02 Agosto 2013
A questão das mulheres, dos homossexuais e dos divorciados são problemas e situações que o padre e bispo Bergoglio encontrava no seu caminho pelas ruas de Buenos Aires. Uma bagagem de experiências humanas que hoje iluminam o seu pontificado.
A opinião é da historiadora italiana Lucetta Scaraffia, membro do Comitê Italiano de Bioética e professora da Universidade La Sapienza de Roma. O artigo foi publicado no jornal L'Osservatore Romano, 31-07-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Da longa, serena e aberta entrevista que o Papa Francisco concedeu aos jornalistas – e a transcrição completa deixa captar perfeitamente o clima descontraído e quase divertido que marcou o encontro –, as grandes novidades são principalmente duas e dizem respeito a duas questões às quais o Santo Padre havia dado pouco espaço até agora: as mulheres e os homossexuais.
A declaração do papa sobre o papel das mulheres são claras e reveladoras de uma forte vontade de abertura, não pronunciadas em nome da improrrogável necessidade de adequar a Igreja à igualdade entre os sexos realizada nas sociedades ocidentais, nem revestidas pelo paternalismo, muitas vezes afetuoso, que quase sempre marca as palavras dos altos prelados quando abordam o tema.
A abertura é substancial e está diretamente ligada ao seu projeto de reforma da Igreja: sem um reconhecimento aberto do papel das mulheres não se pode esperar aquela Igreja vital e acolhedora que o Papa Francisco deseja, aquela Igreja que pode novamente atrair os fiéis e aquecer-lhes o coração.
A mulher, disse, "ajuda a crescer a Igreja", porque é da relação paritária e colaborativa entre mulheres e homens que tem origem a fecundidade. E se essa relação definha, não é viva e é renegada, como ocorre hoje, a Igreja não cresce.
A coragem de dizer uma verdade, como todas as verdades, mesmo que óbvias, mas que ninguém antes dele tinha ousado, isto é, que "Maria é mais importante do que os apóstolos", não lhe impede de excluir o sacerdócio feminino, mas, ao mesmo tempo, de pedir um suplemento de estudos e reflexões para entender como realizar essa paridade na diferença. Suplemento de pesquisa ao qual, obviamente, as mulheres darão contribuições fundamentais.
Em poucas palavras, a novidade é expressa claramente e sem ameaçar a tradição da Igreja. Pode-se mudar tudo sem mudar as regras básicas, aquelas sobre as quais se construiu a tradição católica: essa é a sua posição também sobre os homossexuais. A Igreja não deve ser uma rígida dispensadora de julgamentos, mas deve estar sempre pronta a acolher os pecadores, isto é, todos nós. O exemplo de Pedro, que trai Jesus e depois é "feito papa", é de uma clareza impressionante que, em um piscar de olhos, tira valor de todas as cartas de denúncia, das suspeitas, dos venenos que estão circulando pelo mundo eclesiástico, depois da referência ao "lobby gay". E lembra a todos que o cristianismo sempre distinguiu entre condenação do pecado e a misericórdia para com o pecador, e que ele não é um rígido puritanismo sem coração.
Também a esse propósito o Papa Francisco não muda nada das regras morais, mas apaga um moralismo rígido e fofoqueiro, e com poucas palavras afasta da Igreja Católica aquela acusação caluniosa de homofobia que a perseguiu nos últimos tempos. A misericórdia é a característica distintiva do cristão, que significa acolhida do pecador e perdão. Outra coisa seria mudar as normas para apagar o pecado.
Misericórdia é o que ele invoca para os divorciados em segunda união, sem por isso abrir ao divórcio: o papa também pede, nesse caso, um suplemento de pesquisa teológica sobre a pastoral matrimonial, uma mudança cultural para conseguir explicar esse sacramento às mulheres e aos homens de hoje. De fato, ele identifica o problema: se os matrimônios religiosos diminuem tanto, e os que são feitos muitas vezes são sem valor, é porque muitas vezes a Igreja usa palavras equivocadas, velhas, rígidas e estéreis para explicar a instituição da qual nasce a vida. Não é preciso mudar as normas, mas sim os seres humanos que a explicam, a cultura que as justifica. E também a propósito da renovação da pastoral matrimonial, estamos certos de que o Papa Francisco saberá valorizar a experiência feminina, decisiva a esse respeito.
São todos problemas e situações que o padre Bergoglio, padre e bispo, encontrava no seu caminho pelas ruas de Buenos Aires, nos seus encontros com mulheres e homens normais, que lhe abriam o coração com esperança e sinceridade. Uma bagagem de experiências humanas que hoje iluminam o seu pontificado, aquecem cada discurso seu e lhes dão aquele tom de verdade que faz compreender e amar as suas palavras.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
As novidades do Papa Francisco. Artigo de Lucetta Scaraffia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU