18 Janeiro 2013
"Por toda a África e Oriente Médio, as potências ocidentais apoiaram os estados pós-coloniais com ajuda econômica e militar, que com frequência era usada para esmagar movimentos de autodeterminação por parte de minorias étnicas". escreve Peter Rutland, professor de política na Weslayen University, em artigo publicado no jornal Herald Tribune, 17-01-2013.
Segundo ele, "alguns destes movimentos ficaram bem conhecidos, como o dos curdos, outros ficaram mais ou menos invisíveis aos olhos ocidentais, como o dos bérberes e tuaregues no norte da África".
Eis o artigo
As potências ocidentais foram pegas de surpresa pelo surgimento súbito de um regime islamita no norte do Mali, e estão lutando para entender o que aconteceu lá. Cada vez mais, a narrativa é a do Islã militante. Mas o cerne do conflito é o movimento de secessão nacionalista do povo tuaregue – que nos últimos meses foi sequestrado por radicais islâmicos.
Na Guerra Fria, o Ocidente teve dificuldades em separar o comunismo do nacionalismo. Essa falha levou a uma série de intervenções desastrosas, de Cuba ao Vietnã. Era mais fácil ver líderes como Fidel Castro e Ho Chi Minh como ferramentas de Moscou do que tentar lidar com as suas legítimas demandas nacionalistas.
O mesmo erro está sendo cometido agora na "guerra contra o terror'". Por muitos anos a comunidade internacional ignorou as demandas de autodeterminação por parte dos tuaregues que habitam a metade norte do Mali, conhecida como Azawad. Os tuaregues são pastores nômades que somam cerca de 1,5 milhão e falam tamashek, uma das línguas bérberes. Eles são etnicamente diferentes dos árabes, que formam as nações do norte, e dos africanos que habitam o sul do Mali e controlam o governo nacional.
Por toda a África e Oriente Médio, as potências ocidentais apoiaram os estados pós-coloniais com ajuda econômica e militar, que com frequência era usada para esmagar movimentos de autodeterminação por parte de minorias étnicas. Alguns destes movimentos ficaram bem conhecidos, como o dos curdos, outros ficaram mais ou menos invisíveis aos olhos ocidentais, como o dos bérberes e tuaregues no norte da África.
O Mali conquistou a independência da França em 1960, e a primeira revolta tuaregue eclodiu em 1962. Uma segunda rebelião, em 1990, resultou nos Acordos Tamanrasset de 1991 que prometiam o autogoverno aos tuaregues, que foram abandonados pelas autoridades do Mali. Depois de 2001, os Estados Unidos intensificaram sua ajuda militar ao governo do Mali em nome da guerra contra o terror, embora esta ajuda possa ter sido facilmente usada para esmagar os rebeldes tuaregues tanto quanto os radicais islâmicos.
A terceira rebelião tuaregue, que eclodiu em 2006, foi complicada pela ascensão da Al-Qaeda no Magreb Islâmico, o que significava que agora havia uma luta de três vias entre islamitas, nacionalistas tuaregue e o Estado malinense.
No início, o tuaregues e malinenses formaram uma aliança contra os islamitas, mas em 2011 os tuaregues mudaram de lado se alinharam com os islamitas. Um novo movimento islâmico surgiu, o Ansar Dine, liderado por Iyad Ag Ghali, que havia sido um dos líderes das revoltas tuaregues de 1990 e 2006.
Em outubro 2011 houve um influxo de combatentes tuaregues e islamitas radicais da Líbia logo depois da derrota do regime de Gadaffi. Um novo e unificado Movimento Nacional para a Libertação de Azawad (MNLA) foi formado, e começou uma guerra contra o governo do Mali em janeiro de 2012.
Depois de uma série de vitórias militares, eles atingiram em poucas semanas a meta que almejaram durante décadas – a expulsão do exército malinense do norte do país. A humilhação das forças armadas do Mali levaram a um golpe de Estado em março que derrubou o presidente democraticamente eleito, Amadou Toumani Touré. A independência de Azawad foi declarada em 6 de abril de 2012.
No entanto, o Ansar Dine e alguns grupos jihadistas menores se voltaram contra o MNLA – uma disputa em que eles tinham a vantagem do apoio econômico e militar da rede islamista transnacional. Eles impuseram a rígida norma da sharia nas cidades sob seu controle, fazendo com que pelo menos 400 mil moradores fugissem.
Foi o seu contínuo avanço ao sul – para espalhar o governo islamita, e não para assegurar a independência para os tuaregues – que desencadeou uma ação militar francesa no último fim de semana, depois de meses de esforços da União Africana terem falhado em organizar uma intervenção militar para lidar com o problema.
A posição do governo dos EUA (e da União Africana) ainda é ignorar o movimento de independência tuaregue e, em vez disso, clamar pela democracia e a reconciliação dentro de um Mali unificado. Isso apesar do fato de que as tentativas anteriores de criar governos de poder partilhado fracassaram repetidamente por não protegerem os direitos dos tuaregues.
Neste estágio, entretanto, pode ser tarde demais para que as forças ocidentais que estão entrando na briga sejam capazes de distinguir e conquistar os nacionalistas moderados dentro do movimento tuaregue.
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Objetivos de tuaregues nacionalistas e islamitas do Mali confundem forças ocidentais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU