03 Novembro 2014
Ficará claro no aniversário da Reforma de 2017 que o sinal distintivo da Igreja protestante é que as mulheres, com uma base teologicamente fundamentada, podem ser pastoras. E, segundo a compreensão protestante do cargo eclesiástico, não há um status sacerdotal, e há também pastoras e até bispas: como consequência da teologia, protestante, do batismo.
A opinião é da pastora e teóloga alemã Margot Kässmann, presidente do Conselho dos Bispos da EKD, a Igreja Luterana da Alemanha, em artigo publicado na revista Confronti, de novembro de 2014.
Eis o texto.
Aqui estamos: a Igreja Anglicana da Inglaterra admite as mulheres para o cargo de bispo. Algumas semanas atrás, eu estava na Inglaterra e pude viver a tensão antes da decisão. Foi isto que eu vivi em primeira pessoa: algumas Igrejas acusam as de tradição reformada, que admitem as mulheres a todos os cargos, a se conformarem ao espírito do tempo. Isso é um erro. Trata-se de uma questão teológica fundamental.
Para Martinho Lutero, tornou-se cada vez mais claro que o batismo é o evento e o sacramento principais. Nele, Deus promete ao ser humano graça, amor, apoio, sentido de vida. Todos os fracassos e as estradas equivocadas da vida não podem revogá-lo. Se voltarmos ao batismo, não precisamos de expiação nem de nenhum sacramento de expiação.
Nós estamos salvos, somos – além disso – filhos de Deus. "Baptizatus sum", sou batizado. Nas horas mais duras da sua vida, Martinho Lutero assim se repetia e encontrava sustento. Qualquer pessoa que tenha saído do batismo é padre, bispo, papa, esclareceu Lutero. A partir disso, Lutero desenvolveu também o respeito pelas mulheres. Sendo batizadas, elas estão no mesmo plano que os homens.
Uma posição inédita para aquele tempo! As mulheres não virgens eram consideradas impuras, estava desenfreada a caça às bruxas, da qual Lutero não se distanciou de maneira decisiva, infelizmente. Só depois de um longo debate foi atribuída também às mulheres uma alma não mortal.
Afirmar naquele tempo que, como batizados, somos iguais perante Deus foi uma revolução teológica e uma revolução social. Foi a partir dessa compreensão do batismo que se desenvolveu ao longo dos séculos a convicção de que as mulheres podiam assumir, de fato, todo cargo eclesiástico.
O batismo atesta o que Paulo escreveu aos Gálatas: em Cristo não há homem ou mulher (3, 28). Na Idade Média, o celibato era considerado um caminho mais estimado por Deus, por assim dizer um caminho direto ao paraíso. Muitos reformadores, casando-se, testemunharam como a vida em família, com sexualidade e prole, era uma vida abençoada por Deus.
O matrimônio público de padres, monges e freiras, que até então viviam o celibato, foi um sinal teológico. A teóloga Ute Gause explicou que essa foi uma ação simbólica "que quis esclarecer para a Reforma algo fundamental: o estar voltado ao mundo e a carnalidade da nova fé" (Ute Gause, Antrittsvorlesung, unveröffentliches Manuskript, p. 2).
Agora é atribuído aos protestantes o fato de serem menos "carnais" do que os católicos romanos ou que os ortodoxos. No entanto, os reformadores quiseram deixar claro que a vida laica não é menos digna do que a sacerdotal ou monacal. Trata-se, para eles, de viver a fé como homem e mulher no cotidiano do mundo.
Isso tem muitas consequências. Uma, por exemplo, é que, nas primeiras ordens eclesiásticas protestante, as parteiras foram reavaliadas como servidoras da Igreja. Uma mulher que deu à luz não era mais vista como impura, mas devia ser assistida, e era preciso cuidar dela.
Nisso, Lutero conseguiu ser incrivelmente moderno. Por exemplo, quando se trata da questão de saber se os homens adultos tornam-se ou não ridículos ao lavar fraldas. Quer lavasse fraldas, quer fizesse outras coisas desdenháveis, todos zombavam dele e o consideravam um estranho e efeminado, embora ele agisse na fé cristã. Pois bem, digo eu, quem zomba aqui do outro de maneira mais sutil?
"Deus se alegra com todos os anjos e as criaturas, não porque ele lava as fraldas, mas porque faz isso na fé. O escarnecedor, no entanto, que vê apenas o trabalho e não a fé, é zombado por Deus com todas as criaturas como o mais tolo sobre a terra. Sim, zombam apenas de si mesmos e são idiotas do diabo com a sua sabedoria" (Weimar Ausgabe - WA 10, II, p. 296). Aqui entra em jogo se eu vivo a minha vida na responsabilidade diante de Deus e na fé em Deus.
Ficará claro no aniversário da Reforma de 2017 que o sinal distintivo da Igreja protestante é que as mulheres, com uma base teologicamente fundamentada, podem ser pastoras. E, segundo a compreensão protestante do cargo eclesiástico, não há um status sacerdotal, e há também pastoras e até bispas: como consequência da teologia, protestante, do batismo.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Pastoras e bispas, fruto do batismo. Artigo de Margot Kässmann - Instituto Humanitas Unisinos - IHU