazer nosso o caminho do Cristo que, de condição divina, escolheu vir fazer-se nosso escravo, para nos fazer sair das nossas sujeições (ver Filipenses 2,5-11). Este voltar-se para as necessidades dos nossos irmãos é o ato de liberdade o mais perfeito que existe. É nada mais que o amor em ato. O amor é de fato o cume da liberdade, uma vez que consiste em dispor de si mesmo para se tornar totalmente dependente da vida de um outro.
"Eu sou a porta das ovelhas"
Depois de ter-nos sugerido ser o pastor que atravessou a porta da morte e que nos faz atravessá-la, Jesus precisa que é ele mesmo a porta. O que isto quer dizer? Não só que é ele quem nos faz passar (versículos 3 e 4), mas que é por ele e nele que passamos à vida. Assim se faz a diferença ou mesmo se corrige uma imagem de chefe autoritário que governa um «rebanho» e o domina. Um pastor, por melhor que seja, vive da carne e da lã das suas ovelhas. Pois, agora temos um pastor paradoxal: que dá a sua vida para as suas ovelhas e que faz de si mesmo o seu alimento (versículos 10 e 11, fora da leitura). Mas o percurso não para por aí: alimentadas com a carne do pastor, portadoras da sua vida e detentoras do seu Espírito, estas ovelhas irão sem dúvida reproduzir o seu comportamento. Todas as nossas ações são normalmente obras de aliança; são o fruto da nossa unidade com o Cristo: «Todas as nossas ações tu as realizas para nós» (Isaías 26,12). «As nossas ações»: elas são muito nossas e, no entanto, são ao mesmo tempo ações divinas. Quando Pedro escrever que nos tornaremos «participantes da natureza divina» (2 Pedro 1,4), estará confirmando esta unidade. Com certeza, isto é algo a se escolher sempre e a sempre se recomeçar: temos de passar, sem cessar, por esta porta da vida que é o Cristo.
"Ele chama cada um pelo seu nome"
Para significar o que se passa em nossa relação com Deus e com a vida, através do Cristo, a imagem do rebanho, assim como a do pastor, deve ser corrigida. «Rebanho» faz pensar numa coletividade anônima, obediente e uniforme. Por isso o evangelho se apressa em precisar que o pastor de que se trata conhece cada ovelha e que, reciprocamente, as suas ovelhas o conhecem (versículo 3). Os versículos 14 e 15 (fora da leitura) explicitam que este conhecimento mútuo está calcado no conhecimento que existe entre o Pai e o Filho. Estamos aqui, assim, em participação com a Unidade do Deus Pai, Filho e Espírito. Lembremos que, na Bíblia, o verbo «conhecer» diz muito mais do que em nossas línguas usuais; é usado até mesmo para nomear o ato conjugal. Quando dizemos «Igreja», devemos nos guardar de pensar em «massa», em «multidão» e até mesmo, no limite, em «povo», quando esta palavra é tomada no sentido de coletividade indistinta. «Igreja» significa antes de tudo convocação, chamado dirigido a cada um «pelo seu nome». As ovelhas, à primeira vista, reúnem-se todas. Mas não é assim com os crentes. Daí a necessidade de uma grande tolerância quanto aos modos de crer e de se comportar. A nossa unidade, para ser verdadeira, deve ser conjugação de diversidades. Isto já vale para o casal humano, mas não é assim tão fácil. Por isso Paulo sentiu necessidade de explicá-lo longamente em todo o capítulo 12 da primeira carta aos Coríntios. Uma última observação: o que nos faz existir é justamente que o Cristo nos chama cada um pelo seu nome.
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Eu sou a porta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU