25 Novembro 2016
Uma palavra ainda pouco conhecida promete ocupar cada vez mais espaço na pauta dos governos e no dia a dia da população nos próximos anos: “descarbonizar”. No jargão da mudança climática, isso significa reduzir as emissões de gases do efeito estufa — especialmente o dióxido de carbono, gerado na queima de combustíveis fósseis.
A reportagem foi publicada por EcoDebate, 24-11-2016.
Descarbonizar a economia é a missão dos países que se reuniram em Marrakech na 22ª Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP-22), encerrada no sábado. Para conter o aumento da temperatura da Terra, eles terão de reduzir as emissões desses gases até eliminá-las por completo em algumas décadas.
No encontro, destinado a discutir meios de colocar em prática o Acordo de Paris (construído na COP-21, em 2015), ao redor de 200 países confirmaram o compromisso de agir para limitar o aquecimento do planeta a 1,5 ºC, no máximo 2 ºC, em relação ao nível pré-industrial. Em Marrakech ficou decidido que o “livro de regras” para a implementação do acordo será concluído em 2018.
A transição para uma economia de baixo carbono é “urgente, irreversível e irrefreável”, segundo a secretária-executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas, Patricia Espinosa. Mas essa transição vai exigir mais do que mudanças pontuais em atividades econômicas. Será preciso alterar os modelos de desenvolvimento dos países, que terão de abrir mão de fontes de energia como petróleo e carvão.
— Seremos a geração que terminará com os combustíveis fósseis — decreta a diretora- -executiva do Greenpeace, Jennifer Morgan.
O Brasil é visto como um dos países-chave nessa mobilização global. O chefe da delegação brasileira na COP, o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, garantiu que vamos “passar de fonte de carbono a sumidouro de carbono”. Hoje o Brasil é o sétimo no ranking de emissões, liderado por China e Estados Unidos.
Na COP-21, no ano passado, as nações signatárias do Acordo de Paris apresentaram suas metas de redução de emissões. O Brasil se comprometeu a cortar 43% de suas emissões até 2030, em relação aos níveis de 2005. Para isso, pretende investir em fontes renováveis de energia, eliminar o desmatamento ilegal e recuperar pastagens e florestas.
Com a recente entrada do acordo em vigor, em 4 de novembro, as metas do Brasil já não são apenas intenções. São um compromisso oficial, ratificado pelo Senado em agosto. Agora é hora de discutir as mudanças necessárias, defende o senador Fernando Bezerra Coelho (PSBPE), que participou da COP-22.
— É preciso começar imediatamente a enfrentar discussões como: vamos ou não vamos usar usinas a carvão? Essas decisões implicam mudanças profundas na infraestrutura, na indústria. É importante saber que as contribuições que o Brasil pactuou têm repercussões importantes na economia — diz o senador, que é relator da Comissão Mista de Mudanças Climáticas, criada no Congresso em 2008 para debater políticas públicas destinadas a enfrentar o problema.
Além de Bezerra, os senadores Jorge Viana (PT-AC), Lídice da Mata (PSB-BA) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que também integraram a delegação do Senado em Marrakech, sugeriram a Sarney Filho que governo, Congresso, sociedade civil e setores produtivos se reúnam logo após a COP para discutir como as metas serão incorporadas ao planejamento nacional.
— Os Orçamentos que devem ser remetidos ao Congresso a partir de 2018 já precisam ter em mente que o Brasil tem metas a serem alcançadas. Como viabilizar isso? De onde virão os recursos, os financiamentos? Qual será a estratégia para atrair investimentos do setor privado para que o país chegue a 2030 como um dos líderes mundiais na condução para uma economia de baixo carbono? Com crise ou sem crise, temos que mudar nosso modelo de desenvolvimento — afirma Bezerra.
Cumprir as metas de redução das emissões será uma tarefa complexa, avalia o consultor legislativo do Senado Habib Fraxe Neto, que acompanhou os senadores na COP. Pelo tamanho do desafio que representa, a proposta brasileira é ambiciosa, disse. Um exemplo é a meta de recuperação de 15 milhões de hectares de pastos degradados:
— Uma área dessa dimensão envolve milhares de propriedades rurais. Tem que providenciar assistência técnica, juros diferenciados para que os produtores busquem financiamento, capacitação de agentes financiadores. Não são desafios simples.
Jorge Viana destaca outra meta que, a seu ver, precisa ser discutida em profundidade: a redução do desmatamento. Para ele, é preciso encontrar formas de preservar a floresta e ao mesmo tempo promover o desenvolvimento econômico da respectiva região, pois a população local muitas vezes depende da exploração da mata para sobreviver:
— A floresta tem de ser vista como ativo econômico. Os estados da Amazônia foram responsáveis pela redução do desmatamento, mas com redução também da atividade econômica. Não podemos seguir financiando as metas do país à custa da pobreza da parcela de brasileiros que vivem na Amazônia.
Na COP, o senador defendeu a adoção de um instrumento desenvolvido pela ONU para recompensar os países em desenvolvimento pela conservação das florestas e pela redução do desmatamento, chamado Redd+.
Outro mecanismo que pode ajudar no alcance das metas do clima é a atribuição de um “preço” às emissões de carbono feitas por empresas e produtos. A ideia é tornar mais vantajosos os modelos de produção limpos e deixar mais onerosos os poluentes. Isso poderia ser feito por meio de uma “taxa de carbono”, imposta a quem emite mais, ou por meio de mercado de carbono, que busca incentivar empresas e serviços a reduzir emissões.
Mais de 40 países já precificam o carbono, afirma o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, que lançou durante a COP o guia Precificação de Carbono: o que o setor empresarial precisa saber.
A Comissão de Meio Ambiente (CMA) pode votar hoje um projeto de Viana que inclui na Política Nacional sobre Mudança do Clima as metas de redução de emissões do Brasil (PLS 750/2015).
O governo prometeu para as próximas semanas o primeiro rascunho do plano de implementação das metas nacionais, para que o Brasil de fato alcance a almejada “descarbonização”.
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‘Descarbonizar’ a economia será desafio do país nos próximos anos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU