23 Junho 2012
Como ocorre muitas vezes nesse tipo de documentos publicados pelo Vaticano, o diagnóstico emitido sobre a situação da Igreja Católica no mundo não é nada suave. Ele poderia ser definido como severo, se não viesse de dentro da instituição.
A reportagem é de Stéphanie Le Bars, publicada no jornal Le Monde, 21-06-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Tornado público no dia 19 de junho, o documento de trabalho preparatório para o sínodo que se realizará entre os dias 7 e 28 de outubro, dedicado à "nova evangelização para a transmissão da fé cristã", que irá coincidir com o início de um Ano da Fé e das comemorações do 50º aniversário do Concílio Vaticano II, não foge à regra.
Os redatores, que sintetizaram as análises recebidas dos bispos das várias partes do mundo, se preocupam com a "apostasia silenciosa" dos fiéis que se afastam da prática religiosa. São listadas as razões, internas e externas, dessa desafeição e questionam-se os meios para implementar a "nova evangelização" que deveria remediar a situação.
Da "insuficiência da fé" ao "afastamento dos fiéis", da "credibilidade das instituições eclesiais" às "espiritualidades individualistas", ou ao "neopaganismo", o clima em que a Igreja está imersa – tanto nos países do Norte, como nos do Sul, especificam os bispos – está longamente descrito no texto.
A situação não é nova. Antes de Bento XVI, Paulo VI, desde 1975, e João Paulo II, em 1983, em particular, haviam reconhecido as transformações sociais e culturais "que modificam profundamente a percepção que o ser humano tem de si e do mundo, e que implicam em consequências sobre o seu modo de crer em Deus", como resume o papa atual. No rastro do Concílio Vaticano II, todos enfatizaram a necessidade de repropor a "missão evangelizadora da Igreja", especialmente nos países de antiga evangelização.
Entre os elementos que tornam dificilmente audível a mensagem da Igreja, os bispos distinguem aqueles que derivam do contexto exterior: "consumismo, hedonismo, niilismo cultural, fechamento à transcendência", os "novos ídolos" (segundo a Igreja "a ciência e a tecnologia "), e aqueles que são próprios da instituição.
Fala-se, por exemplo, de uma "excessiva burocratização das estruturas eclesiásticas", das "celebrações litúrgicas formais", dos ritos repetitivos. Mais em geral, o foco das reflexões dos bispos deveria estar no fracasso da Igreja, sentido por alguns, "para dar uma resposta adequada e convincente aos desafios" econômicos, políticos ou religiosos do momento.
Muitas pessoas, em várias partes do mundo, também deploram "a insuficiência numérica do clero" para o desenvolvimento das missões da Igreja e apontam para o risco de ficar encalhados em problemas de gestão. Parece-lhes necessária uma melhor integração dos leigos. Segundo o Vaticano, "a fé passiva" ou "morna" de alguns fiéis explica também a difícil transmissão da mensagem evangélica.
O texto, contudo, quer enfatizar as vantagens que a Igreja pode obter do contexto atual. A globalização, a secularização, o debate com as outras crenças, em particular com o Islã, obrigam os cristãos "a purificar e a amadurecer a sua fé", afirmam os bispos. Eles também estão felizes com o surgimento de novas comunidades cristãs e carismáticas, especificamente voltadas para a evangelização.
Quanto às respostas, são sobretudo de ordem espiritual. Para o Vaticano, o ecumenismo deve permitir que os cristãos manifestem uma mensagem evangélica comum, enquanto o diálogo inter-religioso tem levá-los a uma melhor compreensão da sua fé. Os católicos devem também interrogar "a qualidade da sua vida de fé" e ter "a coragem de denunciar as infidelidades e os escândalos que emergem das comunidades cristãs".
Porque, no fundo, a nova evangelização passa sobretudo pelo testemunho de uma vida cristã que, para algumas pessoas e em certos lugares, pode chegar até a "santidade" ou até mesmo ao "martírio". "O martírio dá precisamente credibilidade aos testemunhos", assegura o texto, que lembra, no entanto, que o esforço dos fiéis deve se referir à "caridade, uma vida sóbria, a ajuda os pobres, a implementação da doutrina social da Igreja ou o serviço da Igreja em favor da reconciliação, da justiça e da paz".
No que se refere à forma, os responsáveis católicos admitem que é preciso renovar as modalidades de anúncio do Evangelho: "A Europa hoje não deve pura e simplesmente fazer referência à sua herança cristã anterior".
As novas tecnologias devem ser exploradas evitando os desvios. Também se fala das peregrinações, da valorização dos santuários, da promoção das Jornadas Mundiais da Juventude. Mas a "urgência" está justamente na implementação de "um estilo mais missionário" de comunidades cristãs, seguras da sua fé e chamadas a ir ao encontro dos não crente e dos fiéis "mornos". Evitando todo "proselitismo agressivo".
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Vaticano analisa a ''apostasia silenciosa'' dos católicos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU