12 Abril 2016
Apesar do cenário sombrio que tomou conta do país este ano, e principalmente nas últimas semanas, com a intensificação da tentativa de derrubar a presidenta Dilma Rousseff no Congresso Nacional, via impeachment, o jurista Dalmo Dallari mantém expectativas otimistas. Segundo ele, nem o parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, vai impedir a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ministério da Casa Civil, nem o impeachment vai passar no Congresso.
"O impeachment já acabou. Isso foi uma fantasia que degenerou para um verdadeiro circo, que nunca teve consistência jurídica, e continua não tendo, porque ninguém indicou nenhum fundamento jurídico", diz, em entrevista à RBA.
A entrevista é de Eduardo Maretti, publicada por Rede Brasil Atual – RBA, 11-04-2016.
Dallari afirma que o parecer de Rodrigo Janot, contrário à nomeação de Lula pela presidenta Dilma Rousseff para o cargo de ministro da Casa Civil, "é extremamente infeliz, porque também não tem a mínima consistência jurídica".
O jurista diz ainda que o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, "é uma figura lamentável, que atua nos subterrâneos".
Eis a entrevista.
Qual sua avaliação do parecer do procurador-geral, Rodrigo Janot, contrário a Lula assumir o ministério, dizendo que é um "desvio de finalidade"?
Eu li esse pronunciamento e achei extremamente infeliz, porque não tem a mínima consistência jurídica. Aliás, o que me chamou a atenção foi exatamente o fato de que ele não aponta qualquer ilegalidade na posse de Lula. Ele apenas diz que aquela ata de posse foge à normalidade. Mas não diz que é ilegal. De maneira que as observações dele são de caráter político, são meras opiniões, sem nenhuma consistência jurídica. Então isso não muda absolutamente nada.
Na sua opinião, Rodrigo Janot e Gilmar Mendes atuam no mesmo sentido, como aliados, pelo impeachment de Dilma Rousseff, como têm afirmado diversos analistas?
Acho bem possível. Porque Janot, inclusive, mudou de posição. E, como se sabe, Gilmar Mendes atua muito nos subterrâneos. É uma figura lamentável do Supremo Tribunal Federal, que, na verdade, nunca deveria ter chegado ao Supremo. Quando da indicação do nome dele, no governo Fernando Henrique Cardoso, eu já chamei a atenção, e com base em fatos, que ele não atendia aos requisitos constitucionais, de reputação ilibada e notável saber jurídico. Mas, graças a manobras políticas, ele virou ministro do Supremo. E desde então, se tem verificado que ele não é fiel à Constituição.
O que o senhor espera da votação do impeachment?
Acho que o impeachment já acabou. Isso foi uma fantasia que degenerou para um verdadeiro circo, que nunca teve consistência jurídica, e continua não tendo, porque ninguém indicou nenhum fundamento jurídico. Na verdade era pura fantasia política, que eu acho que está acabando.
Mas a política, sobretudo atualmente, não pode prevalecer sobre o jurídico, considerando os interesses em jogo e a pressão?
Não, porque, em última análise, seja qual for a decisão, ela poderá ser levada ao Supremo Tribunal Federal. E eu confio no Supremo. Eu acho que ele está sendo fiel àquilo que dispõe a Constituição, que sua função precípua é a guarda da própria Constituição. Se houver uma manobra política, uma decretação de impeachment, isso cairá no Supremo Tribunal Federal.
Como o senhor avalia a questão da delação da Andrade Gutierrez?
Isso tudo são questões laterais que não afetam o que é essencial.
Muitas pessoas perguntam: por que, sem ser réu, Lula não pode assumir um ministério, e Cunha, sendo réu, pode assumir a presidência, segundo Gilmar Mendes?
Antes de mais nada, existe um grave equívoco nessa pergunta. Porque não há qualquer impedimento jurídico para que Lula assuma o ministério. Na verdade se têm feito alegações, de que a escolha de Lula foi feita por conveniência política, mas, entretanto, do ponto de vista jurídico e constitucional, não há o mínimo obstáculo à escolha e sua posse como ministro.
De acordo com a Constituição, a escolha dos ministros é do presidente da República. A presidente Dilma tem direito e plena liberdade para escolher quem considera mais adequado para ocupar o ministério. É importante também ressaltar que o presidente Lula é um cidadão brasileiro em pleno gozo de todos os seus direitos políticos e civis. O que significa que ele tem o direito de ser nomeado e tomar posse.
Quanto aos aspectos políticos, é normal em qualquer sistema que o chefe de governo escolha os ministros que considera mais adequados para atingir seus objetivos. Isso é essencialmente democrático.
Convém acrescentar que o fato de ser empossado no ministério não impede que Lula continue a ser processado. A única diferença é que, não sendo ministro, ele não tem foro privilegiado. Será processado por juiz de primeira instância. E, empossado no ministério, passa a ter foro privilegiado e passa a ser processado perante um tribunal superior. Mas continuará a responder pelos seus atos.
O mesmo se aplica a Eduardo Cunha quanto a ocupar o cargo de presidente, caso seja necessário?
Na verdade, o que existem são acusações, mas não há uma única decisão jurídica criando obstáculo restringindo os direitos de Eduardo Cunha. Então, no momento, ele se enquadraria na mesma situação, de um cidadão brasileiro no pleno gozo de seus direitos políticos e civis e tendo por isso o direito de ocupar os cargos mais relevantes do governo.
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"Gilmar Mendes é uma figura lamentável do STF". Entrevista com Dalmo Dallari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU