17 Abril 2013
Lançada em 1995 e relançada dez anos mais tarde por seu autor, o filósofo italiano Giorgio Agamben, a obra Homo sacer – poder soberano e vida nua foi o tema da palestra do Prof. Dr. Daniel Arruda do Nascimento, da Universidade Federal Fluminente – UFF na noite desta terça-feira, 16/04/2013. A atividade faz parte da programação do Seminário O pensamento de Agamben - Homo Sacer - O poder soberano e a vida nua, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU. A programação completa do evento pode ser conferida em http://bit.ly/WdV0ca.
A reportagem é de Márcia Junges.
Buscando apresentar essa obra e apontar alguns de seus aspectos fundamentais, Daniel observou a variada gama de referências que Agamben faz sobre outros autores. Ele inicia seu projeto filosófico com uma citação de Aristóteles e irá recordar que a palavra vida traduz duas palavras gregas: zoe (o simples fato de estar vivo) e bios (modo próprio de viver ou vida qualificada). A seguir, Daniel apresentou a análise do conceito de biopolítica de Agamben a partir da perspectiva foucaultiana. Falou, também, sobre o animal laborans, de Hannah Arendt e pontuou que o ingresso da zoe na vida da polis é a via nua. “Agamben, de certa forma, faz uma atualização da obra de Foucault”, acentuou.
De acordo com Daniel, há uma relação muito próxima entre totalitarismos e regimes democráticos, conforme demonstra Agamben em Homo sacer. Tais regimes políticos podem se tornar indiscerníveis para nós ao entrar numa zona borrada de identificação. Assim, questiona o filósofo italiano, é possível pensar a política a partir de categorias antigas?
Um pacto pelo medo
Ao contrário de Aristóteles, que dizia que as sociedades eram gregárias por impulso, Hobbes afirmava que os homens se reportam a um momento histórico fictício, o estado de natureza, no qual todos viviam com medo. Isso porque desejam as mesmas coisas. Pelo medo forma-se um pacto, um contrato para limitar os direitos de cada uma das pessoas. O soberano é investido de poder de vida e morte sobre as pessoas. O soberano é a personificação da lei. É preciso ter medo do soberano, apenas, e não mais do seu próximo. Ao contrariar a lei, esta cairá sobre a pessoa.
A partir da parábola de Hobbes, Agamben formula o conceito de exceção, de inclusão e exclusão. Aqueles que transferem direitos para o soberano são, ao mesmo tempo, incluídos e excluídos do estado civil. São incluídos à medida que pertencem a esse estado e são signatários desse pacto. São excluídos na medida em que são excluídos do governo do estado civil, organizado pelo soberano. Ser político, habitar a polis e ter linguagem guarda um nexo entre esses fatores, destaca Daniel.
O campo como paradigma político moderno
O homo sacer é o protagonista dessa obra de Agamben apresentada por Daniel Arruda do Nascimento. A esse personagem pertence a vida nua, matável, que pode ser tomada pelo soberano. Trata-se de uma figura do direito romano arcaico, um excluído da sociedade e da comunidade e que perdia sua proteção como pena pelo delito cometido. O homo sacer era entregue à própria sorte, matável, e seu matador não poderia ser penalizado. Trata-se de uma dupla exclusão, do campo religioso e político, pondera Daniel. Essa estrutura, longe do nosso tempo, pode ser usada para compreender a situação do homem político contemporâneo.
Agamben busca corrigir a tese foucaultiana de que a biopolíticasurgiu no século XVIII. O processo disciplinar coincide com o nascimento da democracia, diz Foucault. Mas por que o triunfo da democracia é incapaz de salvar a vida da ruína, pergunta Agamben. Ele questiona, ainda, por que é possível defender a tese de uma íntima solidariedade entre democracia e totalitarismo. E Agamben diz isso na década de 1990. Fala de uma nova política que ainda falta inventar, e que a biopolítica não é o fim do caminho.
A obra de Agamben é uma resposta à globalização “sanguinosa mistificação de uma nova ordem planetária”, como aponta em sua introdução. A obra divide-se em três partes:
1) Lógica da soberania;
2) Homo sacer;
3) O campo como paradigma biopolítico do moderno.
Esse terceiro capítulo é um dos aspectos mais instigantes de sua obra, aponta Daniel. Os campos não nascem do direito ordinário, mas do estado de exceção e da lei marcial. O estado de exceção é temporário, mas tem se tornado uma técnica de governo, uma técnica política. A falta de clareza dos limites da lei é uma das características do campo moderno. O campo sofre metamorfoses, e se transforma em outras coisas, mas contem a mesma estrutura de exceção.
Daniel Arruda do Nascimento é graduado em Direito pela Universidade Federal Fluminense – UFF, especialista em Docência Superior pela Universidade Estácio de Sá – UNESA, mestre e doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio e pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, respectivamente, com a tese Do fim da experiência ao fim do jurídico: percurso de Giorgio Agamben (São Paulo: LiberArs, 2012) e é um dos organizadores de Entrecruzamentos da linguagem: filosofia, literatura, análise do discurso e educação (Teresina: EDUFPI, 2011). Leciona na Universidade Federal Fluminense – UFF.
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O homo sacer e o campo como paradigma político moderno - Instituto Humanitas Unisinos - IHU