15 Março 2012
Há igrejas em que as mulheres não estão autorizadas a falar em voz alta, a menos que primeiro obtenham a permissão de um homem. Há igrejas (muitas delas) em que as mulheres não têm a permissão de pregar no púlpito. Há igrejas em que um menino de 13 anos tem mais autoridade do que a sua mãe.
A opinião é de Lisa Miller, editora de religião da revista Newsweek, em artigo publicado no jornal Washington Post, 08-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A batalha dos sexos, travada nesta temporada de eleições com uma fúria excessiva no espaço público, está sendo combatida em uma esfera muito mais dolorosa e privada também. Nas igrejas (e sinagogas e mesquitas) em toda a terra, as mulheres ainda são tratadas como cidadãs de segunda classe. E, como as mulheres de fé são cada vez mais chefes de família e mães solteiras, esse status diminuído está começando a se inflamar.
Há igrejas nos EUA em que as mulheres não estão autorizadas a falar em voz alta, a menos que primeiro obtenham a permissão de um homem.
Há igrejas (muitas delas) em que as mulheres não têm a permissão de pregar no púlpito.
Há igrejas nos EUA em que um menino de 13 anos tem mais autoridade do que a sua mãe.
"Na igreja, eu tinha que esconder os meus pensamentos, questões e escolhas de vida", diz Susan, uma mulher que trabalha como terapeuta em Seattle e que, depois uma vida inteira seguindo Jesus, abandonou o cristianismo. "Eu achava que eu não podia fazer nada por mim mesma, porque, como uma mulher cristã, eu aprendera que eu precisava de um homem para chegar a algum lugar".
A história de Susan foi publicada em janeiro por uma pequena editora cristã no livro The Resignation of Eve [A resignação de Eva]. Em suas páginas, o autor, um pastor evangélico chamado Jim Henderson, afirma que, a menos que as lideranças masculinas das igrejas cristãs conservadores façam um sério exame de consciência – e logo –, as mulheres que sempre sustentaram essas igrejas com o seu tempo, seu suor e seu dinheiro irão embora. Em massa. E não vão mais voltar. Seus filhos, tradicionalmente levados à igreja por suas mães, assim, vão se juntar ao crescente número de norte-americanos que se chamam de un-churched [sem igreja].
Não interessa que a Bíblia fale sobre mulheres que se submetem a homens e se sentam silenciosamente na igreja, declama Henderson. Isso é história antiga. "Até que aqueles que têm poder (homens) decidam dá-lo àquelas que não o têm (mulheres), eu acredito que continuaremos deturpando o coração de Jesus e desfigurando a beleza do seu Reino", escreve Henderson.
Henderson reforça seu argumento com dados do Grupo de Pesquisa Barna. Entre 1991 e 2011, o número de mulheres adultas que frequentavam a igreja semanalmente diminuiu 20%. O número de mulheres que iam à escola dominical caiu cerca de um terço, assim como o número de mulheres que faziam trabalhos voluntários na Igreja.
E, embora os dados do Barna tenham sido contestados por outros pesquisadores, Henderson vai mais longe. Mesmo as mulheres que vão à igreja regularmente, diz ele, são realmente apenas a metade: seu descontentamento as impede de se engajar totalmente no projeto de ser cristão. Ele chama esse mal-estar entre as mulheres de "uma fuga de capital espiritual".
Eu penso nessas fiéis conservadoras nesta temporada política, lutando para sobreviver e manter seus olhos em Deus, enquanto os homens de direita, também conhecidos como "o patriarcado", as desrespeitam e as insultam.
Não é apenas Rush Limbaugh [comentarista político conhecido por suas posições republicanas] que avilta todas as mulheres ao chamar uma delas de "vagabunda" e de "prostituta". Também é Rick Santorum [candidato católico republicano à presidência dos EUA] – aquele homem de fé – que chegou quase a chamar as mães trabalhadoras de egoístas e que trata todas as mães solteiras como a sua "oposição", como ele fez em uma entrevista com Tony Perkins do Family Research Council no ano passado. "Elas olham para o governo pedindo ajuda e vão votar", disse Santorum. "Por isso, se quisermos reduzir a vantagem democrata, o que precisamos fazer é construir famílias biparentais".
Também é cada medida política que coloca o chamado "pequeno governo" à frente da saúde, do bem-estar e da educação das crianças.
Eu penso nas blogueiras do Feminist Mormon Housewives que insistem sobre a sua devoção à Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, embora sensivelmente rebelando-se contra os ensinamentos que tornam as mulheres inferiores aos homens.
Eu penso nas mulheres da Aliança Feminista Judaica Ortodoxa, que, barradas dos papéis de liderança na sinagoga, estão começando pequenos grupos de oração por conta própria, onde podem celebrar rituais do ciclo de vida judaico em conjunto.
Penso em Kelly, uma personagem do livro de Henderson que, depois de defender as mulheres no ministério de sua igreja, recebeu o tratamento de silêncio do seu pastor durante meses. Kelly saiu dessa igreja e começou um grupo que se reune nas salas de estar das pessoas. Lá, ela é um líder. "Essa é minha igreja, e eu a amo", diz ela. "É uma comunidade que eu cultivo e pastoreio".
As analogias políticas são claras. De acordo com uma nova pesquisa NBC/Wall Street Journal, o presidente Obama ganha em qualquer disputa contra Mitt Romney, Santorum ou Newt Gingrich. Entre as mulheres, porém, seus ganhos são enormes: 18, 24 e 27 pontos, respectivamente.
A menos que os estridentes e autoritários conservadores sociais afrouxem seu domínio repressor sobre as mulheres norte-americanas, as mulheres norte-americanas irão abandonar o Partido Republicano (assim como estão abandonando a Igreja) e irão procurar seus candidatos em outro lugar.
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Religião: a fronteira final do feminismo? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU