Por: Cesar Sanson | 19 Agosto 2013
“O mundo evoluiu com a informática, a biotecnologia e a neurociência; entretanto, parece que o ser humano não consegue construir uma sociedade justa e pacífica” escreve Abrão Slavutzky, psicanalista, em artigo publicado no jornal Zero Hora, 17-08-2013. Ele aponta trés luzes: o depoimento de uma jovem sobrevivente do incêndio da boate Kiss, Hannah Arendt, autora de Eichmann em Jerusalém, que inspira o filme em cartaz nos cinemas do Brasil e Luís Fernando Verissimo.
Eis o artigo.
O ano de 2014 não será só o ano da Copa do Mundo. Será também o ano em que se completará um século do início da I Guerra Mundial. Nesses cem anos, ocorreram duas guerras mundiais, a guerra fria, e até hoje as guerras regionais. Já os países que vivem em paz sofrem de uma crescente onda de violências e injustiças. O mundo evoluiu com a informática, a biotecnologia e a neurociência; entretanto, parece que o ser humano não consegue construir uma sociedade justa e pacífica. Estamos aprendendo com dor a idealizar menos a condição humana, e quem sabe ser mais humildes.
Hoje cresce a psicopatia na luta pelo lucro e a vitória a qualquer preço. A Justiça, por melhor que seja, chega sempre atrasada, quando chega. São tempos em que o mal está nos noticiários, um mal que nos ultrapassa. Ainda bem que temos alívios para essa dura realidade.
Os alívios nascem, por exemplo, das luzes de uma entrevista como “O sorriso que o fogo não destruiu”. Publicada em 28 de julho, aqui em ZH, vale a pena recordar as palavras da jovem Kelen. Sobrevivente do incêndio da boate Kiss de Santa Maria, teve parte da perna direita amputada. Assim mesmo, pôde dizer: “Eu tinha dois caminhos: ficar na cama chorando a vida inteira ou recomeçar a minha vida. Estou tentando aprender com tudo o que estou passando. Quero recomeçar”. Muitas vezes, escutei que, se a gente torcesse um jornal, sairia sangue; mas também podem sair fachos de esperança.
A segunda luz vem de Hanna Arendt, cuja obra As Origens do Totalitarismo é um clássico do pensamento político. Já no livro Eichmann em Jerusalém, sobre o julgamento desse líder nazista, ela escreveu: “Eichmann nunca percebeu o que estava fazendo, era incapaz de julgar seus atos”. Ele era tão importante, que participou da conferência de Wannsee em 20 de janeiro de 1942. Era um dos 15 mais importantes dignatários nazistas que decidiram a “solução final” - o extermínio dos judeus. Hanna desconhecia o gozo humano da crueldade, um gozo onipotente e mortífero. Apesar disso, sua obra ilumina o pensamento até hoje.
A terceira luz nasceu na visita a uma exposição sobre a obra de L. F. Verissimo. Ocorreu na velha Rua da Praia, onde se encontra o Centro Cultural CEEE Erico Verissimo. Encontrei lá o Ed Mort com suas 17 baratas, o colega Analista de Bagé e a Família Brasil. Há também fotos como a do Verissimo e do nosso amigo Moacyr Scliar. Sou da legião de seus leitores que aprendem com sua graça. Gosta de chatear a direita, que parece já não se incomodar tanto. Ah, na exposição percebi que no dia 26 de setembro Verissimo fará 77 anos. Feliz aniversário desde já ao silencioso guru que segue o Talmud: se as palavras são prata, o silêncio é ouro.
As palavras de Kelen, o pensamento de Hanna Arendt e o humor do Verissimo mantêm acesos nossos sonhos.
São três luzes que podem ajudar no reencontro do nosso potencial adormecido, como as novidades absolutas que vivemos quando crianças.
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Três luzes em tempos sombrios - Instituto Humanitas Unisinos - IHU