10 Novembro 2015
Nesses tempos de revoluções tecnológicas, a "gestão da mudança" é a preocupação da vez. Mas, antes de ser gerida, essa mudança deve ser operada em profundidade, acreditam os defensores da "empresa liberada", que preconizam o fim das hierarquias piramidais tradicionais. Isso porque atualmente "os humanos estão cambaleando desajeitadamente como pinguins em terra firme", diz Frédéric Laloux, um dos defensores desse novo pensamento gerencial, no livro "Reinventing Organizations" ("Reinventando as Organizações", não lançado no Brasil).
A reportagem é de Annie Kahn, publicada por portal Uol, 10-11-2015.
Ele incentiva os empreendedores a darem mais margem de manobra a seus colaboradores para liberar a energia e criatividade. Sem ingenuidade, não hesitando em alfinetar as chamadas organizações consensuais, sem hierarquia, muitas vezes pesadas e ineficientes, onde "os jogos de poder se dão nos bastidores", o que é ainda pior.
Seu tipo de organização, que ele chama de "opala", colocando-se na continuidade da "teoria integral" do filósofo americano Ken Wilber, que associa cores a estilos de gerenciamento, se situa na linhagem das empresas liberadas descritas por Isaac Getz e Brian M. Carney em "Freedom, Inc" ("Liberdade S.A.", sem lançamento no Brasil). Ou nos princípios da holocracia, dispositivo imaginado por um CEO, americano, Brian Robertson, nos anos 1990. Essa metodologia substitui a organização piramidal clássica, através de um sistema de decisão coletiva, tomada entre equipes reduzidas, mas de acordo com métodos codificados.
Uma espécie de fundamentalismo
Os títulos ali não têm mais valor. "Desejáveis, viciantes, eles são fundamentalmente ruins para a saúde", acredita Laloux. As pessoas têm funções a cumprir, que variam de acordo com a evolução e as necessidades da empresa. Os organogramas estão desaparecendo. O comprometimento junto aos outros funcionários basta para fazer a organização funcionar.
Cada um é apto a decidir, contanto que solicite previamente a opinião de pessoas envolvidas ou especialistas no assunto, e as leve em consideração. "A confiança substitui o medo."
O poder é compartilhado. As disputas de ego --que envenenam as relações nas empresas, absorvem as energias individuais em razão de preocupações negativas, ou até nocivas em detrimento da produtividade-- desaparecem.
No entanto, essa empresa dos sonhos para algumas pessoas não serve nem agrada a todos. Os recrutamentos devem ser feitos de forma a só receberem seres virtuosos. E a cultura da empresa "opala" poderá, depois, perpetuar os comportamentos adequados.
E é aí que está o problema. Introspecção, minutos de silêncio no começo das reuniões e meditação às vezes entram no programa dessas empresas opala. Como costuma acontecer, nessas organizações você só é livre contanto que se adeque a um modelo ideológico ou espiritual, em detrimento da diversidade.
Seria uma espécie de fundamentalismo que põe em dúvidas sua popularização. Algo lamentável, uma vez que seria bom que os valores humanistas, que valorizem o interesse do trabalho e da confiança, atraíssem mais tomadores de decisões e investidores.
Ainda mais porque há um longo caminho a se percorrer nesse domínio. O ranking dos "grandes CEOs", publicado pela "Harvard Business Review" em sua edição de novembro, mostra que poucos deles realmente estão engajados na defesa de princípios sociais e ambientais, primeira etapa de uma organização que se pretende adepta dos valores humanistas.
Quase mil CEOs das maiores empresas do mundo, que ocupam o mesmo cargo há mais de dois anos, são avaliados em função de seus resultados financeiros e extra-financeiros obtidos desde sua chegada à empresa. Só que o número um em resultados financeiros (Jeff Bezos, CEO da Amazon) é, em compensação o lanterninha em resultados sociais e ambientais (RSE), ficando na 828ª posição; e o número dois, Ma Huateng, CEO da Tencent, é o 630º colocado no quesito RSE. Nada empolgante.
Felizmente, também existem os que são bons em tudo. Como Lars Rebien Sorensen, CEO do grupo farmacêutico dinamarquês Novo Nordisk, que chega à frente no ranking global (levando em conta desempenhos financeiros e não financeiros). Os dois primeiros franceses, Jacques Aschenbroich (Valeo) e Benoît Potier (Air Liquide), chegam respectivamente nas 14ª e 15ª posições.
Esses bons exemplos, cujos perfis certamente ainda estão muito longe de serem "opala", embora não sejam o ideal têm a vantagem de existirem e poderem influenciar muitas pessoas.