01 Dezembro 2014
Guerreiros, guerreiras e crianças Munduruku ocuparam na manhã desta sexta, 28, a sede da Funai de Itaituba. Os indígenas queriam pressionar a Funai a publicar o relatório e o mapa com as delimitações da terra indígena Sawré Muybu. Ao perceber que não haveria acordo, no final da tarde, eles resolveram seguir com a autodemarcação, iniciada na metade de outubro.
O presidente interino da Fundação, Flávio Chiarelli, chegou a falar ao telefone com os Munduruku. Alegando falta de recursos, Chiarelli propôs a ida de algumas lideranças até Brasília para uma reunião. A proposta foi recusada: “Ele só quer um grupo pequeno, né?! Por que ele não vem pra cá? Como ele diz que tá com pouco recurso, por que ele não vem aqui com a gente? A conversa que ele vai ter em Brasília, ele pode ter aqui. A gente tá cansado de ir pra Brasília e não resolver nada”, afirmou Juarez Saw, cacique da aldeia Sawré Muybu.
Flávio Chiarelli disse que daria uma resposta sobre a publicação do relatório em 13 e 14 de dezembro, quando está prevista uma reunião no alto Tapajós. Os Munduruku não acreditaram na promessa e decidiram seguir com a autodemarcação, que já dura 44 dias.
A reportagem é publicada por Xingu Vivo, 29-11-2014.
No início da semana, os indígenas encontraram cerca de 300 garimpeiros explorando diamante bem próximo ao local sagrado que dá nome à área indígena reivindicada. Os donos da empresa são de Israel, Alemanha e um da Rússia. Todas as semanas um deles passa no garimpo para arrecadar o que é extraído. “Na semana levaram uma garrafa de coca-cola de 2 litros inteira cheia de diamante, acho que dava mais ou menos uns 3 mil quilates”, conta um garimpeiro que deixou o local após à fiscalização.
“A gente veio aqui porque a gente tá vendo a necessidade. A gente viu a destruição da nossa terra, da floresta. A gente veio aqui para fazer que a Funai assine o nosso relatório, mas a Funai não vai assinar. Vamos continuar nosso trabalho de autodemarcação, mas qualquer problema que acontecer com a gente ou com os invasores a culpa é toda do governo e da Funai, que não demarcam nossa terra”, disse Leusa Kaba Munduruku, após a desocupação da autarquia.
A Funai é pressionada por órgãos do Governo a segurar a publicação do relatório por causa de interesses hidrelétricos no Tapajós. O reconhecimento dos limites tornaria a hidrelétrica de São Luiz do Tapajós completamente ilegal, pois a mesma alaga em cheio grande parte da área secularmente ocupada pelos Munduruku. Durante a ocupação foi divulgada mais uma carta, na qual os Munduruku falam sobre o que sentiram ao ver o local sagrado Daje Kapap Eypi, também conhecida pelos “brancos” como Sawré Muybu.
Leia a carta na íntegra
Aldeia Sawre Muybu, 28 de novembro de 2014
“Quando nós passamos onde os porcos passaram, eu tive uma visão deles passando. Eu tenho 30 anos. Quando eu era criança minha mãe me contou a história dos porcos. É por isso que devemos defender nossa mãe terra. As pessoas devem respeitar também. Todas as pessoas devem respeitar porque a história está viva, estamos aqui, somos nós”.
Orlando Borô Munduruku, aldeia Waro Apompu, Alto Tapajós
Hoje, pela primeira vez durante a autodemarcação, chegamos ao local sagrado Daje Kapap Eypi, onde os porcos atravessam levando o filho do Guerreiro Karosakaybu. Sentimos algo muito poderoso que envolveu o nosso corpo.
Outra emoção forte que sentimos hoje foi ver nossa terra toda devastada pelo garimpo bem perto de onde os porcos passaram. Nosso santuário sagrado está sendo violado, destruído por 50 PCs (retroescavadeiras) em terra e 5 dragas no rio. Para cada escavadeira, 5 pobres homens, em um trabalho semiescravo, explorados de manhã até a noite por 4 donos estrangeiros.
Primeiro o Governo Federal acabou Sete Quedas, no Teles Pires, que foi destruído pela hidrelétrica, mando o espírito da cachoeira. E agora, com seu desrespeito em não publicar o nosso relatório, acaba também com Daje Kapap Eypi.
Sentimos o chamado. Nosso Guerreiro, nosso Deus, nos chamou. Karoskaybu diz que devemos defender nosso território e nossa vida do grande Daydo, o traidor, que tem nome: O Governo Brasileiro e seus aliados que tentam de todas as formas nos acabar.
Nós estamos lutando pela nossa demarcação há muitos anos, sempre que a gente vai para Brasília a Funai inventa mentiras e promessas para nos acalmar. Sabemos que a Funai faz isso para ganhar tempo para construção da hidrelétrica do Tapajós, agora nós cansamos de esperar.
Sem chorar ou transformando as lagrimas em coragem, em Assembleia tomamos a seguinte decisão: a Funai tem três dias para publicar o nosso relatório e dar continuidade à demarcação, homologação e desintrusão da nossa terra.
Caso não sejamos atendidos, vamos dar continuidade ao trabalho de autodemarcação até o final. Por enquanto só estamos avisando os invasores que eles devem sair do nosso território, mas se a Funai não fizer o que tem que ser feito, ou seja, publicar o nosso relatório e demarcar nossa terra, a mesma, com a sua omissão, estará provocando um conflito com proporções inimagináveis entre Munduruku e invasores, que já é anunciado há muito tempo, com todas as denúncias de ameaças que estamos sofrendo.
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Munduruku ocupam Funai para pressionar demarcação de TI, invadida por garimpo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU